O abalo provem de diversos polos: contágio argentino, pessimismo sobre as chances de um candidato moderado de centro nas eleições, e o crescimento cada vez mais desanimador do PIB, que tem ficado mais claro nas últimas semanas com os relatórios Focus do Banco Central.
Para piorar, o cenário internacional tem ficado menos benevolente. O dólar tem ganhado terreno sobre todas as moedas: trucidou a lira turca, o peso argentino e já opera acima de R$ 3,60 sem nenhum constrangimento.
Ainda assim, não há nada que esteja ruim que não possa piorar.
As notícias dos ‘hermanos’ são chorosas como o próprio tango: só ontem, o peso desvalorizou mais 7%, levando sua queda acumulada a 24% desde que o movimento atual começou no final de abril.
No front político interno, a pesquisa CNT divulgada ontem mostrou que a eleição de outubro continua destinada a um segundo turno entre Jair Bolsonaro e Ciro Gomes, dois candidatos conhecidos pela racionalidade econômica, a cabeça fria e a capacidade de construir consensos… (Pegadinha!)
Na superfície, o índice parece robusto graças à alta das commodities, que já dura meses e valoriza Petrobras e Vale, que juntas respondem por 25% do Ibovespa. “Todo dia tem gringo comprando Petrobras, e isso não tem nada a ver com a Petrobras per se,” diz um gestor. Petrobras PN sobe 63% no ano, Petrobras ON, 78%.
“O que está segurando a Bolsa ainda são os multimercados,” disse uma fonte numa grande mesa. “Como, graças às commodities, o índice tem performado melhor que o câmbio, os multimercados ainda estão segurando a parte de Bolsa em suas carteiras. Mas quando eles decidirem que não tem mais ‘alfa’ ali, a mudança de mão pode pesar ainda mais na Bolsa.”
Desde o início do ano, os multimercados atraíram captação líquida de R$ 37 bilhões e, nos últimos 12 meses, de R$ 102 bilhões. Coletivamente, esses fundos tem hoje cerca de R$ 900 bilhões sob gestão, metade do R$ 1,9 trilhão investido em fundos de renda fixa e quase quatro vezes os R$ 250 bilhões dos fundos de ações.
Até recentemente, as chamadas ‘empresas de qualidade’ estavam simplesmente ‘underperformando’ as empresas de commodities na Bolsa, ou seja, subindo menos. Nos últimos dias, passaram a cair de fato.
Tudo começou quando Ultrapar, Cielo e Raia Drogasil — referências no setor em que atuam — anunciaram resultados fracos.
Os problemas logo se espalharam: na sexta passada, o trimestre ruim da Kroton dragou todo o setor de educação. A Estacio, que já sofrera com dúvidas do mercado sobre sua nova política comercial, caiu mais 7,9% ontem. Alguns brokers notam que, como a ação havia se tornando um consenso entre os locais, “não entra ninguém para comprar porque todo mundo já está comprado.”