Quando começou a operar em 2009, a Empiricus Research arejou o debate sobre a Bolsa brasileira, oferecendo relatórios de pesquisa independente num mercado em que os investidores se ressentem dos conflitos de interesse que marcam as opiniões dos bancos de investimento.
Com um time jovem, destemido e bem-humorado, a Empiricus passou a ser citada nas conversas do mercado, frequentemente com a frase: “Você viu o que aqueles caras escreveram?” (geralmente seguida de um sorriso cúmplice).
Sete anos e um crescimento explosivo depois, aquela pergunta mudou para: “Você acredita no que aqueles caras escrevem?” (geralmente seguida de sobrancelhas em pé).
Cada vez mais gente acha que a Empiricus está pegando pesado na forma de promover suas ideias e atrair novos clientes, e os elogios iniciais estão dando lugar a críticas.
No centro do debate: vale tudo para atrair o pequeno investidor? Qual o limite entre enfeitar os produtos para torná-los atraentes e a pura propaganda enganosa? Qual a diferença entre ensinar a investir – um processo que exige estudo e disciplina – e chamar para uma aposta?
Num país com pouca educação no geral (que dirá financeira) e no qual investimento é quase sinônimo de caderneta de poupança, despertar o interesse da pessoa física pelo mercado é, mais do que um mérito, quase um serviço público.
O problema é que a maioria dos anúncios da Empiricus foca apenas no potencial de ganho das estratégias, causando arrepios nos profissionais acostumados a fazer controle de risco.
Em um email de 11 de julho, por exemplo, a Empiricus trombeteia um ‘método inédito’ para que o assinante — o que segue agora é uma citação literal — “comece a lucrar +2, +5, +10, +20, +100 por cento e até mais TODOS OS DIAS, durante o ANO TODO”.
Em outro email, de setembro, cujo título é “Você não precisa de dinheiro para lucrar na Bolsa agora”, a casa vende uma estratégia com aluguel de ações dizendo que “a rigor, seu investimento seria zero e o retorno praticamente infinito”.
Em 2015, a CVM pediu à Apimec – responsável pela autorregulação dos analistas de investimento — para investigar dois emails de propaganda enviados pela Empiricus que falavam em ‘retornos garantidos’.
No primeiro, de 17 de novembro de 2014, o sócio Roberto Altenhofen fala de uma “estratégia para lucrar em 12 meses com baixíssimo risco e alto potencial de retorno. Garantido…”. Para comprar o relatório, o leitor teria que clicar no botão “clique aqui para aproveitar a oportunidade de retorno garantido”.
Outra comunicação, do começo de 2015, vende um programa de formação de investidores. Logo no segundo parágrafo, declara: “Apenas 300 pessoas terão acesso à fórmula comprovada… com a segurança da maior GARANTIA DE RETORNO já oferecida na história do mercado de capitais brasileiro”.
Questionada, a Empiricus argumentou que a ‘garantia de retorno’ dizia respeito ao valor das assinaturas do produto, e não ao dinheiro investido. Fechou um termo de compromisso com a Apimec: uma multa de R$ 7.200,00 (pagável em três parcelas) e se comprometeu a seguir o código de conduta da associação e “agir com imparcialidade e boa-fé”. O processo foi encerrado.
Na CVM, há um outro processo, aberto no começo de 2014. A autarquia não revela o teor, mas afirma que se trata de queixa sobre ‘a linguagem utilizada’. Neste processo, a CVM aguarda uma resposta da Empiricus a um ofício enviado em 2015.
O ‘bull market’ da Empiricus começou em 2013, quando a Agora, uma empresa americana, comprou metade do negócio por um valor não revelado. A Agora publica mais de 120 newsletters que vão das finanças pessoais ao melhor regime do momento, sempre com a mesma receita: análises em primeira pessoa, apelo emocional e ‘oportunidades únicas’.
Os sócios americanos ensinaram a Empiricus a vender — desde a forma de empacotar e precificar os relatórios até como manter o leitor engajado e convertê-lo em assinante pagante.
A primeira cria da sociedade foi a barulhenta campanha ‘O Fim do Brasil’, lançada em 2014, e que botou a casa de análise no mapa. ‘O Fim do Brasil’ é uma cópia do ‘The End of America’, produzido pela Stansberry Research, da Agora, no fim de 2010. (O vídeo previa que o Tesouro americano quebraria em poucos anos.)
Num vídeo de mais de uma hora, a Empiricus declarou que o Brasil acabaria se Dilma Rousseff fosse reeleita, e investiu pesado para promover a ideia em sites de notícia e nas redes sociais. Em tom apocalíptico, a empresa explicava que o dólar ia disparar, a recessão engoliria o País, e que este seria ‘o fim’.
Tudo saiu como 9 entre 10 economistas haviam previsto, mas só a Empiricus soube monetizar o óbvio. Em dois anos, seu faturamento multiplicou por 20: saiu de R$ 12 milhões para quase R$ 200 milhões este ano. Hoje, 150 mil usuários assinam algum tipo de conteúdo pago da Empiricus, cujos preços variam de R$ 15 a R$ 390 por mês, e 2 milhões de pessoas recebem sua newsletter diária gratuita.
Depois do ‘apocalipse’, vieram outras campanhas, sempre com tom messiânico e superlativo. Euforia ou catástrofe, nunca algo no meio.
O ‘Tsumoney’ previa uma enxurrada de investimentos e uma ‘nova onda de supervalorização da Bolsa’ com as reformas do Governo Temer. Outra campanha, lançada em maio, pregava que o Ibovespa chegaria a 100 mil pontos ‘em poucos meses’, e abusava do caps lock: “Se você não comprar ações AGORA, não comprará nunca mais na vida”.
Nos Estados Unidos, as estratégias adotadas pela Agora são ainda mais agressivas e já renderam uma condenação por fraude. No começo dos anos 2000, Porter Stansberry – o mesmo do ‘The End of America’ – disparou um email dizendo que tinha informações confidenciais sobre um acordo entre Estados Unidos e Rússia que resultaria em ganhos substanciais para “uma empresa americana”.
Para saber o nome da empresa, os interessados precisavam comprar um relatório por US$ 1.000. A ‘superdica’ nunca vingou, e quem investiu na tal de USEC – de enriquecimento de urânio – perdeu dinheiro.
A SEC abriu um processo e avaliou que se tratava de fraude. A decisão foi confirmada em 2007 pela Justiça americana, que rechaçou o argumento dos acusados de que a condenação feria a Primeira Emenda ao restringir a liberdade de expressão. Stansberry e sua firma foram multados em US$ 1,5 milhão.
A Empiricus não quis dar entrevista. A visão da própria companhia sobre o seu marketing, no entanto, está refletida numa newsletter de setembro, assinada pelo diretor Felipe Miranda: “Se eu não usar uma linguagem chamativa e de fácil compreensão, será que eu conseguirei atingir muita gente? Será que essa agressividade não é necessária para atrair um público que, diferentemente, jamais se interessaria pela coisa?”