O copy trading – a prática em que o investidor seleciona um trader líder, com suposto conhecimento e experiência de mercado e passa a replicar suas operações – está crescendo rapidamente no Brasil.
Há variações no grau de automatização dessa prática: existem modelos em que o investidor deve replicar manualmente as operações realizadas pelo trader líder junto à corretora, mas não são incomuns os modelos totalmente automatizados, em que o investidor autoriza a execução automática das operações realizadas pelo trader líder em sua conta, sem a necessidade de intervenções adicionais.
Como contrapartida pela divulgação das informações de suas operações, que permitem a réplica de suas estratégias de investimento, o trader líder pode fazer jus a benefícios conferidos diretamente pelos investidores, por meio da cobrança de uma taxa, similar a uma mensalidade, ou até pelo intermediário, com base no fluxo de ordens originado ou no lucro gerado aos investidores que o seguem.
Operações envolvendo copy trading vêm chamando a atenção de reguladores mundo afora. Na União Europeia, a European Securities and Markets Authority (ESMA) editou orientação detalhando o que espera das instituições ofertando tais serviços a investidores europeus.
Reguladores de outros países também vêm buscando compreender a prática e mitigar os riscos inerentes, inclusive por meio da edição de medidas educacionais e de supervisão. Nesse contexto, a International Organization of Securities Commissions (IOSCO) editou em maio um relatório apontando potenciais benefícios e riscos relacionados ao copy trading.
Entre os benefícios aparecem a democratização do acesso a operações e produtos mais sofisticados, e os ganhos de educação financeira. Também foram apontadas a redução de custos frente à contratação de gestores de carteiras e de analistas de investimento e o potencial de retornos mais favoráveis aos investidores.
Em relação aos riscos, destacam-se o fornecimento de informações insuficientes ou enganosas ao investidor, a inadequada seleção de trader líder e os conflitos de interesse na sua atuação.
Soma-se a isso o risco de inadequação das estratégias do trader líder ao perfil de risco dos investidores (suitability), especialmente quando há alavancagem e uso de ativos de alto risco. Além dos riscos destacados no relatório da IOSCO, estudos empíricos sugerem que práticas de copy trading não necessariamente trazem melhores resultados do que a negociação individual.
O Brasil não está alheio a esse debate.
Em julho, a CVM abordou o tema no Ofício Circular CVM/SIN nº 3/2025. Ele esclarece que a atuação do trader líder pode configurar análise de investimento, uma vez que haveria uma recomendação implícita de investimento. Nesse cenário, o trader líder deveria credenciar-se como analista de investimentos, nos termos da Resolução CVM nº 20/2021.
O Ofício também reforça a importância da transparência sobre os riscos envolvidos nessa prática, e orienta que as operações realizadas por analistas no âmbito de copy trading sejam executadas em ambiente simulado, diante das vedações à negociação constantes do art. 13 da referida Resolução.
Apesar dos avanços, ainda há pontos cruciais a definir para que o copy trading se desenvolva de forma adequada no País. Parece necessária uma visão mais flexível sobre sua qualificação, já que, por exemplo, a depender do grau de automação e do papel do intermediário, a prática pode aproximar-se mais da gestão de carteiras, com regime regulatório distinto, do que de uma análise de investimento.
Em paralelo, parece necessário estabelecer maior clareza sobre os deveres dos intermediários nessas operações, o que poderia ocorrer mediante regras objetivas sobre a seleção, contratação e remuneração do trader líder, o tratamento equitativo entre os investidores que o copiam, a verificação do suitability, a renovação periódica do mandato, e a adoção de mecanismos de mitigação de conflitos de interesse.
Também merece avaliação a imposição de requisitos e deveres específicos ao trader líder. Sua classificação deve basear-se em critérios técnicos, com a exigência de conhecimento e experiência comprovados. O trader líder deve atuar de boa-fé, gerir adequadamente os potenciais conflitos de interesse e evitar práticas não equitativas, como o front running – situação em que o investidor, ciente de uma operação iminente e de seus possíveis efeitos no preço de determinado ativo, antecipa-se a ela com o objetivo de obter vantagem financeira indevida.
Destacam-se, ainda, duas potenciais medidas complementares: transparência quanto ao número de seguidores do trader líder e reforço das ações de enforcement por parte do regulador e do autorregulador.
Tornar público o número de investidores que copiam o trader líder permite uma melhor percepção dos riscos de impacto nos preços decorrentes das operações replicadas, favorecendo uma decisão de investimento mais informada. Além disso, a CVM e o autorregulador devem atuar de forma coordenada na prevenção, detecção e punição de ilícitos, como práticas não equitativas e manipulações de mercado. A indicação nas ordens de que se trata de uma operação copiada seria um passo relevante para aprimorar tais mecanismos de supervisão.
Por fim, a combinação entre gamificação e copy trading merece atenção. Práticas de engajamento digital — rankings, notificações com contagem regressiva, metas e recompensas — tendem a elevar a frequência de negociação e o apetite por risco, sobretudo no varejo.
À luz da economia comportamental, uma arquitetura de escolhas responsável e centrada nos interesses dos investidores pode ser uma estratégia regulatória promissora para assegurar a proteção dos investidores e garantir a integridade do mercado.
Neste sentido, os intermediários deveriam ser incentivados a desenhar ambientes de decisão mais responsáveis — incluindo telas de aplicativos, fluxos de contratação, relatórios de performance e até mesmo mensagens de marketing — que favoreçam escolhas conscientes por parte dos investidores.
Entre as medidas possíveis, destacam-se: introduzir pausas de reflexão e alertas adicionais em operações de alto impacto; aplicar testes breves de compreensão antes da adesão ou da alteração de estratégias; exigir renovação do consentimento sempre que o trader líder modificar substancialmente sua estratégia; reduzir a pressão gerada por notificações constantes; e adotar mecanismos de gestão de risco, como travas temporárias após sequências de perdas relevantes. Tais ferramentas, inspiradas na economia comportamental, poderiam mitigar riscos relacionados ao copy trading, contribuindo para o desenvolvimento sustentável desse mercado.
O copy trading deve seguir ganhando tração no Brasil, acompanhando a gamificação do investimento e a busca por experiências coletivas na hora de investir. O Ofício Circular nº 3/2025 foi um passo relevante, mas a consolidação saudável dessa prática demandará maior clareza sobre os deveres, responsabilidades e salvaguardas inerentes aos agentes envolvidos. Precisamos, portanto, aprofundar o debate para assegurar um ambiente de equilíbrio entre inovação e proteção do investidor.
Pedro Castelar é advogado e foi Chefe de Gabinete da Presidência da CVM entre julho de 2022 e julho de 2025.











