Investidores e analistas estão culpando a má comunicação do Grupo SBF pela implosão do papel no pregão de hoje. 

A controladora da Centauro e da operação da Nike no Brasil perdeu um quarto de seu valor de mercado — em meio a um volume 7x maior que a média — depois de reportar um resultado decepcionante que foi agravado por uma má comunicação com o mercado.

Os números do tri vieram ruins, “mas não justificam um selloff dessa magnitude,” disse um gestor comprado no papel. 

O Grupo SBF parou de guiar o mercado depois que o resultado do quarto tri não bateu com o guidance, o que tem deixado o sellside e o buyside sem visibilidade sobre o que esperar. 

“Eles não falam mais nada com ninguém, e aí o pessoal vai se afastando por não ter segurança do que está acontecendo,” disse o gestor. “O CFO e o RI estão numa zona de conforto e fica quase um ‘o acionista que se f&x#’, porque quando chega um choque no resultado ninguém consegue explicar.”

Outro exemplo dessa má comunicação é o call de resultados, onde a companhia adotou a prática de não permitir que os analistas perguntassem diretamente. Eles apenas selecionam algumas perguntas que foram enviadas por escrito.

Um analista que cobre a empresa concorda que o mercado entrou nesse tri com as expectativas desancoradas, o que gerou “um efeito técnico punitivo numa ação de baixa liquidez.”

Ele diz, no entanto, que acha a decisão da empresa de não passar guidance de curto prazo “louvável”, já que “pararíamos com essa prática que tem no Brasil de ligar para as empresas para pegar insights dos números.”

“Mas o mundo não é binário. Acho que tem um meio do caminho, que é dividir coisas qualitativas do trimestre, sem precisar falar de números. E nem isso eles estão fazendo mais.”

O Grupo SBF já vem de uma dinâmica negativa há alguns trimestres.

Na metade do ano passado, a empresa errou a mão na compra de estoque, principalmente dos produtos da Nike, o que tem gerado um impacto relevante na rentabilidade. Além de ter que pagar os royalties dos produtos da Nike na hora da compra, a companhia agora está tendo que vender os produtos com desconto para conseguir limpar esse estoque. 

“De tanto estoque eles tiveram que alugar um galpão adicional, o que aumentou as despesas logísticas. Eles também estão gastando mais com marketing para conseguir vender rápido,” disse o gestor. 

Em maio, no resultado do primeiro tri, o Grupo SBF havia mostrado alguns sinais de melhora, o que fez alguns analistas chamarem aquele resultado de um ‘turning point’ para a companhia. 

Agora, ficou claro que essa virada ficou para mais adiante. 

O Grupo SBF entregou um EBITDA ajustado de R$ 160 milhões; o mercado esperava em torno de R$ 205 milhões. O bottom line veio negativo em R$ 32 milhões, enquanto os analistas projetavam um lucro de cerca de R$ 30 milhões.

A margem bruta também veio um ponto percentual abaixo do esperado pelo sellside, em 47,6%, e o Grupo SBF só conseguiu gerar caixa no trimestre por conta de benefícios fiscais. 

A alavancagem também teve uma alta importante, subindo para 3,4x o EBITDA, em comparação a 3x do primeiro tri deste ano e a 1,4x do segundo tri do ano passado.

“A companhia continua vocal sobre preservar rentabilidade, mas os problemas no capital de giro continuam pressionando o lucro,” escreveu Thiago Macruz, do Itaú BBA. “Apesar do cenário desafiador já esperado por nós, estávamos esperando ver tendências melhores na rentabilidade já neste trimestre.”

Na call de resultados, a maior parte das perguntas foi centrada nas dinâmicas do capital de giro da companhia. O Grupo SBF disse que espera uma normalização dos estoques, mas não deu uma data exata de quando isso vai acontecer, sinalizando apenas que isso virá “até o final do ano.” 

O managment também disse que o segundo semestre tem dois efeitos positivos que devem ajudar nisso. A sazonalidade melhor, que ajuda nas vendas, e o fato da companhia ter freado as novas compras de estoque com a ideia de usar o estoque em excesso para substituir essas compras. 

A empresa disse ainda que precisará rolar R$ 400 milhões em dívidas no ano que vem, mas que está “confiante” de que vai conseguir fazer isso com os bancos. O CFO José Salazar disse que não há necessidade de novas antecipações de recebíveis até o fim do ano, mas a empresa tem R$ 1,2 bi em recebíveis que podem ser adiantados caso necessário. 

No segundo tri, o Grupo SBF faturou R$ 16 bilhões, uma alta de 9% na comparação anual. As vendas da Centauro ficaram praticamente flat, com as lojas físicas subindo 7% e o digital caindo 11%. Já as vendas da Nike Brasil subiram 16%, para R$ 906 milhões, com as vendas D2C respondendo por 65% do total. 

Depois da queda de hoje, a companhia vale perto de R$ 2,4 bilhões na Bolsa, com o papel negociando a cerca de 9x o lucro estimado para o ano que vem.