Uma das perguntas que mais escuto é: com o avanço de trilhos como Pix e Open Finance, o que acontecerá com as bandeiras de cartões de pagamento?

Minha resposta sempre foi clara: essas empresas vão se reinventar.

São organizações com décadas de experiência, capital intelectual, capacidade técnica e poder de execução para inovar. Um anúncio feito ontem pela Visa confirma isso.

A empresa acaba de lançar no Reino Unido o Visa A2A, sua solução de pagamento direto entre contas bancárias, com um diferencial decisivo: proteções integradas ao consumidor, equivalentes às dos cartões.

É um novo modelo, construído sobre a infraestrutura do Faster Payments e conectado aos principais bancos e fintechs britânicos — como Plaid, Tink, Nationwide e Checkout.com.

O Visa A2A oferece ao consumidor uma experiência simplificada, diretamente no app do seu banco — autorizando pagamentos recorrentes ou pontuais — com liquidação quase instantânea. Pela primeira vez no Reino Unido, essas transações contam com proteção semelhante à dos cartões, incluindo regras de disputa e reembolso em caso de erro; e diretrizes claras para consumidores, empresas e instituições financeiras.

Para empresas, isso significa melhor conciliação, gestão de fluxo de caixa e controle sobre mandatos. O que antes era visto como uma simples transferência bancária passa a ser entregue com a confiança de uma rede global.

O modelo parece trazer riscos aos adquirentes.

Diferente da arquitetura tradicional de cartões — baseada em múltiplos intermediários como banco emissor, adquirente, subadquirente, gateway e processadora — o Visa A2A reduz a cadeia de intermediação. 

Os pagamentos ocorrem diretamente de conta para conta, com a Visa atuando como orquestradora dos pagamentos de ponta a ponta.

Uma das principais diferenças está na ausência da interchange fee — a taxa que no modelo tradicional é paga pelo adquirente ao banco emissor para cada transação com cartão. Isso significa que os bancos emissores deixam de receber essa receita em pagamentos realizados via A2A.

Mas e os bancos que detêm a conta do consumidor?

A resposta ainda depende da estrutura de remuneração que a Visa e seus parceiros irão adotar.

Como o Visa A2A é descrito como um modelo aberto, os bancos participantes — incluindo os que oferecem as contas de origem dos pagamentos — poderão ser remunerados por sua participação, seja com taxas técnicas de acesso à infraestrutura, serviços de autenticação e segurança, ou monetização indireta via parcerias, como a integração com a Plaid.

As comunicações oficiais apontam para um modelo de baixo custo para o lojista e sustentável para todos os participantes, sugerindo redistribuição de valor entre os diversos agentes da cadeia.

O Visa A2A é fruto de uma jornada estratégica iniciada com a aquisição da Tink em 2021 por € 1,8 bilhão. 

Em 2024, a empresa lançou o Visa Protect for A2A, com tecnologia de IA que detecta até 54% mais fraudes do que os sistemas tradicionais bancários. Pilotos com empresas de energia e telecom já mostraram ganhos reais de eficiência, menor inadimplência e mais controle para consumidores. 

Esse lançamento confirma que as bandeiras não ficaram paradas. Como escrevi em artigos anteriores, o crescimento dos cartões desacelera diante de soluções como o Pix, mas isso não significa o fim das redes globais. 

O que vemos é um novo ciclo: IA, open banking, APIs e pagamentos embutidos na jornada do consumidor. As bandeiras não estão apenas lançando produtos; estão se reposicionando na cadeia de valor, levando confiança e liquidação instantânea para os trilhos do open banking e transformando o “pay by bank” em uma solução segura, fluida e competitiva.

Quem ainda enxerga as bandeiras apenas como redes de cartões estará olhando para o retrovisor. Estamos diante do nascimento de uma nova infraestrutura global, onde pagamentos bancários diretos terão marca, confiança e padrão de qualidade.

Edson Santos é fundador e sócio da Colink Business Consulting, conselheiro e advisor.  É autor de “Do Escambo à Inclusão Financeira – A evolução dos meios de pagamento” e coautor de “Payments 4.0 – As forças que estão transformando o mercado brasileiro.”