Quando uma startup recebe uma rodada de investimento de fundos internacionais, internar os recursos muitas vezes é mais complicado do que captar.
Primeiro, a empresa precisa “flipar” sua estrutura, criando uma holding lá fora – em Delaware ou Cayman – o que pode demorar de um a dois meses, dependendo da eficiência do advogado. Ao mesmo tempo, precisa abrir conta num banco no exterior (normalmente o Silicon Valley Bank), o que por si pode levar dois meses.
Por fim, tem que abrir conta numa corretora ou banco brasileiro e esperar a aprovação do câmbio… E lá se vai mais um mês.
Parte desse processo moroso está perto do fim – pelo menos se depender da Trace Finance.
A startup está tentando injetar agilidade e dinamismo nesse processo, começando pelo câmbio. A Trace criou um sistema que permite que as startups façam o câmbio em no máximo um dia, e a um custo consideravelmente menor.
Enquanto o Silicon Valley Bank cobra uma taxa de 4% pelo câmbio e as corretoras e bancos brasileiros cobram em média 0,6%-1%, a Trace cobra apenas 0,15%.
O próximo passo? Entrar nas outras etapas do processo, criando um banco nos EUA para competir com o Silicon Valley Bank, e outro no Brasil. (A startup não pretende entrar na parte da estruturução da holding lá fora, que está sendo atacada por empresas como a Latitud Go).
Para isso, a Trace acaba de levantar US$ 4,3 milhões numa rodada que a avaliou em US$ 24 milhões – cerca de R$ 120 milhões ao câmbio de hoje.
Metade da rodada foi feita pela HOF Capital, que já investiu na Uber, SpaceX e Stripe.
A captação também teve a participação do Circle Ventures, dona da maior stablecoin do mundo, a USDC; da Mantis Ventures, a gestora de VC da banda The Chainsmokers; da 2TM, a dona do Mercado Bitcoin; além de investidores-anjo como Paulo Silveira, da Alura, e Lincoln Ando, da Idwall.
A rodada é a primeira desde que a startup foi fundada em janeiro do ano passado por três empreendedores com background em cripto: Bernardo Brites, que trabalhou na Decred (uma criptomoeda) e depois criou um negócio que ajudava exchanges de cripto a fazer câmbio; Rafael Luz, que foi sócio de Bernardo nessa empresa e antes trabalhou na suiça Transfero; e Leone Parise, que trabalhou anos na TrustWallet e mais tarde foi um desenvolvedor da Binance quando a exchange chinesa comprou a wallet em 2018.
No primeiro ano, a Trace rodou apenas com o capital dos fundadores e sua geração de caixa própria – e já deu lucro.
A Trace vai usar o dinheiro para expandir sua equipe de programadores, investir em marketing e tirar as licenças no Brasil e nos EUA necessárias para a sua operação bancária.
Bernardo, o cofundador, estima que a licença nos EUA deve sair já no segundo trimestre, e que a brasileira saia até o final do ano.
Num primeiro olhar, a Trace parece estar operando num negócio de nicho com pouco potencial de ganho de escala. Mas o mercado endereçável é relevante, diz o fundador.
“Ano passado, mais de US$ 18 bilhões foram investidos em startups na América Latina, US$ 10 bi só no Brasil. E mais de 90% disso é nesse modelo de Cayman e Delaware, que precisa do serviço de câmbio para trazer o dinheiro pro Brasil,” ele disse ao Brazil Journal. “Além disso, estamos atendendo fundos de investimento também e, quando lançarmos o banco, vamos ter várias outras receitas.”
Na parte de fundos, a Trace está ajudando a Big Bets, por exemplo, a enviar dinheiro para o exterior para fazer seus investimentos em startups fora do Brasil.
Outros clientes da Trace são a The Coffee, a rede de cafeterias que usa a startup para fazer o câmbio da importação de seu chá matcha do Japão, e a CondoConta, que usou os serviços da startup para trazer os recursos que recebeu da Igah Ventures e da Redpoint eVentures em sua última rodada.