Os bancos estão se preparando para um evento que acontece a cada cinco anos e tem um impacto significativo na carteira de consignado com lastro no INSS — um dos empréstimos mais previsíveis e seguros do setor financeiro. 

Terminou na sexta-feira a consulta pública para o leilão que vai definir quais bancos vão servir os aposentados que entrarão no sistema do INSS entre 2025 e 2030. A data do leilão ainda não foi definida, mas deve ficar para o terceiro ou quarto trimestre.

O Governo estima que entre 5 milhões e 6 milhões de novos beneficiários entrarão no sistema naquele período, somando-se aos 40 milhões de hoje.

O leilão divide o Brasil em 26 regiões, e o Governo determinou um preço mínimo mensal por beneficiário para cada uma delas.

Os bancos vão ‘bidar’ por lote. Quem ganhar, passará a ter o direito de servir todos os clientes daquela região, fazendo o pagamento mensal do benefício e podendo fazer o cross-sell de seus produtos (como o consignado do INSS, o cartão de crédito e o empréstimo pessoal).

O cliente pode fazer a portabilidade para outro banco só 12 meses depois do leilão — e só são elegíveis para essa portabilidade os bancos que ‘bidaram’.

“Para os bancos há um incentivo natural a ‘bidar’,  porque ou ele vai ganhar o lote ou na pior das hipóteses ficará elegível para a portabilidade,” disse Pedro Leduc, o analista que cobre bancos no Itaú BBA. 

No último leilão, em 2019, 26 instituições participaram e seis bancos ganharam os principais lotes: Santander, Crefisa, Agibank, Itaú, BMG e Mercantil. De lá para cá, o INSS já arrecadou R$ 24 bilhões com os pagamentos mensais desses bancos. 

O ágio médio daquele leilão foi de 613% do valor mínimo médio estipulado pelo Governo. 

No leilão deste ano, a expectativa é que a competição continue forte, mas que os bancos sejam mais racionais do ponto de vista de preço.

“Antes não havia nenhum teto para o consignado INSS. Agora, com o teto de 1,66% ao mês, os bancos terão que ser mais conservadores,” disse Leduc.

O principal lote do leilão será o 7, que engloba a cidade de São Paulo e cujo preço mínimo estipulado pelo INSS foi de R$ 22,10 por beneficiário por mês. (No último leilão, a cidade de São Paulo saiu por R$ 65/cliente/mês). O segundo lote mais caro é o 5, que abrange algumas cidades do interior de São Paulo e terá preço mínimo de R$ 17,4. 

Num relatório a clientes, Leduc disse que o leilão pode ser um funil eficiente de aquisição de clientes para os bancos. 

“A divisão regional permite um foco em geografias com um maior footprint ou/e com um perfil de clientes específico. O fluxo de renda traz um alto potencial para a principalidade, atraindo depósitos, produtos de seguros e crédito, como o consignado,” escreveu o analista. 

Ele disse que o leilão impactará significativamente as carteiras de consignado com lastro no INSS, dado que esse produto é um pilar chave para os negócios dos bancos, “tornando esse tópico de alto interesse para os incumbentes e os bancos especializados.”

“Na nossa cobertura, o consignado INSS representa 12% dos empréstimos de varejo do Bradesco e 7% de seus empréstimos totais, e 7% dos empréstimos de varejo do Santander Brasil e 4% de seus empréstimos totais. 

O Banco do Brasil é mais relevante no consignado de funcionários públicos e menos no INSS, mas o management tem expressado interesse em ganhar share no INSS,” diz o relatório.

Já o Banco Pan tem uma carteira estimada em R$ 9 bilhões de consignado do INSS (20% do total), mas Leduc nota que ela vem da portabilidade do crédito e de empréstimos originados pelos correspondentes bancários — um método diferente de aquisição de clientes, com outra estrutura de custos. 

Já a maioria dos bancos digitais não pode participar do leilão do INSS – ou por serem instituições financeiras não-bancárias (como é o caso do Nubank) ou por não terem estruturas físicas para atender os beneficiários (uma exigência do edital). 

“O Inter tem cerca de 1% de market share no mercado de consignado, com mais sucesso em funcionários públicos ativos do que no INSS. Já o Nubank entrou recentemente no mercado de consignado mas fez um progresso modesto, apesar de oferecer preços menores.”

Leduc disse que os bancos digitais provavelmente defenderam sua participação no leilão durante a consulta pública, mas não está claro se o Governo vai aceitar seus argumentos. 

Para os bancos digitais, a não participação no leilão traz um prejuízo enorme. Os bancos até podem conquistar o consignado do INSS por meio da portabilidade e dos correspondentes bancários, mas como não podem pagar os benefícios, o valor do empréstimo dado por eles tem que entrar na conta do banco que atende a região. 

“Na prática, o banco digital que consegue a portabilidade do empréstimo está gerando depósito para um concorrente,” disse Leduc.