“Quo usque tandem abutere, Catilina, patientia nostra? Quam diu etiam furor iste tuus nos eludet? Quem ad finem sese effrenata iactabit audacia?”
– Marco Túlio Cícero, 8 de novembro de 63 a.C., no Senado Romano.
Mesmo correndo o risco de soar pouco criativo, pareceu oportuno invocar as Catilinárias de Cícero, proferidas em célebre discurso há mais de dois mil anos. “Até quando, Catilina, abusarás de nossa paciência? Por quanto tempo a tua loucura zombará de nós? A que extremos há de precipitar-se tua desenfreada audácia?”
Nada parece refletir melhor o sentimento dos mercados após Jair Bolsonaro lançar na sexta-feira a candidatura de seu filho Flávio à Presidência, derrubando a Bolsa e provocando disparada dos juros e do dólar.
Do alto de sua prisão preventiva, já condenado por uma tentativa de golpe, o ex-presidente resolveu, mais uma vez, surpreender. Incapaz de um único ato de generosidade e desprendimento para com o País, lançou seu filho mais velho, preterindo o Governador Tarcísio de Freitas, seu afilhado político e favorito do centro, da direita e dos mercados.
Se o gesto representa um balão de ensaio ou uma desesperada tentativa de ampliar seu poder de barganha diante da iminência do cumprimento de sua pena de 27 anos, saberemos em breve.
Político inexpressivo durante décadas, Bolsonaro tornou-se, talvez por acaso, o maior fenômeno eleitoral recente do País. Eleito na onda do antipetismo, dedicou boa parte de seu tempo no governo a sabotar a si mesmo e aos próprios ministros, com agressões constantes a minorias, negacionismos e teorias da conspiração das mais diversas — começando pelo questionamento da lisura de uma eleição vencida por ele mesmo.
Seus acertos decorreram muito mais de oportunas omissões – ao entregar a pessoas competentes áreas como economia, infraestrutura e agricultura – do que de méritos próprios.
Desde que perdeu a reeleição de 2022 para um candidato que ele mesmo ajudou a tirar da cadeia, Bolsonaro e sua família passaram a sabotar o País de forma sistemática.
Se o 8 de janeiro foi uma tentativa real de golpe ou se a Punhal Verde e Amarelo não passou de uma operação tabajara, talvez nunca tenhamos certeza. Mas, indiscutivelmente, o episódio enfraqueceu aliados que defendem a direita de forma democrática.
O desprezo da família Bolsonaro pelas instituições e pela moral sempre foi evidente. Seja pela famosa frase de que, para fechar o Supremo, “basta um soldado e um cabo”, seja pela apologia à tortura feita pelo então deputado durante o voto pelo impeachment de Dilma Rousseff, a família sempre deixou clara sua visão a respeito da democracia.
Mais recentemente, esse desprezo tornou-se traição à Pátria, com Eduardo Bolsonaro fugindo do País para, de fora, atacar nossas instituições e instigar autoridades estrangeiras a retaliarem nossa economia e sancionarem nossas instituições, como se fôssemos uma república de bananas.
Não satisfeitos, os Bolsonaros agora tentam sabotar a própria direita nas eleições de 2026, tentando impor algum membro dessa família de aloprados na chapa de oposição que disputará a Presidência. É preciso coragem para afirmar o óbvio: isso só servirá para garantir mais cinco anos de governo Lula.
Bolsonaro não conseguiu vencer uma eleição sentado na cadeira de Presidente — algo inédito desde a redemocratização. Desde então, ele e sua família se afundaram em um rosário de escândalos e crimes de diversas naturezas. Imaginar que pessoas com esse legado possam se viabilizar numa candidatura presidencial é uma absoluta insanidade. Se o Governador Tarcísio já foi capaz de dizer que “já passou da hora de Lula parar há muito tempo”, servirá bem a ele repetir uma outra frase sua ao seu próprio padrinho político: “Se quiser fazer um favor ao Brasil, sai de cena.”
A direita brasileira precisa de um líder capaz de enfrentar nossos graves problemas: a crise fiscal, o crime organizado, a corrosão moral de nossas instituições. Esse líder precisará ter personalidade e força para se impor — alguém acima daqueles que buscam lamber as sobras do bolsonarismo. Que Deus ajude o Brasil.
Ricardo Lacerda é empresário.











