Como o fruto não cai muito longe da árvore, Efraim Horn quase não fala com repórteres – a não ser que isso ajude a vender.
E o co-presidente da Cyrela está com produto novo na praça: um prédio de 42 andares – o nono mais alto de São Paulo – lançado no bairro de Perdizes.
No dia da nossa conversa, Efraim posou para fotos com os corretores no estande de vendas, fez questão de dar um tour pelos apartamentos decorados e caprichou no pitch.
“Se o vento vier do leste, você sente o cheiro de café das fazendas de Minas Gerais,” exagera o filho de Elie Horn ao descrever um prédio próximo, um empreendimento comercial da Cyrela também lançado recentemente.
Efraim assumiu o comando da Cyrela ao lado do irmão, Raphael, em 2014. É responsável pela visão de produtos e marca, enquanto Raphael cuida da gestão.
O pai, que presidiu a empresa desde sua fundação em 1978, está no conselho desde 2014 – mas continua ativo na companhia, participando, por exemplo, das reuniões sobre a escolha de terrenos. “A Cyrela é quase um parlamentarismo,” diz Efraim.
Para atravessar os altos e baixos da economia, a receita de Efraim é fazer planejamento curtos – com ajustes mensais – e “lançamentos submarinos”, aqueles com a capacidade de atrair clientes mesmo num ambiente hostil. “Se há um tsunami na superfície, o barco sofre, mas a 100 metros de profundidade, o copo nem se mexe.”
Na sua visão, o mercado imobiliário deve encolher 20% este ano, e as empresas precisam ser conscientes ao correr riscos. “É melhor ficar vivo para contar a história do que ser a história que os vivos vão contar.”
A seguir, os principais trechos da conversa:
A Cyrela está lançando mais empreendimentos este ano do que em 2022, apesar do ambiente macro complicado. Por quê?
Tentamos fugir daquilo que já é oferecido por outras empresas. Sendo assim, um boom vai acelerar as nossas vendas, mas uma economia normal, ou mais difícil, abre espaço para o flight to quality, e é aí que nos encaixamos.
Se entregamos uma oportunidade, uma ponte para um universo que o cliente não tinha, mas que agora visualiza que pode ter, ele se encanta. Mesmo quem não está procurando pode decidir comprar. E quem já queria comprar escolhe o melhor custo-benefício atrelado à experiência. É assim que conseguimos colocar os produtos na rua. O lançamento do On the Sky (o residencial de 42 andares), um produto único, é um exemplo disso.
Outro exemplo recente: no fim do ano passado, estávamos vivendo a Copa do Mundo, ou seja, as pessoas estavam um pouco desfocadas. Além disso, havia a incerteza de um novo presidente, juros altíssimos, inflação elevada, guerra. Em resumo, não era um momento de prosperidade ou de fazer apostas.
Decidimos lançar um empreendimento na cidade de São Paulo com um VGV de R$ 2 bilhões. Não lançamos tudo de uma vez: a primeira fase somou R$ 800 milhões. Em cinco meses, vendemos cerca de R$ 420 milhões. O restante, que seria lançado em dois anos, será colocado na rua no segundo semestre de 2023.
Mas vocês tiveram de baixar os preços. Ao lançar o On The Sky, você disse que os preços estavam cerca de 10% menores. Isso tem sido uma constante?
Quando o volume lançado é muito grande, optamos por essa estratégia para deixar parte da valorização com nosso cliente ou investidor. Preferimos não capturar todo o potencial de valorização em cada produto para conseguir ir para os próximos e manter o nosso número de VGV entre R$ 5 bilhões e R$ 6 bilhões por ano.
Esse cenário de lançamentos e vendas que você descreveu vale para todos os tipos de empreendimento ou só para os de alta renda?
Estou falando da marca Cyrela, de alta renda. Na classe econômica e na média renda, a dinâmica é diferente. Nossa marca de baixa renda é a Vivaz, que já opera na casa de R$ 1 bilhão por ano. É um projeto de futuro pela pirâmide demográfica de renda brasileira.
Depende de programas sociais como o Minha Casa Minha Vida, certo?
Sim. Desde que existe o Minha Casa Minha Vida, a demanda tem sido constante. De 1980 a dois mil e alguma coisa, todo mundo quebrava porque o governo fechava financiamento, quem começava a construir ficava sem recurso, o cliente não conseguia pagar. Atualmente existe uma política estável.
