Uma das decisões de maior consequência para o futuro de curto prazo do País será tomada entre hoje e amanhã, e as perspectivas são preocupantes.
O leilão do excedente da cessão onerosa do pré-sal pode arrecadar bilhões para o País — financiando uma parte do déficit nas contas públicas e ganhando tempo para o fututro governo encaminhar a reforma da Previdência, esta sim, capaz de equilibrar estruturalmente as contas do País.
(O número de R$ 100 bilhões que circula hoje é só um chute. Inúmeras variáveis influem na arrecadação final, desde a modelagem do leilão — a cargo da ANP e do TCU — até o preço do petróleo no mercado internacional — que despencou de US$ 80 para U$ 60 em dois meses — sem falar que o valor líquido para o Tesouro depende ainda de um acerto de contas entre a União e a Petrobras.)
De qualquer forma, o pré-sal é um bilhete premiado para o Brasil, e o Governo Bolsonaro é quem vai à lotérica receber o prêmio.
A questão é: como o Brasil vai gastar o dinheiro?
A maldição do petróleo é um clássico da literatura econômica. São inúmeros os casos de países abençoados com a ocorrência abundante do ouro negro que nunca conseguiram sair da pobreza — vide México, Venezuela, Nigéria.
Será este o futuro do Brasil?
O próximo Governo concordou em dividir com os Estados 20% do valor arrecadado no leilão. Uma ideia seria condicionar esta partilha à aprovação da reforma da Previdência.
É uma má ideia.
Ao invés de encarar apoio à reforma como um favor que os Estados fazem à União, a reforma tem que ser vista pelo que é: um benefício aos estados. É o sucesso da reforma que vai definir se os governadores conseguirão governar quatro anos em tempos de paz ou de tensão constante.
União e Estados estão todos no mesmo barco, e não é uma injeçãozinha de mitigação de sufoco que vai resolver os problemas estruturais do pacto federativo.
Qualquer cheque enviado aos Estados vai acabar virando aumento de salário e de gastos. Já chegou a hora de empurrarmos com a barriga: é preciso, finalmente, fazer a reforma pelo lado da despesa.
E, ainda que houvesse um condicionamento da divisão do butim do pré-sal à aprovação da reforma, há um outro problema: o novo Governo não parece ter o seu projeto de reforma, e o Congresso atual não está disposto a votar o projeto desenhado pelo Governo Temer.
Em outras palavras: o novo Governo pode acabar entregando o ouro sem receber nada em troca.
Para viabilizar a partilha, o próximo Governo precisa do atual. Para não atrasar a tramitação do projeto que autoriza o leilão, a partilha terá que ser viabilizada por uma Medida Provisória, que teria de ser encaminhada pela Fazenda ao Planalto.
Tanto o Ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, quanto sua No. 2, Ana Paula Vescovi, estão dizendo a portas fechadas que não assinariam uma MP que dê a partilha “de graça” aos Estados.
Basta ler os jornais: a maioria esmagadora dos Estados não tem feito o dever de casa, não tem enxugado custos, não quer privatizar, e tem feito corpo mole na Previdência.
Sem disposição para colocar seus nomes no que consideram ser uma má política pública, Guardia e Vescovi estão exigindo contrapartidas — ou então que o próximo Governo edite a sua própria MP.
Um detalhe técnico mostra como esse papo de divisão com os Estados chega a ser surreal: se a Fazenda atual concordar em repartir, digamos, R$ 20 bilhões com os Estados, a Lei do Teto obriga que eles cortem R$ 20 bilhões em outra parte do Orçamento. A fila para receber o butim está repleta de governadores, mas a fila de corporações dispostas a aceitar os cortes, curiosamente, está deserta.
O lobby dos Estados é liderado pelo presidente do Senado, Eunicio Oliveira, um representante máximo da forma como as coisas são feitas no Congresso atual.
Vendo o meio de campo embolado, e sentindo a falta de estratégia do futuro governo, Eunicio ainda colocou um jabuti na conversa: um PL que concede benefícios fiscais a empresas localizadas nas áreas da Sudene e da Sudam. Nada mais moderno… disruptivo…
Enquanto isso, segundo o Estadão, Eduardo Bolsonaro disse ontem em Washington que o governo “talvez não consiga aprovar” a Previdência. É uma sinalização preocupante, o equivalente a suspirar ao receber suas cartas no jogo de pôquer. Todo mundo nota, e você fica mais vulnerável.
Não nos iludamos: na economia, a luta do ‘Brasil velho’ — que reza na cartilha do ‘venha a nós o vosso reino’ — contra o ‘Brasil novo’ — o Estado mais leve e eficiente que Guedes e sua equipe querem instaurar — será épica.
O próximo Governo deveria falar mais duro, e Bolsonaro deveria usar sua popularidade para explicar ao País a necessidade urgente da reforma da Previdência.
Mais: deveria insistir obsessivamente do assunto, porque, sem esta reforma, a volta da confiança será um voo de galinha, e, sem investimentos pesados do setor privado, seu Governo perderá popularidade mais rápido do que se imagina.
Tomara que o problema não seja falta de convicção.