Publicado em 2015 nos Estados Unidos, e ainda sem data de lançamento no Brasil, Dead Companies Walking é mais do que um livro sobre short selling: é uma autópsia do fracasso das empresas.

O autor, Scott Fearon, em parceria com a jornalista Jesse Powell, faz uma profunda análise sobre os motivos que levam as empresas ao buraco. As ‘dead companies walking’ (do título) são companhias com faturamento em queda e endividamento em alta.

Fearon tem credenciais para falar do assunto. Gestor há mais de 20 anos, parte seu trabalho é identificar os problemas que levarão uma determinada empresa a perder valor (e em seguida apostar contra sua ação).  Ele também investe em empresas apostando na alta — aliás, um trabalho muito mais simples. (Quando se aposta na queda de uma ação, o ganho máximo é 100%, mas a perda máxima é em tese infinita, se a ação continuar a subir.)

Ao longo de nove capítulos, Fearon descreve inúmeras teses de investimento, revelando insights e conversas com CEOs e CFOs, e conclui que empresas em seu estágio final compartilham os seguintes erros comuns.

1) Aprendizado a partir de um foco indevido no passado recente;
2) Apego a uma fórmula do sucesso;
3) Leitura errada das necessidades dos clientes;
4) Management afastado do dia a dia das operações;
5) Acreditar cegamente em um business do momento;
6) Não enxergar mudanças claras em seus mercados.

A loja de departamentos JC Penney — um ícone do varejo americano — foi uma das apostas de Fearon. Uma série de erros, alguns deles clássicos, levaram a varejista a apresentar uma retração de 25% nas vendas e resultado negativo de cerca de US$ 1 bi ao final de 2012: um desastre para os acionistas, mas lucro na veia para Fearon.

Assim que assumiu o cargo de CEO da JC Penney, Ron Johnson, um ex-executivo da Apple, tentou transformar a rede tradicional, voltada ao americano médio, em uma varejista de luxo.

Johnson cortou os tradicionais cupons de desconto, todas as propagandas em espanhol (o Texas, sede da empresa, não só é o Estado com a maior concentração de latinos nos EUA, mas também o que abriga o maior número de lojas da JC Penney, 91 no total) e até o número de caixas registradoras. Ao retirar boa parte dos caixas das lojas, Johnson queria dar agilidade às vendas, que seriam realizadas via iPads pelos funcionários. No entanto, como cerca de um quarto das vendas eram feitas em dinheiro, o sumiço dos caixas não só constrangia os clientes que queriam pagar em dinheiro como criava dificuldade para eles, que deveriam se deslocar a um canto da loja para efetuar a compra.

E, como se a coisa não pudesse ficar pior, todo esse plano de ‘turnaround’ foi elaborado muito longe da cidade de Plano, Texas, sede da empresa. Nos pouco mais de 18 meses em que esteve à frente da JC Penney, Johnson jamais chegou a trabalhar de fato no escritório da companhia. Manteve sua rediência no Vale do Silício, na Califórnia, e viajava todas as semanas, em jato particular pago pela empresa, até Dallas, onde fazia check-in no Ritz-Carlton. Isso mesmo:  quem quisesse conversar com o CEO da varejista deveria se dirigir ao hotel cinco estrelas. A interação dos funcionários com seu chefe era feita através de vídeos gravados ou vídeo-conferência.

Entre outras teses de short selling de Fearon estão casos clássicos como o da Blockbuster, que por muito tempo foi a maior rede de locação de filmes do mundo até cair diante de um novo concorrente, a Netflix, que, assim como a Blockbuster, teve sua origem na locação de filmes mas soube se reinventar com o tempo.

Há ainda teses mais óbvias, como a da empresa Quokka Sports, cujo principal negócio era transmitir em tempo real corridas de vela. O diferencial, segundo seu CEO, um aficcionado pelo esporte, era que o usuário poderia escolher uma entre diversas câmeras fixadas nas velas.

Fearon sabia que tal negócio jamais se sustentaria. A empresa trabalhava com uma estimativa para a America’s Cup, a maior competição de vela do mundo, de pouco mais de 2 milhões de expectadores só nos Estados Unidos.  Ninguém passaria a gostar de um esporte como este apenas por conta de uma experiência imersiva proporcionada pelas câmeras a bordo das velas. Além disso, o esporte sempre foi restrito a um nicho de pessoas. Um ano após a visita de Fearon à Quokka Sports, a empresa já havia falido.

Além de ser um livro para empreendedores que querem aprender com o fracasso dos outros, Dead Companies Walking é um lembrete de como o mercado é habitado por ideias insustentáveis — ou simplesmente ruins — que encontram compradores por muito tempo. Até que venha alguém e enxergue o óbvio.

Dead Companies Walking: How A Hedge Fund Manager Finds Opportunity in Unexpected Places
Autor: Scott Fearon e Jesse Powell
Editora: St. Martin’s Press
Lançamento: 2015
Páginas: 256 pags
ISBN-10: 1137279648
ISBN-13: 978-1137279644

 
 
Silvio Doria é formado em Administração pela FEA/USP e é analista de empresas. Recentemente venceu competições de research do Credit Suisse (CS Award) e da Constellation Asset Management (Constellation Challenge).