Na corrida pela liderança da inteligência artificial, as Big Techs estão despejando centenas de bilhões de dólares na construção de data centers – e a necessidade colossal de financiamento já começou a iluminar a criatividade dos banqueiros de investimentos.

A maior operação até agora foi protagonizada pela Meta, que numa única tacada levantou US$ 27,3 bilhões – a maior emissão de dívida privada da história.

Os dólares serão aplicados em um projeto chamado Hyperion – um complexo gigantesco de processamento de dados que começou a ser construído na Louisiana.

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Mas o que vem chamando a atenção dos analistas é que a emissão não foi feita diretamente pela Meta, e sim por um special purpose vehicle – uma entidade independente que não impactará diretamente o balanço da Big Tech.

O emissor da dívida, coordenada pelo Morgan Stanley, foi a recém-criada Beignet Investor LLC, uma joint venture da Meta com a a gestora Blue Owl.

A Blue Owl ficou com 80% do negócio, e a Meta com os 20% restantes. A gestora administra US$ 145 bilhões, mas a maior parte do capital investido no Hyperion não virá de seus clientes, e sim de fundos administrados pela Pimco e outras firmas de Wall Street.

Segundo o Wall Street Journal, a BlackRock foi um dos principais compradores, adquirindo US$ 3 bi.

“O boom da inteligência artificial gerou um boom na engenharia financeira,” resumiu Matt Levine, um ex-Goldman Sachs, em sua coluna na Bloomberg.

As companhias precisarão alocar trilhões de dólares num investimento que, além dos clusters de processamento de dados, envolve ainda o treinamento e a execução dos modelos de linguagem e a construção de usinas de eletricidade.

De acordo com Levine, a empresa de Mark Zuckerberg recorreu a essa estrutura financeira para não ter o risco de ter seu rating rebaixado pelas agências de classificação de risco.

“As grandes empresas de tecnologia não querem emitir dívida para construir data centers em parte por razões reais de gestão de riscos, mas também, creio eu, um pouco por razões ‘estéticas’,” disse Levine.

A Microsoft, por exemplo, tem classificação AAA, melhor do que o Tesouro dos EUA.  A Alphabet, dona do Google, é AA+, e a Meta, AA-.

“O histórico de baixo capital e lucros enormes deixaram as Big Techs com pouquíssima dívida e um crédito muito sólido, e elas não querem comprometer isso tomando empréstimos de centenas de bilhões de dólares, o que reduziria seus ratings,” escreveu Levine.

A Standard & Poor’s disse num relatório que o rating da Meta está mantido em AA-, e explicou por que não vai consolidar a dívida no balanço da Meta.

“Embora consideremos o sucesso da joint venture crucial para a estratégia de longo prazo da Meta (o que normalmente seria um motivo para consolidação), neste caso os termos da JV conferem à Meta a flexibilidade necessária para sair da parceria,” disse a agência.

A S&P atribuiu um rating de A+ aos títulos, reconhecendo o envolvimento da Meta no projeto como uma das razões para a classificação. Ainda assim, o yield ficou em 6,58% na distribuição inicial, um retorno mais próximo de junk bonds, observou o Journal.

Muitos analistas torceram o nariz para a engenharia financeira – e alguns chegaram a ver semelhanças com a pirâmide da malfadada Eron, que colapsou em 2001.

O Hyperion deve entrar em operação só em junho de 2029. O campus demandará inicialmente 2 gigawatts de eletricidade, podendo chegar a 5 gigawatts quando estiver concluído – uma capacidade suficiente para abastecer 4 milhões de residências americanas.

As instalações vão se distribuir em um complexo de nove prédios, numa área total de quase 60 quilômetros quadrados – praticamente da mesma dimensão que a ilha de Manhattan.