Em 2013, Matheus Ladeia viu seu pai perder mais de R$ 200 mil em gado — os bois morreram de sede e de fome com a seca que assolou a Bahia.
O pecuarista — dono de uma pequena fazenda na minúscula Anagé — não tinha pasto para alimentar os bois e não conseguiu vendê-los a tempo.
O evento, traumático para a família, foi o pontapé inicial para Matheus criar a Erural.
A startup começou como uma plataforma para aluguel de pasto — que conectava quem tinha uma fazenda e não estava usando todo o terreno com quem tinha gado e passava por um processo de estiagem — e já pivotou pelo menos quatro vezes desde então.
Agora, parece ter encontrado o caminho da roça.
O negócio começou a ganhar tração há dois anos, quando Matheus transformou a Erural num marketplace que intermedeia a venda de dois tipos de gado: o chamado PO (Puro de Origem), que tem seu DNA registrado e é usado para a reprodução; e o gado de corte, que você compra no supermercado.
Nos leilões do gado PO, que hoje são feitos em grande parte em canais de televisão especializados, a Erural se posicionou como uma camada adicional no processo: ao mesmo tempo em que o leilão está passando no Canal Rural, por exemplo, ele acontece também na plataforma da Erural.
“Nesse modelo, a gente dá uma experiência de compra melhor pra quem comprar pela Erural. Ele vai ter um atendimento diferenciado, seguro por 45 dias do animal e uma venda consultiva,” Matheus disse ao Brazil Journal.
Já nos leilões de gado de corte, as vendas são 100% digitais e apenas na plataforma, mas a Erural criou um exército de representantes — que ela chama de ‘hunters’ — que vão nas fazendas dos pecuaristas filmar, pesar e garantir a qualidade dos animais que vão ser colocados à venda.
“Na pecuária você tem que ser digital mas com um pé na lama, com um pé na bosta,” disse o fundador.
Os ‘hunters’ da Erural recebem uma taxa inicial pelo serviço de ir nas fazendas (uma espécie de custo de originação para a startup) e também ficam com uma pequena parcela da comissão que a Erural ganha quando o animal é vendido.
Por enquanto, esse modelo está rodando apenas na Bahia, Sergipe e Alagoas com perto de 100 hunters. O plano é criar essa rede em outros locais para expandir o negócio Brasil afora, começando pelo Nordeste.
“Esse é um modelo local que não viaja entre Estados: o gado só é vendido entre pecuaristas da mesma região,” disse Matheus. “Então precisamos montar essa rede e ir abrindo praça a praça.”
A Erural está tentando digitalizar um dos recantos mais conservadores do agronegócio brasileiro. (Enquanto o agricultor já tem uma cultura mais forte de usar tecnologia para aumentar a produtividade, boa parte dos pecuaristas ainda olha com cara feia quando o assunto é inovação.)
Pelo jeito, tem dado certo.
A empresa já vendeu 6.000 cabeças de gado de corte e 1.000 de gado PO este ano, movimentando mais de R$ 40 milhões. A expectativa é que esse GMV feche o ano em R$ 77 milhões e chegue a R$ 110 milhões no ano que vem.
A cada venda, a Erural ganha uma comissão que varia de 4% a 7%.
A empresa ainda está arranhando a superfície de um mercado que movimenta mais de R$ 17 bilhões por ano no Brasil. A aposta é que, aliando tecnologia e sola de sapato, a startup vai conseguir convencer o pecuarista dos benefícios do mundo digital.
No médio prazo a ideia é transformar a Erural num marketplace completo para o pecuarista — que além do gado ofereça insumos, serviços, conteúdo e até produtos financeiros como antecipação de recebíveis.
Para financiar os planos, a startup acaba de fechar uma rodada de R$ 1,5 milhão que vai funcionar como uma ponte para um Series A previsto para o começo do ano que vem — quando pretende levantar de R$ 8 milhões a R$ 10 milhões.
Na rodada de agora, os principais investidores foram Daniel Freuler, um banker de M&As que atua no Norte/Nordeste; Marcos Chalhoub Lima, um grande pecuarista; e a Lighthouse Invest, um fundo de VC brasileiro da Bahia focado em early stage.