André Freitas administra mais de R$ 3 bilhões em nove fundos imobiliários, entre eles o Hedge Brasil Shopping (HGBS11) — o maior FII de shoppings do Brasil. Nos últimos dias, com a ordem de fechamento de malls em algumas cidades, o investidor pessoa física entrou em pânico e as cotas despencaram.
O temor é que os fechamentos gerem uma redução drástica no pagamento de dividendos.
Freitas detalhou ao Brazil Journal como está vendo o impacto dessa crise nos fundos de shoppings — e as medidas adotadas pelo HGBS11.
Abaixo, os principais trechos da entrevista:
Qual o impacto da crise para os FIIs de shoppings?
O impacto é grande porque podemos ficar sem receitas por algum tempo. Nos últimos dias estamos concentrados em tentar cortar o valor do condomínio o máximo que der. Nossa meta é diminuir o valor do condomínio mais da metade. Tem que ver a expectativa de quando vai ser a abertura, mas você tem que se preparar para ter uma redução significativa das receitas. Fica complicado você manter a sua estrutura de cobrança numa situação como essa. O shopping está fechado, o lojista também não fatura.
Eu acho que as principais entidades de classe e empresas de shopping vão discutir alternativas que visem trazer algum equilíbrio. Da nossa parte, como empreendedores, vamos tentar diminuir muito o condomínio. Por outro lado, precisamos ver como vão ficar os aluguéis. Isso acho que vai demorar pelo menos uma semana para ser discutido.
Mas vamos vendo mês a mês, porque a situação realmente é diferente de tudo. Eu tenho 37 anos de mercado e nunca esperei pegar um negócio desses. Ele tá aí desde janeiro, você olhava o jornal e não prestava atenção: ‘pô, coisa chata, não param de falar nesse negócio, coisa da China’. Aí chega no Brasil e ganha essa dimensão. Você achava que era um gatinho e agora virou um leão.
Mas existe a possibilidade de ficar um ou dois meses sem pagar dividendos para os cotistas?
Eu acho que existe essa possibilidade para alguns fundos imobiliários de shoppings, mas não acredito que seja o nosso caso. Temos um portfólio bem diversificado, temos lucros acumulados que podemos distribuir, e temos caixa, que está aplicado e que gera receita. Temos uma condição que provavelmente vai nos dar mais folga. Não temos nenhuma previsão ainda, vamos viver um mês de cada vez… Mas em março, por exemplo, o dividendo que vamos anunciar dia 31 ele em grande parte é referente a competência de fevereiro. Então uma boa parte dele já entrou. Uma outra parte não entrou, e provavelmente não vai entrar porque os shoppings vão segurar para tentar se prevenir para os próximos meses. Acho que na próxima distribuição de dividendos já pode ter um impacto, mas o HGBS11 não vai ter distribuição zero.
Apesar de traumática, essa crise uma hora vai acabar. Você acha as quedas nas cotas exageradas?
É uma oportunidade única de compra. Você está comprando ativos que são super difíceis de originar em alguns casos a 60% do valor patrimonial. O valor patrimonial do HGBS11 é R$ 239 e a cota fechou ontem a R$ 182. Então, está com um desconto de quase 30%. E durante o dia teve negociação a R$ 145… a média negociada ontem foi em torno de R$ 160. A negociação foi pequena, de R$ 6,5 milhões, mas você tem a seguinte situação: não tem comprador novo, porque as pessoas estão reavaliando seus caixas, e você tem o vendedor do ‘get me out’, o desesperado que quer vender a qualquer preço. Recebemos várias ligações de pessoas querendo liquidar a mercado.
É hora de arbitrar entre preço e valor?
Isso. Eu prefiro olhar o valor patrimonial, o valor de reposição. Como eu replico o que eu tenho no portfólio? Tiramos 40% do valor do Parque Dom Pedro, do Mooca, em uma semana, por causa de uma crise? Não é por aí.
Nós já vimos isso antes. Em 2015, 2016, também tivemos um grande desconto das cotas em relação ao valor patrimonial, e foi uma excelente oportunidade de compra. Quem comprou ali não se arrependeu. Colheu os frutos quatro, cinco anos depois, quando tivemos a melhora.
Temos juros muito baixos, de 3,75%, que devem continuar por um bom período. O custo de carrego de uma posição como essa é baixo, porque o juro é baixo. Seu custo de oportunidade é baixo. Vamos dizer que você fique 4 meses mal remunerado, recebendo muito pouco. Mas se você tivesse aplicado em CDI você ia ganhar 3% ao ano. Em 4 meses, 1%. Então seu custo de oportunidade é 1% pra segurar uma posição dessas por 4 meses. Pra mim não é uma questão nem de pensar. Toda a liquidez que eu tivesse eu colocaria em FIIs.
Tem questões de operação, mas por uma força maior. Estamos numa calamidade pública… Quantas ondas vamos ter? Seis ondas de 15 dias, portanto 90 dias? Depois que passar a pandemia as pessoas não vão mais no shopping? Não vão mais no cinema, no restaurante? Não. Vai normalizar. Mas em ondas, vai levar um tempo. E daqui 90, 150 dias já vai ter vacina, um remédio.
Agora estamos no pior momento, que é o momento de comprar. Você não tá comprando o operacional. Eu não to comprando ação da Gol, você tá comprando um shopping, que vai ficar fechado. Então sua despesa também vai diminuir. Aí você tem caixa, você vai tocando sua vida. Você acha que o shopping Iguatemi, o mais antigo da cidade, vale 40% menos hoje porque vai ter que ficar alguns meses fechado? Não vale.
Muita gente entrou em pânico…
Sim, dá esse pânico. Muitas vezes também é necessidade, a pessoa precisa daquele recurso, infelizmente atravessamos a migração de renda fixa para a variável de forma muito acentuada. E ontem, em determinado momento, com o iFix batendo 1.900, voltamos a junho de 2017. Numa conta burra, todo mundo que entrou depois disso tá debaixo da água… tem muita gente, pessoa física, que sente pânico, stopa, que não está acostumado. O cara tava lá no CDB do Bradescão, do Itaú, do Banco do Brasil tranquilo, aí começou a mudar, comprou mais um pouco, mais um pouco, aí o negócio caiu 40% na cara dele. É natural um movimento de pânico no primeiro momento.