Acossada de um lado pela República da Boleia — que chantageou o País com o fornecimento de combustível — e escorada, de outro, por um Governo politicamente fraco, a Petrobras decidiu dar seu quinhão para resolver o proverbial ‘grave momento nacional’, contrariando sua narrativa de independência das decisões de Estado e abrindo um precedente perigoso.

Numa decisão surpreendente, o CEO Pedro Parente disse agora à noite que a companhia vai reduzir o preço do diesel em 10% por um período de 15 dias como uma forma de contribuir para solucionar a greve dos caminhoneiros.

A decisão parece uma tentativa de limitar a exposição da estatal a uma intervenção ainda mais dramática:  Parente afirmou que a estatal voltará à sua política de preço anterior “progressivamente” após este período, mesmo que o problema “não tenha sido resolvido.”

A decisão foi vendida como discricionária do management, ainda que as movimentações políticas que a precederam tenham sido ouvidas do Oiapoque ao Chuí. Na prática, significa que a estatal abrirá mão de R$ 350 milhões de faturamento, mas, neste caso, o princípio importa mais que qualquer número.

Desde sexta passada, o Planalto, a Câmara dos Deputados e o Ministério da Fazenda têm discutido soluções para a ‘crise do diesel’ que passam pela zeragem da CIDE e um corte no PIS/Cofins.  As tratativas são delicadas porque o Brasil já se encontra no limite do teto de gastos, e qualquer renúncia tributária só pode ser feita se compensada por novas fontes de receita.

No mercado, gestores questionaram por que o Governo não usou a via judicial para desobstruir a saída das refinarias.  “Os caminhoneiros estão fazendo terrorismo econômico. Agora é assim?  Eles param o País e fica por isso mesmo?” A resposta parece clara:  em ano eleitoral, ninguém quer ser duro demais. (Bolsonaro poderia, pois seu eleitor gosta disso, mas ele também tem alma sindicalista.)

No final das contas, não é preciso um gênio da ciência política para concluir que a saída mais rápida — o band-aid à mão — estava em pedir à Petrobras que se sacrificasse pelo time.  Aqui, importa pouco se houve um pedido formal do Planalto ou se a Petrobras, consciente das variáveis políticas envolvidas, tomou a iniciativa.

O que importa é que o episódio é absolutamente coerente com a tradição brasileira de enxergar o papel das estatais na sociedade:  empresas que, quando lucrativas, sempre podem “ajudar” os objetivos de política pública e, quando deficitárias, “ora, só precisamos botar uma boa gestão lá” para ficar tudo certo.

O problema aqui não é a governança da Petrobras, nem a greve, nem o enredo político.  O que torna essa combinação explosiva é o fato da Petrobras ser, desde sua fundação, uma empresa monopolista e estatal. 

Nenhuma governança, por melhor que sejam as pessoas, jamais dará conta disso.

Mas ninguém poderia articular isso de forma mais cristalina que o próprio sindicalista negociando pelos caminhoneiros, que hoje declarou à agência Estado:

“Sobre a política de preços da Petrobras, disseram que tem um gestor lá… A Petrobras parece que não é do Brasil. Tem uma pessoa que é o gestor e (a resposta) depende dessa pessoa, e é isso que vão conversar agora.”

Não se vencem guerras desenhando estratégia sob pressão e, no episódio de hoje, o exército oficialista bateu em retirada com o avanço do adversário.  Essa capitulação deve sair muito mais cara que R$ 350 milhões.