Louis-Vincent Gave, o CEO da Gavekal, publicou hoje um relatório em que procura desconstruir a narrativa de “implosão da China” que tem dominado os canais de TV, podcasts e as páginas de finanças nos EUA e na Europa.
“O que é interessante é que os mercados não estão confirmando o pessimismo irrestrito da mídia de finanças,” diz Gave.
No relatório Making Sense Of The China Meltown Story, o analista – que foi segundo-tenente do Exército na França antes de trabalhar no mercado financeiro – cita uma frase atribuída ao general Ferdinand Foch quando defendia Paris na Primeira Guerra Mundial: “Meu centro está desistindo, minha direita está recuando, situação excelente, estou atacando.”
Gave explica que olha para as ações dos bancos como um leading indicator de problemas financeiros. Mas na China, apesar de uma performance ruim nos últimos anos, as ações dos bancos ainda acumulam alta na última década – e este ano, apesar de todo o barulho, não voltaram às mínimas registradas em outubro do ano passado.
“Nos últimos 12 meses, os US Treasuries longos entregaram um retorno negativo de 17%. No mesmo período, as ações dos bancos chineses tiveram um ganho de 6,7% na moeda local,” compara Gave.
É verdade que as Bolsas locais estão em queda, “mas o mercado acionário chinês não está derretendo como se pode imaginar a partir do tom apocalíptico das reportagens da mídia de finanças.”
As commodities, afetadas diariamente pelas trepidações na China, não sofreram grandes correções até o momento. “A China é o importador número 1 ou número 2 de todas as principais commodities,” diz Gave. “Se a China estivesse passando por um meltdown, deveríamos esperar preços mais fracos das commodities.”
O índice CRB – talvez o maior benchmark das commodities – está em alta este ano, negociando acima da sua média móvel dos últimos 200 dias, apesar de estar abaixo do pico registrado ano passado.
“Tudo isso parece apontar para o fim de um bull market em commodities, mas não para um derretimento da China,” afirma Gave.
Gave nota ainda que os dados recentes mostram que o consumo chinês tem se comportado bem.
“Isso ajuda a entender por que as ações de LVMH, Hermès, Ferrari e da maioria das outras marcas de luxo estão em alta,” escreve Gave. “Se a China estivesse enfrentando um crash, você não iria esperar que as ações dos produtores de mercadorias de luxo refletissem ao menos algum grau de preocupação?”
Em outro sinal positivo, diz ele, os preços dos títulos do governo chinês se estabilizaram e não mergulharam em novos recordes de baixas.
Gave reconhece que existe um problema “considerável” no mercado imobiliário, e que “empresas vão quebrar” – mas não vê contágio aparente em outros mercados.
Para Gave, a grande história do momento não é o colapso da China, mas “o derretimento das Treasuries” – “o maior mercado do mundo, a base de todo o sistema financeiro global, caindo quase dois dígitos em um mês.”
O “problema imediato” da economia global, diz o analista, não é o sistema financeiro chinês – e sim o mercado de títulos do Tesouro americano. “Se assim for, estamos ingressando em um novo mundo, em que os Treasuries não poderão mais ser considerados a base sobre a qual os portfólios são construídos.”
O analista conclui sugerindo que os investidores devem olhar para além das narrativas da imprensa: “Em quem você vai confiar? Na mídia de finanças ou nos seus próprios olhos?”