Quando até Warren Buffett resolve ancorar um IPO — ainda mais um de tecnologia — o mercado sente que tem algo no ar.
Mas quando a Salesforce, de Marc Benioff, também resolve ser âncora, aí o mercado tem certeza.
Essa conjunção (improvável) de fatores aconteceu hoje no IPO da Snowflake, uma empresa de ‘data warehouse’ na nuvem que levantou US$ 3,4 bilhões no maior IPO deste ano nos Estados Unidos.
Para se ter uma ideia da demanda, a faixa de preço começou em US$ 75 -85, subiu para US$ 100-110, e o IPO saiu a US$ 120. Como se não bastasse, agora há pouco o papel abriu a US$ 245.
No pricing, a companhia começaria sua vida na NYSE valendo US$ 33 bilhões, quase 3x mais que o valuation que a Snowflake recebeu em sua última rodada privada em fevereiro.
No valor do pricing, a Snowflake já era a empresa mais cara da Bolsa americana, com um múltiplo de mais de 60x a receita estimada para 2021. (Mano, ela tá mais cara que o Zoom, a empresa-sensação da Grande Pandemia de 2020).
A Berkshire Hathaway, de Buffett, e a Salesforce compraram US$ 250 mi cada uma em ações da empresa. A Berkshire disse que também vai comprar outros US$ 320 mi do ex-CEO da Snowflake no mesmo preço do IPO, por meio de um private placement.
Fundada em 2012 por dois ex-engenheiros da Oracle, a Snowflake vende um software de armazenamento de dados (‘data warehouse’) que centraliza grandes bases de dados de seus clientes, permitindo que eles tirem insights relevantes das informações.
Mas o pulo do gato é o seguinte: o software da Snowflake — que já foi chamada da ‘próxima Oracle’ — usa os mesmos padrões da Oracle (o SQL, considerado o ‘padrão ouro’ do setor) mas funciona na nuvem e seu preço vai se adaptando à necessidade de trabalho de cada cliente em dado momento.
Outros players de ‘data warehouse’, como o Redshift, da AWS, e o BigQuery, do Google, também operam desta forma, mas com um porém: seus softwares rodam apenas nas plataformas de nuvem de suas empresas-mãe. A Snowflake é agnóstica e funciona em todas.
Numa era em que os dados se tornaram o motor de praticamente todas as indústrias, a Snowflake tem crescido num ritmo impressionante.
No ano passado, quase triplicou sua receita para US$ 264 milhões. Nos primeiros seis meses deste ano, a receita subiu mais 133%. Mas como uma boa startup, a Snowflake ainda perde dinheiro: teve um prejuízo de US$ 348 mi no ano passado e de US$ 171 mi no primeiro semestre deste ano.
Além do crescimento do ‘top line’ os investidores estão olhando a métrica de retenção líquida de receita, que hoje é a maior do setor de software (158%) mas já foi de 223% no primeiro semestre do ano passado.
A Snowflake está conquistando clientes cada vez maiores: o número de clientes gastando mais de US$ 1 milhão em seus produtos subiu de 14 para 41 nos últimos 12 meses.
Os principais acionistas da Snowflake são os fundos de venture capital Sutter Hill Ventures, Altimeter Partners, Iconiq Strategic, Redpoint Ventures e Sequoia Capital, que investiram mais de US$ 1,4 bi na empresa em diversas rodadas.
Depois da oferta, os fundos vão continuar com participações relevantes nas ações de classe B (que tem ‘super voting rights’): 17%, 15,1%, 14%, 9% e 8,6%, respectivamente.
Os coordenadores foram Goldman Sachs e Morgan Stanley.