WASHINGTON, DC – Os brasileiros, em geral, não têm o hábito de vir para esta capital. Preferem os parques temáticos de Orlando, as praias e shoppings de Miami ou a diversidade cultural e de entretenimento de Nova Iorque.
Eu, porém, sou um entusiasta de Washington. A cidade tem ruas largas, é organizada, arborizada e respira história. O estilo neoclássico está presente em todo lugar, da Casa Branca ao Capitólio, e em um infindável número de prédios públicos, museus e memoriais.
Um dos meus lugares preferidos aqui é Georgetown, a região charmosa e tipicamente residencial às margens do Potomac, na área noroeste da cidade. O bairro abriga centenas de casas em estilo georgiano, construídas no século XVIII, além da famosa Georgetown University.
Georgetown também possui duas ruas comerciais vibrantes, repletas de lojas de grife, cafés e restaurantes. Em finais de semana ensolarados, mal se consegue caminhar pelas calçadas, tomadas por universitários e turistas.
Mas Georgetown não estava completa. Faltava-lhe uma livraria.
Sim, como pode haver um lugar tão charmoso, com bares e cafés, sem uma livraria? Havia uma loja da Amazon no bairro, mas ela fechou há alguns anos. Sim, a própria Amazon — depois de quase eliminar as livrarias tradicionais — tentou abrir lojas físicas nos EUA. O projeto não deu certo, e Georgetown ficou órfã de livrarias.
Qual não foi minha surpresa, portanto, ao chegar aqui e ver um prédio de 200 anos, totalmente reformado, transformado numa Barnes & Noble, a tradicional rede de livrarias americana.
A B&N também sofreu muito com a escalada das vendas online e quase quebrou, mas foi vendida ao Elliott Investment Management, e conseguiu dar a volta por cima. Escolheram Georgetown para sediar uma de suas flagship stores.
A virada da B&N veio graças ao experiente James Daunt, que assumiu como CEO em 2019, logo após o fundo comprar o controle da empresa e fechar o seu capital. Daunt conhece o setor como poucos. Nos anos 90, abandonou sua carreira no mercado financeiro para abrir sua própria livraria em Londres. A Daunt Books se tornou um sucesso regional e continua sob sua tutela até hoje. Em 2011, Daunt protagonizou o resgate da rede de livrarias Waterbooks na Inglaterra e, agora, começa a deixar a sua marca na B&N, a maior rede do planeta, com 652 lojas.
Somente no ano passadp, foram 57 lojas novas – mais do que nos dez anos anteriores somados, e a previsão é de abrir mais 60 este ano.
O novo conceito das lojas aposta em um ambiente acolhedor e bem iluminado, com grandes janelas, piso e prateleiras de madeira natural, e uma disposição de livros organizada e convidativa. Além disso, ao contrário do “one size fits all” que sempre caracterizou a rede, a curadoria de cada loja agora é feita por livreiros locais, o que confere bem mais assertividade na escolha do acervo.
A nova B&N acredita que comprar um livro pode ser muito mais do que apertar uma tecla. Comprar um livro é a experiência de circular em um ambiente acolhedor, apreciar a diversidade de títulos, tocar, folhear…
Ver o renascimento das livrarias me enche de esperança. Parece ser um sinal de que a vida não vai ficar restrita a bits e algoritmos. Pelo menos por enquanto.
Fernando Goldsztein é fundador da The Medulloblastoma Initiative e conselheiro da Children’s National Foundation.