Tentar prever o futuro nos mercados é para os ingênuos (apesar de todos tentarmos).

É mais útil analisar em que ponto do ciclo econômico e de valuation estamos.

Olhando para a inflação hoje, não dá para saber quando ela volta à média, mas sabemos que ela está no topo de um range histórico de vários anos. Isso também se reflete na taxa de juros, perto do pico de uma década.

Do ponto de vista do investidor, o mais importante é saber que há maio​r chance da inflação e juros caírem do que subirem. É impossível saber o timing, mas as probabilidades são favoráveis. Parece simples e, pensando em uma perspectiva de longo prazo, realmente é.

As projeções em relação à economia também têm se mostrado um exercício de futurologia. Teremos desafios em 2023, mas é fútil tentar adivinhar neste momento como será o ano que vem. O Brasil tem as contas externas arrumadas, teremos muitos investimentos em infraestrutura e, pelo menos no início do mandato, qualquer presidente deveria ser fiscalmente responsável.

Já para as empresas, o vento é contra. A renda das famílias anda apertada dado o maior peso dos transportes e alimentos no orçamento. Os balanços enfrentam pressões de custo e despesas financeiras mais elevadas em, em geral, os lucros têm piorado.

Porém, para um grupo especial de companhias, esta crise será positiva.

Estas empresas têm balanços robustos e o poder de repassar preços (seja por uma marca especial, um poder de mercado dominante, barreiras à saída de clientes, ou uma gestão muito competente).

Nas crises, a maioria dos setores acaba se concentrando, já que muitos competidores são adquiridos pelos líderes ou saem muito fragilizados. As empresas não estão paradas na crise; são tocadas por times competentes que se adaptam.

Ninguém gosta de uma crise, mas as empresas líderes sairão mais robustas. No Brasil, os fortes ficam mais fortes. Estimamos para as empresas do nosso portfólio um crescimento de 25% de lucros este ano.

Se há maior chance de os juros caírem e de os lucros de um seleto grupo de empresas serem ainda melhores no médio prazo, a última peça que falta no quebra-cabeças é o valuation das ações – e aqui também estamos no low de um range histórico.

Taxas de juros no pico geralmente significam múltiplos de valuation no low. Numa reunião recente com investidores, alguém comentou que com estes juros atraentes “não faz sentido ter bolsa.” O dia seguinte foi de alta nos mercados e muitas ações de beta alto subiram de 10% a 12% – um ano de CDI em um dia. O que parece improvável às vezes acontece.

Meu primeiro chefe, André Jakurski, me ensinou que “markets climb a wall of worries.” Se há um ano os riscos pareciam baixos, e ficou claro que não eram, hoje eles assustam, mas nestes preços e com menos investidores comprados, o risco hoje é o menor em anos.

Alguns exemplos históricos de oportunidades em crises: a Totvs caiu 55% durante a correção da covid e quase triplicou nos meses seguintes. A Localiza caiu 40% em 5 meses em 2018 – sem nenhuma razão específica – e triplicou depois.  Lojas Renner caiu quase 50% durante a recessão de 2015, antes de subir 1.000% em 5 anos. O BTG Pactual perdeu quase 70% na correção do 2º trimestre 2020… e quintuplicou nos três anos seguintes.

Após 35 anos vivendo várias crises, tenho convicção de que, neste momento, um investidor não deve:

• Vender depois de perdas significativas. Aumente a taxa interna de retorno do seu investimento aumentando sua exposição à Bolsa, ​fazendo um rebalanceamento sensato.
• Não reduzir muito o beta do portfólio. Cair com ações de “growth” e beta alto e mudar radicalmente para ações defensivas na baixa é receita para o fracasso.
• Avalie os erros, mas não questione sua filosofia de investimento ou sua competência.
• Não perca a calma com o seu time, mantenha o espírito de união e mentalidade positiva. Crises não duram para sempre, e a resiliência é uma virtude na gestão de investimentos.

• Também não perca a calma com as empresas, mas reforce​ a visão de longo prazo e, se possível, incentive as companhias capitalizadas a ir para a ofensiva, fortalecendo sua posição de mercado.

O investidor deve tomar riscos – riscos sensatos – e não se acovardar. No valuation atual, o risco da Bolsa é baixo.

Florian Bartunek é fundador da Constellation Asset Management.