TORRÕES, sertão de Alagoas — Vim a este povoado, a 230 quilômetros de Maceió, conhecer pessoalmente o trabalho das costureiras no centro de treinamento do projeto Amigos do Bem.
Há cerca de quatro anos, o Instituto Duda e Adelina, que leva o nome dos meus pais, doou máquinas de costura e ofereceu treinamento de técnicas de patchwork para as mulheres atendidas pelos Amigos do Bem. Hoje, as sacolas que elas fabricam são vendidas nas lojas do Pão de Açúcar em todo o Brasil.
Conheci os Amigos do Bem por meio de sua fundadora, Alcione Albanesi, quando iniciamos o grupo Mulheres do Brasil, há cinco anos. Fiquei encantada com a dimensão e o alcance desse projeto que está transformando a vida de mais de 60 mil pessoas tanto aqui, no sertão de Alagoas, quanto no Ceará e em Pernambuco. Além de dar o peixe, a Amigos do Bem ensina a pescar.
A instituição surgiu em 1993 por iniciativa de Alcione e começou arrecadando brinquedos e alimentos para levar para o sertão na época do Natal. Depois veio distribuição de água. Aos poucos, a Amigos do Bem passou a levar médicos e dentistas em mutirões de voluntários. Hoje, leva muito mais: transformação para a vida das pessoas, por meio de educação, moradia, saúde, saneamento básico e programas de geração de emprego e renda.
A Amigos do Bem conta com quatro Centros de Transformação que atendem cerca de 120 povoados, fornecendo 180 mil refeições por mês.
Há ainda quatro ‘Cidades do Bem’, com moradias em alvenaria, saneamento básico, luz elétrica, hortas comunitárias, padaria, marcenaria, cabeleireiro, escola, área de lazer, plantação de cajueiro e fábrica de doces e de beneficiamento de castanha de caju.
Desde 2002 já foram construídas 500 casas de alvenaria. Aos poucos, elas vão substituindo as casas de taipa, espalhando dignidade e saúde. As famílias beneficiadas se envolvem na construção e recebem a casa mobiliada, com todo o enxoval.
Além de escola em período normal – e ônibus que buscam as crianças e jovens pela região – há atividades extra-curriculares e cursos profissionalizantes de informática, música, inglês, dança e gastronomia. O projeto também conta com farmácias e atendimento médico, odontológico e psicológico – com profissionais voluntários de São Paulo que vão para lá todos os meses.
Mais de 150 jovens que passaram pelas escolas criadas pela Amigos do Bem estão cursando faculdade. Nesta minha visita, conversei com jovens que estão se preparando para fazer mestrado. Não se vê uma criança que não esteja de banho tomado, com dentes arrumados. Fiquei tocada em ver a alegria e o amor das crianças que não me pediam nada. Queriam apenas abraçar.
Além de Torrões, visitei Catimbau e Inajá, em Pernambuco. A geração de renda é desenvolvida através das oficinas de costura, nas fábricas de doces e de beneficiamento de castanha e também nas plantações de caju. Nas oficinas de costura, mais de 200 mulheres produzem mais de 15 mil sacolas por mês.
Não tem preço ver a felicidade de pessoas que nunca tiveram um emprego e agora se sustentam com dinheiro do próprio trabalho. Elas se sentem inteiras e realizadas.
O escopo e a escala dos Amigos do Bem impressionam. É um aparato gigante. Alcione, que começou como empresária fundando a empresa de lâmpadas FLC, faz o trabalho de 20 ONGs juntas, comandando um exército de 9 mil voluntários.
O sistema é todo informatizado. Cada família conta com um Cartão do Bem, com código de barras, que serve para a distribuição dos benefícios como para o acompanhamento das famílias. Para participar, é preciso levar os filhos para a escola, manter as casas limpas e arrumadas, respeitar e ajudar o próximo.
A beleza dos Amigos do Bem é o olhar de transformação. Não é só levar pão e água. Antes desse projeto, nessas comunidades existia somente a fome, a sede e a falta de esperança.
Em São Paulo, a Amigos do Bem recebe doações (roupas, comida e remédios) para enviar aos mais de 120 povoados.
A cada dois anos, é realizado um jantar beneficente para apresentar o projeto a parceiros e amigos e arrecadar os recursos fundamentais para manter o projeto. O próximo jantar será hoje no Espaço das Américas, quando Alcione e seus voluntários receberão 3 mil pessoas.
Sônia Hess é ex-presidente da Dudalina e conselheira da Amigos do Bem.