Marcos Hirai é um insider do varejo.

Nos últimos 25 anos, já foi empreendedor, lojista e executivo de grandes redes. Em seu currículo, consta que “participou da abertura de mais de mil lojas em shopping centers e ruas”.

Hoje, como sócio da BG&H Retail Real Estate, consultoria que representa 20 grandes redes de varejo em seus planos de expansão, Hirai tem uma visão de 360 graus sobre o que acontece no mundo dos shoppings e de seus inquilinos. As operadoras de shopping procuram a BG&H para mostrar os projetos que vão ser lançados, o que dá à consultoria um acesso privilegiado aos humores do mercado.

Esta semana, a EXAME que está nas bancas trouxe uma nota com o título, “Muito shopping, pouca loja”. A revista cita dados da BG&H mostrando que nos próximos quatro anos 122 novos shoppings serão abertos no Brasil, um recorde. E o pior: “a vacância média dessa nova onda de inaugurações será de 30%”.

O número é desconcertante, mesmo à luz do PIBinho. A coluna ligou para Hirai para entender melhor a indigestão do setor. A conversa foi assim:

Esse problema da vacância de 30% afeta todos os players do mercado?

Esse fenômeno está muito localizado em shoppings do interior, em cidades pequenas e médias, e em operadoras menores, que não são as ‘top 5’ do mercado. Estas operam mais nas capitais e grandes cidades, onde você também vê vacância, mas numa escala menor. Quando falamos desta vacância alta, estamos falando principalmente de lojas satélites.. Isto não acontece com lojas âncoras e redes de fast food, que têm vida própria.

Por que está havendo essa vacância tão alta?

As grandes redes de varejo e de franquia ainda estão conhecendo as pequenas e médias cidades, que ainda são dominadas pelo comércio local. Existe um receio maior das grandes redes de entrar nestas cidades. No caso específico das franquias, existe também a limitação de encontrar operadores locais dispostos a operar naquela localidade específica. Além disso, as grandes redes de shopping center têm um poder de barganha maior com os varejistas, e os empreendedores de shoppings menores têm menos. Como existe muita oferta de shopping sendo lançado…

Isso explica a vacância pelo lado da demanda, mas e quanto ao lado da oferta?

Muitos deste empreendimentos foram planejados em outro momento da economia. O dinheiro foi captado e os estudos foram feitos em outro momento. As empresas fizeram estudos que demonstravam o potencial de uma determinada região, mas só se esqueceram de combinar entre eles. Os estudos indicavam que havia espaço para um shopping. Um das principais causas destas vacâncias é o excesso de empreendimentos novos em cidades que não comportam mais de um shopping. Foi isso que aconteceu naquela corrida para a conquista de novos territórios.

O momento da indústria de shoppings é negativo?

Não há um ranking mundial, mas tudo indica que o Brasil é o País com o maior número de shoppings em construção do mundo: são 122 shoppings a ser entregues nos próximos quatro anos. Até janeiro, eram 122 nos próximos três anos, mas depois da segunda quinzena de março, muitas obras de shopping entraram em marcha lenta por conta do arrefecimento do consumo.

Se a vacância alta afeta mais os pequenos e médios operadores, isso quer dizer que os acionistas da Multiplan, BR Malls, Aliansce e Iguatemi não têm nada com que se preocupar?

Isso afeta as grandes também. O varejista com menos dinheiro para expansão não aceita pagar qualquer preço. Ele faz muito mais conta e tenta reduzir seu custo de ocupação. Isso afeta os grandes sim porque a receita com novas locações talvez não aconteça com tanto vigor quanto antes. Na dúvida, o varejista não fecha negócio.

Se este é o caso — se há dois shoppings onde na verdade só caberia um — isso quer dizer que nem mesmo se o PIB voltar a crescer 5% haveria uma solução para estes casos? Isso é um ‘peso morto’?

Existem algumas praças onde a solução não será de curto prazo, nem mesmo com a recuperação da economia. Em cidades médias e pequenas, há ainda a questão cultural: as pessoas ainda compram na rua, e o lojista então não vê por que ir para dentro do shopping. Existem projetos em que o consumidor ainda não assimilou o shopping center.

A Multiplan inaugurou ontem a sétima expansão do BarraShopping, no Rio, com 51 novas lojas, 100% locadas. O que isso quer dizer, em termos de como está o mercado?

Em shoppings consolidados como o BarraShopping, há uma fila de espera. Em novos shoppings, a coisa é diferente. Há também o fenômeno das marcas internacionais. Elas estão ainda em processo de ingresso no mercado brasileiro e entram principalmente por meio das grandes operadoras. Isso tem beneficiado muito a taxa de vacância das grandes. As marcas internacionais — umas 45 ingressaram nos últimos 18 meses — podem também ajudar a diminuir a vacância dos shoppings novos. A Calvin Klein está com a estratégia de fugir do eixo Rio-São Paulo, e a Forever 21 abriu sua terceira loja no Brasil em Ribeirão Preto. Mas é importante lembrar que marca internacional não é só luxo. Tem muita marca popular vindo para o Brasil.

O que os shoppings estão fazendo para lidar com a vacância?

A questão da vacância não se resolve no curto prazo, e isso faz o shopping pensar em alternativas: como ocupar o espaço? Os shoppings começam a levar um pouco mais de gastronomia, que começa a ganhar uma importância maior dentro dos shoppings. Existe aí uma tendência do brasileiro começar a consumir mais em “casual dining”, um restaurante mais elaborado do que o fast food. Você começa a ver o ingresso de redes internacionais de casual dining no Brasil. São oito redes que foram anunciadas nos últimos 18 meses: Red Lobster, Olive Garden, P.F. Chang’s, Cheesecake Factory, entre outras.