Numa esquete clássica do Monty Python, uma turba sedenta de sangue captura uma ‘bruxa’ e clama por sua execução. A moça está mesmo vestida de bruxa e tem até um nariz pontudo — mas, segundo ela, foi a turba que a vestiu assim.

No Brasil despirocado da última semana, a bruxa do momento se chama Pedro Parente, o CEO da Petrobras.

Por convicção ideológica, cálculos políticos ou motivações desconhecidas, muitos querem atear-lhe fogo à roupa e forçar sua saída, sem preocupação com os fatos e sem apreciação pelo trabalho que ele, Ivan Monteiro e equipe fizeram na empresa — um trabalho técnico e apartidário na empresa mais politizada do Brasil.  

Parente começou a ser empurrado para a fogueira pelo movimento caminhoneiro, que o responsabilizou pelo alto preço do diesel (como se a Petrobras fosse uma instituição de caridade e o petróleo não estivesse a US$ 70 o barril). A histeria das estradas fez com que até no PSDB, talvez o único partido do qual Parente poderia esperar alguma lealdade, houvesse vozes aderindo ao populismo.  

O Senador Cassio Cunha Lima pediu a demissão imediata de Parente, reclamando de sua ‘arrogância’ por não aceitar rediscutir a política de preços dos combustíveis. O sarampo populista logo contaminou a Senadora Ana Amelia, que disse que Parente deveria ‘pedir o boné’.

Mesmo antes da crise dos caminhoneiros eclodir, a vilificação de Parente na Petrobras já se tornara um hobby dos sites de esquerda, que só se referem ao executivo com o prefixo ‘o tucano’.  Ontem, numa mesma matéria, o site Brasil 247 chamou Parente de ‘o coração do golpe’ que tirou Dilma do poder e disse que sua presença na Petrobras é ‘a raiz de todo o problema’. 10251 1745c934 3446 0000 0000 d8bb6904e563

Parente está sendo torpedeado até por alguém que o Brasil 247 chamaria de ‘a extrema direita’: a revista digital do site Antagonista.

Na semana passada, a publicação revelou, com tons de denúncia, que Parente é sócio de José Berenguer, o presidente do JP Morgan no Brasil, por meio de uma holding chamada Viedma Participações. Mas a ’sociedade’ é muito mais frágil do que sugere a manchete.

A Viedma pertence a Parente e a sua ex-mulher, Lúcia Hauptmann. Lúcia, que já era amiga de Berenguer antes mesmo de se casar com Parente, administra parte do dinheiro do banqueiro, assim como o de diversos outros clientes. No ano passado, Lúcia montou uma empresa, a Kenaz, para que esta empresa comprasse 20% de uma empresa do ramo imobiliário — um investimento de private equity. Ela a Pedro investiram via Viedma, que ficou com 65% da Kenaz. Berenguer e outro investidor, Odilon Nogueira, também colocaram uma grana: cada um dos dois ficou com 17,5% da Kenaz (R$ 210 mil cada.) 
 
A revista cavou fundo para encontrar uma suposta impropriedade no fato de que a Petrobras pré-pagou, em maio, uma dívida de R$ 2 bilhões com o JP Morgan — a dívida venceria em 2022.   

O Antagonista fez seu nome no colunismo político-policial, mas o mercado financeiro talvez lhe seja um terreno menos firme. Na verdade, o pré-pagamento da dívida com o banco significou uma economia de R$ 75 milhões para a Petrobras. A taxa do empréstimo com o JP Morgan era a Libor (a taxa básica de juros no mercado de Londres) de seis meses mais 2,50% ao ano. Como conseguiu outra linha de crédito mais barata — graças à nova política de preços que diminuiu seu perfil de risco — de Libor mais 2%, a Petrobras trocou uma dívida mais cara por uma mais barata, e pagou antecipadamente o empréstimo. 

Aliás, entre 2017 e 2018, a Petrobras pagou antecipadamente 55 operações de crédito com 24 instituições financeiras diferentes, no montante de US$ 28,9 bilhões. A operação com o JP Morgan não teria porque beneficiar Berenguer em nada. Como presidente do JP Morgan, Berenguer tem como missão ganhar dinheiro para seu banco. E um banco, como sabe qualquer calouro do Insper, ganha dinheiro cobrando juros, e não recebendo pagamento antecipado.

Ontem, a revista voltou à carga, acusando a Petrobras de contratar sem licitação uma empresa de Odilon Nogueira, o outro sócio da Kenaz. 

A Dana Tecnologias — da qual Odilon é sócio com sua mulher, Cristina (também amiga de Lúcia) — firmou um contrato de R$ 11 milhões com a Petrobras até 2020. Cristina é representante da Walking The Talk, uma consultoria de gestão empresarial que já trabalhou para empresas como o Itaú BBA, BM&F Bovespa e Infoglobo. A Petrobras disse que a dispensa de licitação é amparada em parecer do seu departamento jurídico porque a Dana é a representante exclusiva no Brasil da metodologia. Não obstante, depois da suspeita lançada, Parente pediu ontem que um comitê do conselho de administração avaliasse o assunto.

A esquerda repercutiu freneticamente o que seria o batom na cueca para derrubar Parente e, num momento cômico, a Revista Fórum reportou a ‘denúncia’ como se a Petrobras tivesse emprestado (!) R$ 2 bilhões ao JP Morgan… (Parente melhorou muito a empresa, mas ainda não fez milagre…)

Com a ‘denúncia’ fresquinha em mãos, o deputado federal Delegado Francischini (PSL-PR) correu para as redes sociais e bradou, com seu CAPS LOCK habitual, que vai convocar Parente ao Congresso e exigir sua cabeça. Muito próximo de Jair Bolsonaro, Francischini é um apoiador convicto da greve e um defensor estridente da ‘lei e da ordem’.  Já os fatos ele deixa indefesos. Recentemente, o deputado destinou R$ 24 mil de sua cota parlamentar para uma empresa que administra sites de ‘fake news’

 
Pedro Parente não é uma bruxa, mas em dois anos de Petrobras, ele cometeu suas heresias: parou de subsidiar a gasolina, fez o combustível passar a oscilar de acordo com o mercado internacional, estancou a sangria de caixa, e começou a reduzir o endividamento astronômico deixado por Dilma Rousseff, além de fazer a ação da empresa mais que dobrar de valor.  
Pode-se discordar da gestão de Parente. Mas tentar derrubá-lo por fazer seu trabalho ou, pior, transformá-lo em um crápula é aprofundar a vala comum onde estamos jogando todos os políticos e servidores públicos, num espírito de manada maniqueísta que despreza contexto e gradação.
Depois, todos nos perguntamos por que é tão difícil achar gente boa para trabalhar no Governo.