Até recentemente, o estrategista-chefe do Santander Brasil, Daniel Gewehr, era quem fazia as análises ESG do banco — que se limitavam a alguns poucos relatórios e eventos com o buyside.
“Mas para fazer bem feito, você tem que ter um time dedicado,” Daniel disse ao Brazil Journal. “Esse é um assunto muito denso e que tem se provado cada vez mais um diferencial de geração de alfa e mitigação de risco.”
Com isso em mente, o Santander acaba de contratar uma head de research para focar apenas em ESG — Maria Paula Cantusio, até recentemente relações com investidores na S&P — e lançou seu primeiro relatório robusto sobre o tema.
Em quase 60 páginas, o relatório destrincha o cenário global e nacional de ESG, junta dados que mostram o aumento do interesse de investidores pelo assunto — e apresenta a primeira carteira ESG do banco.
As 14 escolhidas: CPFL, Ômega Geração, Localiza, Gerdau, Lojas Renner, Odontoprev, Magazine Luiza, Natura, Itaú, Porto Seguro, Rumo, São Martinho, Suzano e Totvs.
O Santander tomou a decisão — controversa para muitos — de não vetar setores vistos como danosos ao meio ambiente, como petroleiras, mineradoras e siderúrgicas. (As duas exceções: fabricantes de armas e tabaco.)
“A ideia foi não penalizar as empresas pelo setor em que atuam e fazer uma análise que conseguisse equipará-las, independente do setor ,” diz Maria Paula, que assina o relatório.
Para chegar nos 14 nomes, o primeiro filtro foi selecionar as empresas que tinham um ‘buy’ ou ‘hold’ no research do Santander. A partir daí, Maria Paula selecionou as 30 empresas com o melhor histórico de governança e maior abertura de dados sobre ESG. Depois disso, fez uma análise qualitativa de diversos aspectos ligados a ESG — desde a qualidade do relatório de sustentabilidade até a diversidade na companhia.
Na carteira, o nome mais controverso é o da Gerdau, que atua num setor dificilmente associado à sustentabilidade.
“A indústria de siderurgia e mineração não tem produtos substitutos, ela não vai desaparecer no futuro, então o que temos que ver é quem são as companhias preocupadas em se tornar menos poluentes,” diz Maria Paula. “Dentro do setor, a Gerdau é de longe a que tem as melhores práticas de sustentabilidade.”
A analista nota que 70% de tudo que a Gerdau produz vem de sucata, frente a uma média de 30% do setor. Além disso, a empresa é a mais eficiente em termos de emissões de CO2, usa carvão vegetal em vez do carvão mineral, e busca “incansavelmente” alternativas para substituir os fornos de carvão mineral, diz Maria Paula.
O estudo conclui que dois grandes temas ainda precisam ser endereçados pelas empresas da carteira: assumir metas e compromissos mensuráveis de longo prazo, e cuidar mais da questão da diversidade.
“As empresas em geral falam que estão engajadas com os 17 ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da ONU, mas quando chega o momento de assumir um compromisso prático — ‘vou reduzir minhas emissões em X% até 2030’, ou ‘aumentar o número de mulheres em Y%’ — elas ainda deixam muito a desejar.”
A dedicação do Santander ao tema vem num momento em que os investimentos ESG estão mudando de patamar em todo o mundo.
Os maiores e mais importantes investidores globais — responsáveis por US$ 103 trilhões em investimentos, ou 90% dos ativos sob gestão no mundo — são signatários do PRI, o “Principles for Responsible Investment”, criado pela ONU em 2016 para promover a incorporação de critérios ESG nas análises e decisões de investimento.
Hoje, o PRI exige que 50% dos recursos administrados por estes gestores passem pelo filtro ESG. Em abril, este patamar mínimo subirá para 90%.
De acordo com a Anbima e a KPMG, 70% dos investidores institucionais brasileiros já possuem ou estão desenvolvendo uma política formal de investimentos sustentáveis. Nos fundos de ações brasileiros, apenas 0,12% dos recursos sob gestão estão em fundos que têm ‘ESG’ no nome, mas o Santander acredita que o número seja maior.
Um estudo anual da KPMG mostra que 85 das 100 maiores empresas brasileiras têm políticas ESG baseadas em estruturas globais (geralmente a Global Reporting Initiative, ou GRI). A mesma pesquisa mostra que a média global é 80%, enquanto no México o número chega a 100%.
Na Bolsa brasileira, já há quatro ETFs que investem em ESG: dois do Itaú, um da BlackRock e um do BTG — este último, lançado em outubro, responde por metade dos cerca de R$ 220 milhões desta classe de ativos.