Toda vez que você tem que escolher entre duas, dez ou mil alternativas, e tem um tempo limitado para isso, há um número que resolve o problema para você: 37%.

Imagine que você finalmente cansou de ficar horas atrás do volante todo dia e decidiu procurar um apartamento mais perto do trabalho. Só que o mercado é brutal, e, para fechar o negócio, você tem que estar pronto para fechar o negócio no ato. Você precisa visitar alguns apartamentos para entender o que há por aí, mas visitar sem o talão de cheque significa perder a oportunidade. O que fazer?

Para obter a maior probabilidade de escolher o melhor apartamento possível, dedique 37% do seu tempo de busca para ver o que tem por aí, sem compromissos, mas esteja preparado para aceitar a primeira oferta de qualidade que for igual ou superior ao que você já viu assim que 37% do seu tempo tiverem decorridos.

Em outras palavras: se você tiver 10 apartamentos para visitar, ‘treine’ seu faro com os 3 primeiros, e esteja pronto para comprar o primeiro a partir do 4º que seja superior aos que você viu antes. Ou, por outra: se sua busca for durar 90 dias, dedique 33 dias para testar o mercado, e esteja pronto para assumir um compromisso a partir do 34º.

Esse resultado não é meramente um chute – é matematicamente provado como a solução ótima do problema de maximizar a qualidade de sua escolha sem informações adicionais. (E acredite: essa regra vale para a escolha de cônjuges, também.)

Essa e muitas outras teses curiosas são descritas em Algorithms to Live By: The Computer Science of Human Decisions (‘Algoritmos para o dia-a-dia: a ciência computacional das decisões humanas’, em tradução livre), escrito por Brian Christian, poeta com formação em computação pela Brown University e University of Washington, e o professor Tom Griffiths, diretor do Computational Cognitive Science Lab e do Institute of Cognitive and Brain Sciences da University of California, Berkeley.

Abordando questões de nossa rotina sob a óptica computacional, os autores chegam a conclusões surpreendentes (e muitas vezes úteis) como, por exemplo:

·         Sabe aquela pilha desorganizada de papel que seu filho deixa em cima da mesa de estudo? Pense duas vezes antes de mandar ele arrumá-la; ela pode ser a forma mais eficiente de organização de memória de curto prazo (a memória ‘cache’ de seu CPU faz o mesmo.)

·         Foi alocado em um projeto em andamento e não faz ideia de quanto tempo ele demorará? Sua melhor aposta é descobrir há quanto tempo o projeto começou e projetar a mesma quantidade de tempo para o futuro. (Uma aplicação do “Princípio de Copérnico”, conjectura que estabelece que situações especiais são, enfim, especiais, e que é mais provável estarmos próximos da média que do início ou fim de um processo.)

·         Precisa estimar a chance de fechar uma venda para o próximo cliente? Contabilize a quantidade de vendas fechadas e some 1, e depois divida o resultado pela quantidade de propostas somada a 2. (Fruto da aplicação do Teorema de Bayes, que mostra a relação entre uma probabilidade condicional e a sua inversa, associado a uma distribuição uniforme.)

·         Está quebrando a cabeça para achar a melhor disposição dos convidados nas mesas da sua festa de casamento? Relaxe: por mais tempo que você gaste, é impossível chegar à resposta certa. O assunto pertence à classe de problemas matematicamente intratáveis. É computacionalmente equivalente – algumas vezes, até pior! – ao de simular proteínas diferentes na indústria farmacêutica.

O livro é delicioso; ao mesmo tempo em que é acessível a todos os níveis de conhecimento prévio, o texto trata o leitor com maturidade e lhe permite entender alguns detalhes técnicos dos problemas abordados. Mas o que torna o livro tão especial são as várias discussões filosóficas que surgem dos assuntos tratados.

Os autores passeiam por temas tão diversos quanto as chances de se ganhar uma rifa, os algoritmos que permitem a internet funcionar e a importância da aleatoriedade para resolver problemas matemáticos de grande complexidade.  Assim, ao longo do caminho, os autores nos dão pistas sobre a própria natureza da mente humana e mostram como os métodos computacionais mais importantes do mundo moderno são muito menos precisos e rígidos do que parecem.

Fica claro que seres humanos e computadores têm muito mais em comum do que o leigo pode perceber. Observando algoritmos desenvolvidos para resolver problemas complexos da ciência de computação e lendo as histórias por trás de suas invenções, vemos como dilemas humanos e computacionais se conectam.  Há, por exemplo, um paralelo entre a tendência à experimentação por parte dos jovens e o apego às tradições pelos mais velhos e as estratégias de ‘explore’ versus ‘exploit’ de algoritmos de otimização.

Por fim, tomando-se o exemplo da ciência da computação, o livro faz a defesa do que os autores chamam de ‘gentileza computacional’. Ao demonstrar como as pessoas respondem mais positivamente a convites com data e hora específicas do que a convites a encontros ‘na hora que lhe for mais conveniente’, os autores argumentam que seres humanos, como computadores, são máquinas gerindo recursos computacionais escassos, e que, em geral, funcionam melhor quando padrões de transferência de informação são usados de tal modo que se minimize a necessidade de processamento total.

Se você é um nerd, geek, fã do Daniel Kahneman ou apenas um ser humano tentando ‘make sense of the world’, a leitura é prazerosa, ou mesmo indispensável.

 

Felipe Infante de Castro é um empreendedor brasileiro radicado em Boston, engenheiro eletricista pela PUC-Rio e MBA pela Harvard Business School.

 

Os autores Brian Christian e Tom Griffiths (Foto: Henry Young)

Os autores: Brian Christian e Tom Griffiths (Foto: Henry Young)