Parece altamente improvável que a British American Tobacco consiga retirar a Souza Cruz da Bolsa pagando apenas o prêmio que sinalizou hoje — de 30% sobre a média do prreço da ação nos últimos três meses.
É verdade que o Brasil está com a moral lá embaixo e que tem muito investidor sonhando com uma oferta dessas para sair de inúmeras posições micadas.
Mas a Souza Cruz não é qualquer empresa. É quase um unicórnio.
Trata-se de um daqueles raros duopólios que os investidores conseguem, de fato, comprar na Bolsa, em vez de estarem sob o controle privado e familiar que é uma das facetas do tal ‘patrimonialismo’ brasileiro.
Os pilares do negócio da Souza Cruz — marcas fortes, posição de mercado dominante e sensacional geração de caixa — fazem dela o tipo de empresa que Warren Buffett procura na Bolsa, fora o ‘detalhe’ de que a Souza Cruz está no negócio de cigarros, o que a torna anátema para alguns investidores.
Como consequência disso tudo, a Souza Cruz é uma das maiores pagadoras de dividendos do País, geralmente distribuindo 97% de seu lucro como dividendos.
A Souza Cruz tem cerca de 78% do mercado de cigarros do Brasil, enquanto a Philip Morris, sua única concorrente (além dos cigarros contrabandeados), fica meio perdida na fumaça.
Nos 57 anos em que está na Bovespa, a Souza Cruz sempre atraiu — e derrotou — os investidores que tentaram ‘shortear’ sua ação, vendendo o papel a descoberto e apostando em sua queda. Com o tempo, ela ganhou a fama de ‘short maldito’ porque paga tanto dividendo que o shorteador não consegue bancar a aposta por muito tempo.
Mas talvez o indicador mais definitivo de que esta é uma empresa rara seja o seguinte: Luis Stuhlberger, gestor do fundo Verde (o fundo com a melhor performance no País desde seu início em 1997), costuma dizer que a Souza Cruz é um dos únicos dois papéis na Bovespa que sempre performaram melhor que o Verde; o outro é Lojas Americanas.
Não é à toa que boatos de que a BAT fecharia o capital da Souza Cruz costumam aparecer na Bolsa com hora marcada, e principalmente quando o mercado está em baixa.
Desta vez, o boato se tornou fato, mas a história não deve terminar por aí.
Se a BAT conseguir, com um preço mais alto, tirar a Souza Cruz da Bolsa, este movimento vai diminuir as alternativas dos investidores que gerem carteiras focadas em grandes pagadores de dividendo. A liquidez extra tenderia a migrar para empresas como Cielo, Telefonica Brasil e Ambev.