Transformações empresariais envolvem um exercício de humildade e o reconhecimento de que mudar uma empresa não é fácil. Números da McKinsey mostram que 70% das tentativas fracassam.
 
Por mais que se fale tanto em “destruição criativa”, a maior parte das empresas estabelece a sua cultura e os seus processos em épocas estáveis — e com frequência, de vacas gordas.
 
Mas as vacas gordas não duram para sempre. O número de empresas que desaparecem ou são absorvidas por outras tem aumentado rapidamente. Basta ver a lista das maiores empresas da Fortune 500 de 60 anos atrás e compará-la com a atual: 88% das empresas não existem mais. 
 
Pior: o período que uma empresa fica na lista tem diminuído muito. Em 1955, o prazo médio era de 60 anos. Na década de 80, passou para 30. Atualmente, é de menos de 15 anos. 
 
Quando a maré começa a virar, seja na economia, seja por mudanças de comportamento dos clientes ou por novas tecnologias, por exemplo, torna-se necessário ajustar a empresa à nova realidade. Quando há disrupções por todo lado, passa a ser urgente aumentar a eficiência, mudar o modelo de negócio, reduzir custos a níveis não imaginados anteriormente, encontrar novas fontes de faturamento ou revolucionar a experiência do consumidor, por exemplo.
 
As empresas na verdade enfrentam um desafio duplo. Ao decidirem se transformar, a probabilidade de sucesso é baixa, da ordem de 30%.  Mas, se não tentam, a chance de sumirem ou serem adquiridas é grande. “Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come.” A vida é dura…
 
Como vencer essa probabilidade baixa de sucesso de uma transformação? 
 
Dentre os vários elementos de uma boa transformação — como ter um plano arrojado mas viável, ter um processo claro e rigor na execução — há um elemento que tem sido muitas vezes esquecido. Um estudo da McKinsey mostrou que a maioria dos fracassos não está relacionada à ausência de um bom plano ou de recursos, mas sim à falta de engajamento da organização, seja dos colaboradores ou da própria liderança. A organização não “comprou” a mudança.
 
O maior desafio está nas pessoas e na cultura, mas muitos gestores acabam focando somente nas iniciativas relacionadas à performance financeira — mais receita, menos custos — e se esquecem de engajar as pessoas no processo e melhorar a chamada saúde organizacional, que é a habilidade da organização de se alinhar, executar e se renovar. 
 
Como, então, engajar a organização de forma eficiente?
 
Para começar, com uma boa estória da mudança. Uma boa estória da mudança dá significado à transformação tanto para a liderança como para os colaboradores. Não dá para fazer transformações à força, de cima para baixo. A cultura acaba engolindo a estratégia e as suas ações no café da manhã, antes de você conseguir começar a trabalhar.
 
A resistência à mudança entre os colaboradores e mesmo entre os altos executivos é parte da realidade.
 
Assim, fazer com que as pessoas entendam os motivos, a relevância, o porquê da transformação (e se sintam parte relevante da mesma) passa a ser prioridade.  A transformação funciona quando se torna tanto aspiracional quanto inspiracional para todos. Isto se traduz em uma narrativa que precisa ser única e difundida por toda a organização. 
  
Estudos mostram que transformações têm impressionantes 3,8 vezes mais chances de ser bem-sucedidas quando o CEO e os líderes conseguem propagar por toda a empresa uma narrativa de mudança convincente e atraente. Trata-se do “yes, we can” corporativo.
 
Outras dimensões são fundamentais e complementares a uma boa estória de mudança, como ter os processos e estruturas para sustentar a transformação, garantir as habilidades e conhecimentos internos e, é claro, uma liderança que sirva de exemplo positivo. As iniciativas para melhorar a saúde organizacional devem andar de mãos dadas com as iniciativas que geram resultados financeiros. Mais do que aumentar significativamente as chances de sucesso de uma transformação, uma boa saúde organizacional tem uma correlação direta com retorno superior aos acionistas em qualquer ocasião.
 
O “segredo” das transformações bem-sucedidas, portanto, é na verdade bastante intuitivo: o ‘como’ de uma transformação é tão importante quanto ‘o que’ será feito.
 
Neste contexto, o papel dos lideres é fundamental. Eles devem a alavancar todo o potencial reprimido que seus colaboradores talvez nem saibam possuir. Devem agir menos como “salvadores da pátria” e mais como “regentes de orquestra”. Os maestros, no dia da apresentação, ficam em um plano mais baixo, de costas para a plateia, valorizando a orquestra que está de frente e em um plano mais elevado. São eles os que devem ser vistos e ouvidos.
  
Como executivo, conselheiro, investidor ou consultor, conheci diversos casos de transformações em que se trabalhou de forma equilibrada a busca da melhoria na performance financeira e em paralelo o foco na saúde organizacional. Os resultados são espetaculares para todos.
 
Rami Goldfajn é sócio da McKinsey e líder da prática de Transformações – RTS (Reset, Transform, Sustain) no Brasil.

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