A onda de calor que tem atormentado os brasileiros tem pelo menos um beneficiário: a Eneva, que teve que ligar todo o seu complexo de térmicas para garantir a segurança do sistema energético brasileiro.
O Brasil consome em média 75 GW por dia de energia. Com os ar-condicionados ligados no máximo, esse consumo bateu em 100 GW ontem e deve fechar em 105 GW hoje — um recorde na história recente do Brasil.
“Só as hidrelétricas e as fontes renováveis não estão dando conta, porque o El Niño tem gerado também efeitos negativos no vento, com uma menor incidência, o que tem diminuído a geração eólica,” o CFO da Eneva, Marcelo Habibe, disse ao Brazil Journal.
Segundo ele, a última vez que a Eneva teve que ligar todo o Complexo de Parnaíba (que tem cinco térmicas a gás), além de suas duas térmicas a carvão (a Pecém II e a Itaqui) foi em 2021, no meio da crise hídrica.
O mercado reagiu bem à notícia. A ação da Eneva chegou a subir mais de 7% hoje, e opera em alta de 5,8% no meio da tarde.
A receita das térmicas da Eneva é dividida em duas: uma receita fixa, que é paga pelas distribuidoras para cobrir os custos fixos de manter a infraestrutura ligada, e uma receita variável dos despachos emergenciais, como o que está acontecendo agora.
Historicamente, esses despachos geravam um EBITDA de cerca de R$ 500 milhões/ano para a Eneva.
Mas nos últimos dois anos, a companhia não teve nenhum despacho emergencial no Brasil. Ela conseguiu compensar isso em parte com a exportação de energia para a Argentina e o Uruguai, que somaram cerca de R$ 300 milhões ano passado e estão no mesmo patamar este ano.
Nas contas de um gestor comprado no papel, o EBITDA derivado da receita variável da Eneva pode convergir para os níveis históricos de R$ 500 milhões este ano caso os despachos emergenciais continuem fortes nas próximas semanas.
“Se eles continuarem despachando assim no final da primavera e durante o verão inteiro, o resultado variável vai ser extraordinário,” disse o gestor. “Tudo vai depender de quanto tempo as térmicas vão ficar ligadas.”
Habibe nota que os eventos de agora são um choque de realidade para quem defendia que as térmicas não eram mais necessárias no Brasil.
“Se não fossem as térmicas estaríamos passando por um apagão no Brasil agora,” disse ele. “De tempos em tempos esses eventos meteorológicos vão acontecer e as térmicas são necessárias para manter o crescimento e o conforto do País. É uma energia de segurança, que traz estabilidade para o sistema.”
Ele disse ainda que a situação de hoje deve tirar as dúvidas do mercado em relação ao leilão de contratação previsto para o ano que vem — que algumas pessoas estavam achando que poderia não acontecer.
A Eneva tem duas térmicas que vão ser descontratadas em 2028 — Parnaíba I e V — e que devem participar desse leilão. (O leilão é no modelo ‘A-4’, em que se faz um contrato que só começa a valer quatro anos à frente).
“Se não houver o leilão e as térmicas não forem recontratadas, elas deixam de fazer sentido financeiro e a tendência é que haja o descomissionamento, o que seria extremamente ruim para o País.”
Além das térmicas da Eneva, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) acionou diversas outras plantas, incluindo grande parte do parque de térmicas da Petrobras, e Pecém I, que pertence à EDP.