São Paulo, a cidade que não podia parar, parou no tempo.
Os vereadores da Câmara Municipal aprovaram ontem um projeto de lei que proíbe o uso do aplicativo Uber na cidade. Foram 48 votos a favor e um contra. O projeto ainda precisa passar por uma segunda votação e ser sancionado pelo prefeito Fernando Haddad.
Nos próximos lances dessa espiral reacionária, os fabricantes de velas estão pensando em marcar um protesto em frente à Eletropaulo, e os ex-funcionários da Kodak vão à Anatel para cassar a homologação do iPhone no Brasil, já que a câmera que Steve Jobs embutiu no celular desempregou todos eles.
Em suas desculpas esfarrap… ERRO, “justificativas” para criar esta reserva de mercado para o grande e vigoroso cartório que é o negócio de táxi, o vereador Milton Leite (DEM) disse que a liberação do Uber “é uma ofensa à estrutura do sistema de transporte público da cidade”. Ele afirmou que é preciso respeitar as regras que já existem dentro da legalidade.
Qualquer cidadão paulistano sabe que a verdadeira “ofensa à estrutura do transporte público na cidade” é a falta de planejamento e visão de mundo dos vários prefeitos e vereadores da cidade. Essa “ofensa” gera engarrafamentos de 130 quilômetros e um desperdício de tempo e combustível calculado em bilhões de reais por ano.
Ainda assim, a egrégia Câmara de Vereadores nunca conseguiu a quase unanimidade que obteve ontem para rechaçar o Uber em São Paulo.
Sim, vereador, “é preciso respeitar as regras que já existem dentro da legalidade,” mas tão essencial quanto isso é não criar novas regras que impeçam a inovação.
Ouvido pelo Estadão, o taxista Alexandre Dias disse que o uso do Uber prejudica toda a categoria. “Nós pagamos vários impostos para termos os carros regularizados e seguros. Não faz sentido, outros motoristas sem nenhum tipo de fiscalização trabalharem e ganharem como nós.”
Notem que o argumento da regulação é algo que afeta mais a cidade enquanto máquina de arrecadação do que o público. É a cidade que arrecada as taxas que, inclusive, encarecem o serviço. O consumidor só quer poder escolher. Em outras palavras, os taxistas deveriam, em vez de lutar contra a tecnologia, lutar por sua taxação, para tentar obter termos econômicos mais equitativos.
O economista austríaco Joseph Schumpeter (1883–1950) cunhou o termo ‘destruição criativa’ para descrever o processo pelo qual os mercados produzem o progresso.
Em seu “Capitalismo, Socialismo e Democracia”, de 1942, ele fala de um “processo de mutilação industrial … que incessantemente revoluciona a estrutura econômica de dentro para fora, incessantemente destruindo a velha e criando uma nova. Este processo de Destruição Criativa é o fato central sobre o capitalismo.”
O Uber não é mais barato do que o táxi, mas oferece, pelo mesmo preço, um serviço melhor.
Se os políticos deixassem as forças de mercado trabalhar, as seguintes coisas deveriam acontecer:
1 — Sentindo a perda de clientes, os táxis melhorariam o serviço prestado. Para muitos deles, não seria necessário nem abrir a porta para o cliente, nem oferecer água e até Bis, como alguns motoristas do Uber fazem. Bastaria ter o carro limpo e pensar no conforto do passageiro.
2 — Os taxistas lutariam pela redução de seus impostos, taxas e burocracria, para que seu serviço se tornasse mais competitivo com o Uber.
3 — Muitos taxistas — os que se identificassem com a proposta de serviço do Uber — deixariam suas autonomias e passariam a trabalhar para o aplicativo.
4 — Os consumidores se segmentariam: uma pessoa com tempo para programar sua viagem chamaria o Uber, assim como chama hoje as cooperativas de táxi. Já quem precisa de um táxi na hora (digamos, ao sair do dentista com pouco tempo para chegar a outro compromisso), pegaria o primeiro táxi que passar na rua.
O Uber não encolheu o tamanho do mercado (pessoas precisando de transporte). Ele apenas deslocou parte da demanda cativa que havia para um cartório (pesado, ultrarregulado, e com grande variança no serviço) para outros fornecedores (começando na vida, loucos para agradar ao cliente, com um nível de serviço superior). A troca é lógica.
Não se pode culpar os taxistas de São Paulo por lutarem pelo que eles acham que “é deles”. Essa é a reação instintiva de qualquer pessoa cujo ganha-pão é ameaçado.
Mas pode-se condenar os vereadores de São Paulo por serem covardes frente à pressão de um grupo que não representa o interesse público difuso (se é que algum político ainda se lembra o que é isso).