Os gêmeos Gabriel e Rafael Bottós haviam fundado três empresas – uma fabricante de máquinas a laser, uma companhia de otimização de vendas e um laboratório de testes farmacogenéticos, todas bem encaminhadas – quando viveram um drama que deu outro sentido ao empreendedorismo familiar.
Em 2019, uma sobrinha, então com 4 anos, foi diagnosticada com neuroblastoma, um tipo de câncer mais comum em crianças. Dado o estágio avançado da doença, a chance de sobrevivência era inferior a 5%, e o tratamento envolvia a compra de um medicamento cuja importação era proibida.
“Nada do que já havíamos feito conseguia nos ajudar naquele momento,” Gabriel disse ao Brazil Journal.
A sobrinha acabou conseguindo se tratar no exterior e, depois de dois anos, voltou ao Brasil curada. E os irmãos, que haviam criado um fundo de venture capital, decidiram investir em tratamentos para doenças raras ou sem cura conhecida.
Foi quando encontraram a primeira dificuldade: a desconexão entre o meio acadêmico e o mercado.
“O Brasil tem excelentes profissionais e pesquisadores, teses interessantes, biodiversidade, mas não há muitas empresas inovadoras nascendo. Existe um abismo entre universidade e indústria,” disse Gabriel.
Os Bottós resolveram então buscar a pesquisa científica na fonte, e participar do processo de criação das startups junto com pesquisadores que viam como promissores. Era o início da Vesper Ventures, que passou dois anos avaliando 1.600 projetos (e algumas empresas em estágio inicial) para selecionar sete, dentro do que os irmãos chamam de ‘deep biotech’.
Ao longo do processo, o escopo foi ampliado e passou a incluir, além de empresas que estavam buscando tratamentos para doenças raras ou sem cura conhecida, startups que pesquisam novas formas de diagnóstico de câncer; vacinas; biofertilizantes e alimentos mais resistentes a pragas.
Entre o fim de 2021 e o início deste ano, essas startups receberam US$ 25 milhões do primeiro fundo da Vesper.
“O Brasil tem uma massa crítica de cientistas bastante qualificados que são a base para para desenvolvermos portfólios de alto potencial de retorno”, diz Jonas Sister, outro sócio da gestora. Sister veio do mercado de M&A e private equity: foi da Votorantim e atuou por dez anos na BRZ antes de entrar na Vesper.
Na cabeça dos sócios, as investidas têm potencial para valer ao menos US$ 1 bi cada uma.
Uma delas é a Aptah Biosciences, que está desenvolvendo uma molécula para resolver desordens genéticas, o que pode auxiliar no tratamento de cânceres resistentes e doenças neurodegenerativas como o Alzheimer. A pesquisa está em fase de testes em animais e já tem pedido de patente internacional.
Outra empresa, a Vyro – que tem a geneticista Mayana Zatz entre os fundadores –, está criando uma tecnologia baseada no zika vírus geneticamente modificado para tratar cânceres no sistema nervoso central.
Já a Inedita Bio vem pesquisando uma tecnologia que permite a edição genética de plantas para conferir a elas a capacidade de resistir a fungos e outras pragas. O objetivo é reduzir a necessidade de uso de agroquímicos.
Para ajudar na seleção dos projetos, a Vesper conta com um conselho científico formado por Theo Van der Loo, o ex-CEO da Bayer Brasil e Bayer Healthcare na Espanha; Gerhard Bohne, ex-CEO da Bayer Crop Sciences Brasil, a divisão de pesquisa agrícola da empresa, e Paulo Arruda, pesquisador da Unicamp e cofundador da Alellyx Applied Genomics, empresa brasileira de biotecnologia, entre outros nomes.
A captação de recursos é feita junto a grandes investidores que têm como propósito investir no setor de saúde e pesquisas científicas, já que as métricas são diferentes das de um venture capital tradicional.
O plano dos sócios é iniciar a captação de um novo fundo de até US$ 100 milhões no segundo semestre para participar de rodadas de follow-on nas empresas do portfólio atual e também começar a buscar startups e projetos em outros países da América Latina.