A falta de acordo do cartel da OPEC+ na primeira semana de março ajudou a acentuar a crise, apertando ainda mais as condições financeiras globais e amplificando a potência do canal da confiança sobre a economia, além de aumentar os efeitos desinflacionários do abalo.
A violência do choque não deixa dúvidas de que a economia global experimentará uma breve recessão no primeiro semestre de 2020.
O impacto sobre a economia brasileira será muito significativo, mesmo que a extensão das medidas restritivas a ser adotadas pelas autoridades locais venha a ser menor do que as observadas no hemisfério norte. Nossa estimativa de crescimento para o ano passou a ser de 1%, e os riscos a esta projeção nos parecem assimétricos para baixo.
O governo, corretamente, já anunciou as primeiras medidas de suporte, incluindo mais recursos do orçamento para a saúde e a antecipação do 13º para aposentados. A situação fiscal do Brasil, no entanto, deixa pouco espaço para a adoção de impulsos fiscais significativos, ainda que a meta fiscal do ano possa ser flexibilizada diante da magnitude do choque.
Neste contexto, é fundamental que as autoridades ajam para distensionar as condições financeiras. O Tesouro Nacional reagiu rápido e anunciou leilões de recompra de dívida pública, limitando a inclinação da curva de juros e contribuindo para o relaxamento das mesmas. Outro componente importante das condições financeiras é a taxa de câmbio. No atual ambiente de aversão a risco, a moeda brasileira, que já vinha exibindo depreciação mais intensa do que as demais moedas de países emergentes, acentuou sua perda de valor e tende a seguir frágil.
A redução dos juros e a desalavancagem externa da economia brasileira são processos saudáveis e que vinham explicando em parte o movimento de depreciação do real. Todavia, a volatilidade excessiva do câmbio limita o efeito da queda da taxa de juros básica sobre as condições financeiras, na medida em que alimenta a inclinação da curva de juros.
O quadro, assim, é de atividade econômica global e local em perspectiva de ingresso em (curta) recessão, e inflação abaixo da meta, no horizonte relevante para a política monetária. Nos últimos 3 anos, os núcleos da inflação mantiveram-se próximos ao piso inferior da meta, e o crescimento do PIB se situou em torno de 1%. Não vinham sendo observados sinais robustos nem de aceleração consistente da economia, nem qualquer sinal de elevação de inflação, mesmo após a enorme redução praticada nos juros reais, que passaram de cerca de 7% em 2016 para 1%, atualmente.
Na nossa visão, a mudança drástica no quadro exige que o Banco Central use todos os seus instrumentos para transmitir o relaxamento prescrito na política monetária às condições financeiras. Além das corretas medidas de ampliação de linhas de liquidez, já pre-anunciadas pela autoridade monetária, este processo passa, em nosso entendimento, por limitar a depreciação e a volatilidade da taxa de câmbio. A política de intervenções esporádicas neste mercado praticada nos últimos dias não é, em nossa opinião, a melhor forma de viabilizar esta operação. O estabelecimento de um programa de venda de dólares – em tamanho relevante, como pelo menos US$ 50 bi — cumpriria esse papel com muito mais propriedade.
O apoio amplo da política monetária ao distensionamento das condições financeiras — e à retomada do crescimento, à frente — é urgente diante do espaço limitado para a prática de política fiscal anticíclica. Neste contexto, é importante que seja feito onde existe razoável espaço – na política monetária — exatamente para que não termine sendo feito onde pouco existe — na política fiscal, o que traria consequências indesejáveis.
Pedro Jobim é sócio-fundador da Legacy Capital e PhD em economia pela Universidade de Chicago.