A Ambipar pediu recuperação judicial por volta da meia-noite, buscando proteção contra seus credores para dívidas que somam mais de R$ 10,7 bilhões em meio a uma crise de confiança que engoliu a empresa nas últimas semanas.

O pedido foi feito junto à 3ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro. Nos EUA, a Ambipar Emergency Response, uma controlada da companhia brasileira que é listada na Bolsa de Nova York e tem sede nas Ilhas Cayman, pediu Chapter 11 perante a Bankruptcy Court for the Southern District of Texas. 

A maior parte da dívida da Ambipar é com os detentores de seus bonds, mas a companhia de resposta a emergências e gestão ambiental também tem debêntures, dívidas bancárias e com fornecedores.

Os bonds da Ambipar hoje somam US$ 1,065 bi, cerca de R$ 5,6 bilhões no câmbio de hoje. As debêntures somam outros R$ 3 bi, enquanto as dívidas com bancos somam outros R$ 2 bilhões. A dívida com fornecedores é de R$ 230 milhões.

Entre os bancos, o maior credor é o Santander, com R$ 663 milhões, seguido pelo Banco do Brasil (R$ 352 milhões), Banco do Nordeste (R$ 207 milhões), Deutsche Bank (R$ 188 milhões), Bradesco (R$ 165 milhões), Daycoval (R$ 109 milhões), Scania (R$ 77 milhões) e ABC Brasil (R$ 56 milhões). 

A crise na Ambipar teve seu estopim quando o Deutsche Bank fez uma chamada de margem contra a companhia referente a um derivativo.  Isso fez os credores se debruçarem sobre a situação de caixa da companhia, encontrando inconsistências.

Tercio Borlenghi Junior ok

As dúvidas sobre o caixa da Ambipar começaram depois da divulgação de seu resultado do segundo tri, em 14 de agosto. 

No balanço, a Deloitte, que passou a auditar a companhia este ano depois da BDO ter sido o auditor por quatro anos, incluiu uma nota explicativa sobre o caixa, discriminando que do caixa de R$ 4,7 bi da companhia, R$ 2 bilhões estavam alocados num FIDC.

A suspeita que surgiu no mercado é de que o caixa deste FIDC estaria investido em CDBs do Master — e, portanto, não poderia ser acessado. 

Fontes a par do assunto disseram ao Brazil Journal que, quando questionado pelos bancos sobre o caixa da empresa, o controlador Tércio Borlenghi Júnior não teria conseguido mostrar onde estariam os recursos, apresentando apenas um gráfico com a divisão dos recursos por tipo de ativo.

Os principais bancos credores também teriam cruzado informações entre si e chegado à conclusão de que não havia recursos da companhia investido em nenhum deles. 

O que fez os bancos olharem mais a fundo para a liquidez da Ambipar foi a chamada de margem do Deutsche. A companhia tinha dois swaps com o banco alemão, referentes a suas emissões de green bonds com vencimentos em 2031 e 2033. Esses swaps exigiam chamadas de margem no caso de uma variação negativa do dólar em relação ao preço no momento da contratação. 

O swap com vencimento em 2031 foi feito quando o dólar estava abaixo de R$ 5, então estava gerando um ganho para a companhia. Já o swap do bond de 2033 foi estruturado quando o dólar estava perto dos R$ 6 e vinha gerando prejuízo. Mas em termos líquidos, a companhia não estava tendo que depositar margens.

Mas em abril, o Deutsche propôs um aditivo aos contratos, oferecendo reduzir o custo dos swaps e liberar um crédito de US$ 35 milhões em troca da companhia incluir uma cláusula de PIK (payment in kind) — que permitia que, caso o Deutsche tivesse que pagar a companhia nos contratos, ele poderia fazê-lo usando os próprios bonds da empresa. 

Em setembro, no entanto, o banco passou a enviar chamadas de margem com valores altos, argumentando que elas eram referentes ao ‘mark to market’ do PIK, algo que não estava previsto no contrato do aditivo, segundo fontes que tiveram acesso ao documento.  

A Ambipar, na figura de seu CFO João Arruda, chegou a fazer os primeiros depósitos, mas depois suspendeu os pagamentos quando Tércio e outros executivos questionaram a cobrança. 

Para fazer frente às primeiras chamadas de margem, a Ambipar sacou recursos que estavam investidos no Santander – o que acendeu um sinal de alerta no banco, que decidiu olhar mais a fundo para a companhia. 

“Os bancos começaram a se falar e ver que tinha alguma coisa errada com o caixa,” disse uma fonte dos bancos. “A empresa tem falado que o problema surgiu por causa da chamada de margem do Deutsche, mas se você tem R$ 4,7 bilhões em caixa, como estava reportado no balanço, e o Deutsche te chama R$ 100-200 milhões, por que isso seria preocupante? Isso seria menos de 5% do caixa.”

Outro sinal de alerta, segundo essa fonte, é que alguns acionistas minoritários das empresas operacionais da Ambipar, onde a companhia tipicamente tem 51% do capital, começaram a alertar que a companhia estava puxando o caixa dessas empresas para a holding

Outra fonte nota que a dívida corporativa da Ambipar sempre foi impagável. 

“Eles tomaram essas dívidas para financiar aquisições que tinham que maturar. Enquanto isso não acontece, a solução era sempre ir rolando essas dívidas,” disse a fonte. “Mas na hora que você tem uma crise de liquidez e de confiança e não tem mais como rolar, a coisa colapsa.”

Nos últimos meses, a ação da Ambipar virou pó. A companhia perdeu 96% de seu valor de mercado, com a ação negociando hoje a R$ 0,58. 

A empresa — que já chegou a valer mais de R$ 40 bilhões — hoje negocia por cerca de R$ 960 milhões.

A Ambipar está trabalhando com Alvarez & Marsal e BR Partners.

Os assessores jurídicos são Galdino, Pimenta, Takemi, Ayoub, Salgueiro, Rezende de Almeida Advogados; Salomão Advogados e Basílio Advogados.

Os bondholders da Ambipar estão trabalhando com a Houlihan Lokey e Padis Mattar Advogados.

O Deutsche Bank trabalha com Pinheiro Neto.

O Bradesco está sendo assessorado por Warde Advogados e Machado Meyer.

O Itaú está com Sacramone, Orleans e Bragança Advogados. 

O Santander trabalha com Demarest.