Como você vê a situação do mercado imobiliário hoje? Os players estão mais estruturados, ou ainda há aventureiros?
As empresas relevantes estão muito mais conscientes e fugindo de riscos desmedidos, porque viram que quem fez isso quebrou e sumiu. Viram amigos, parceiros e ex-sócios fechando, tendo que vender. Existe a consciência de que é melhor ficar vivo para contar a história do que ser a história que os vivos vão contar. O mercado deve diminuir 20% este ano em termos de lançamento – isso é uma estimativa, claro, porque o ano está para acontecer ainda.
O mercado deve diminuir 20%, mas vocês estão projetando crescer?
Projetamos ficar estáveis, 10% para cima ou para baixo, a depender das vendas. Não vamos brincar de nos superar só por nos superar. Planejamos um pipeline de lançamentos submarinos. Se há um tsunami na superfície, ou um maremoto, o barco sofre, mas no submarino, a 100 metros de profundidade, o copo nem se mexe. À medida que temos bons resultados, lançamos o próximo. Se as coisas não estão tão promissoras, postergamos.
A Cyrela fez algo que poucas empresas familiares conseguiram no Brasil: uma sucessão tranquila e uma co-presidência, já que você divide a presidência com seu irmão Raphael. Como vocês fizeram e fazem isso funcionar?
A Cyrela é quase um parlamentarismo. O doutor Elie sempre foi humilde, simples e curioso, então ele costumava ouvir vários diretores e corretores – até concorrentes – antes de tomar decisões. Essa prática não mudou. Hoje são dois co-presidentes, mas continuamos com a mesma filosofia. E o doutor Elie continua participando de todas as reuniões sobre terrenos. Então sim, houve uma transição no papel, mas a essência, o modelo, não mudou.
Como você enxerga o futuro da Cyrela daqui a cinco ou dez anos? Que lacunas do mercado a empresa ainda pode ocupar?
A Cyrela está usando seu know how para entrar em mercados complementares. Temos uma asset que constrói e investe em galpões logísticos; a financeira CashMe e o maior fundo de renda residencial da América Latina, em parceria com a gestora Vectis. Além disso, estamos fazendo nosso primeiro prédio corporativo para renda da própria empresa, em São Paulo.
Então, olhando para frente, a Cyrela vai ser uma empresa mais diversificada.
Não precisa olhar pra frente, é olhar para trás mesmo, já é assim.
Mas isso ainda representa uma parte pequena do resultado.
A Cyrela não vai fazer dos prédios de escritórios seu core business. Esse aqui do lado foi uma oportunidade, um terreno comprado ao longo de três anos em Perdizes com 6.500 m2 e uma vista para a Cantareira (ele mostra, em vídeo, a vista que os escritórios terão). Sabe o que está ali no fundo? Minas Gerais. Aqui é a baixada de Perdizes. Então você vê o infinito. Se o vento vier do leste, você sente o cheiro de café das fazendas de Minas Gerais…
Que conversa de vendedor, hein?
Mas é mentira? Se for mentira, você fala vendedor. Digo isso para a pessoa sentir na pele, para vibrar.
Para encerrar: como a economia deve se comportar este ano, na sua visão?
O Brasil hoje é muito mais estável e sólido do que há 20 ou 30 anos. Dá para sentir uma evolução gradual. Era impossível falar em vendas de R$ 5 bilhões há 30 anos, por exemplo. Gradualmente, as pessoas estão ganhando mais dinheiro e sonhando mais. Mas a concorrência é grande e as apostas também.
O perigo em economias assim é que temos picos de super oferta seguidos por contrações e recessões. Não conseguimos dar passos muito largos, nem fazer planejamentos longos.
O cenário está melhor, então vamos dobrar de tamanho? Nem pensar. Apesar de haver mais estrutura financeira, mais crédito, mais segurança jurídica, o planejamento é sempre feito ano a ano – e é ajustável mês a mês. A cautela é a mesma de anos atrás.
A economia é um fator neutro para quem já é brasileiro e está acostumado. É uma grande interrogação para os estrangeiros, que não entendem o país ou o comparam com os Estados Unidos.