Quando se tornou CFO da Minerva Foods em 2009, Edison Ticle trazia 15 anos de experiência em tesouraria e renda fixa adquirida em lugares como o BTG Pactual, o Banco Safra e as gestoras Constellation e Black River.

11032 4fca81bc d581 f26a c3cd 3000d0940304O novo CFO trazia uma crença: não é porque tem fluxo de caixa em dólar que uma exportadora deve acreditar no chamado ‘hedge natural’ — a ideia de que o aumento de sua dívida em dólar é compensada pelo ganho na receita operacional durante desvalorizações cambiais. 

Ticle implementou uma nova política de hedge, cujos resultados agora estão aparecendo pela primeira vez.

Em junho de 2018, a Minerva hedgeou metade de sua dívida (US$ 900 milhões) comprando contratos a termo de dólar (NDFs) a R$ 3,70. 

Desde então a empresa vem carregando a posição, que deu um resultado expressivo no primeiro tri, quando o real derreteu. A dívida da Minerva — que teria aumentado em R$ 1,8 bilhão sem o hedge — subiu apenas R$ 400 milhões. 

Num momento em que o balanço de muitas empresas sofre com a desvalorização cambial, a Minerva está comemorando os resultados.

“O hedge gerou R$ 900 milhões de resultado e também geramos caixa livre no trimestre,” disse Ticle. “Conseguimos proteger o balanço, o resultado e no meio dessa volatilidade toda reportamos um lucro líquido de R$ 270 milhões.”

A Minerva mantém caixa em dólar e recebíveis de exportação em dólar, o que já protegia em parte seu balanço. “Para complementar isso e ter o balanço zerado, pegamos nossa dívida em dólar, tiramos os recebíveis e o caixa em dólar, e o que sobrou hedgeamos comprando NDF,” disse o CFO.

Na Suzano, a história foi outra.  

Apesar de um resultado operacional espetacular, a desvalorização do real — que fechou o primeiro trimestre em R$ 5,20 — fez a exportadora de celulose perder R$ 12,4 bilhões com a desvalorização e outros R$ 9 bi com derivativos que tentam travar seu custo em reais numa determinada banda cambial.

A Suzano tem por política não proteger sua dívida em moeda forte — o ‘hedge natural’ — o que explica a perda de R$ 12,4 bi. (Esta perda não tem efeito imediato no caixa; apenas reflete o aumento do valor de sua dívida quando convertida para reais.)  

Mas, além de não hedgear sua dívida para reais, a Suzano fez operações para proteger seu fluxo de caixa contra uma valorização do real. Em outras palavras: a companhia decidiu travar seu resultado em reais num certo nível do dólar, ficando exposta a uma alta da moeda a partir daquele nível.

“Muitas exportadoras acham que quando o câmbio desvaloriza, a sua receita operacional vai aumentar na mesma proporção da dívida, de forma que um compensa o outro, mas isso nem sempre é verdade,” diz Ticle.  “Isso só acontece quando o câmbio sobe e para. Quando tem muita volatilidade, os preços dos produtos perdem referência e, frequentemente, todos os seus concorrentes globais desvalorizam junto, de forma que você não ganha competitividade em termos relativos.”

Normalmente, o efeito final é uma queda nos preços dos bens em dólar, que acaba neutralizando parte dos ganhos em reais da depreciação do real. 

Segundo a Suzano, para cada R$ 0,10 que o dólar subir a partir dos R$ 5,20 do final de março, a Suzano perde R$ 445 milhões adicionais. (Hoje, com o dólar a R$ 5,85, esse prejuízo ainda a ser reconhecido estaria em R$ 2,9 bilhões — só com os derivativos, sem contar o impacto na dívida.). O dano é administrável: a Suzano não tem limites de endividamento (covenants) com seus atuais credores e possui caixa para cobrir todos os seus vencimentos em dólar nos próximos três anos.

Na Minerva, a atual política de hedge só passou a ser viável a partir de meados de 2018 — por uma questão matemática. 

Com a Selic alta, o custo de hedge no Brasil era grosso modo de 12% ao ano (o diferencial de taxa entre Brasil e EUA). Somando-se a isso um custo de captação em dólar de cerca de 8%, a empresa gastaria 20% ao ano para swapar sua dívida para reais, sendo que seu retorno sobre o capital investido (ROIC) na época ficava entre 18% e 20%. 

Na concorrência, algumas empresas criticam a Minerva por “operar igual banco,” sugerindo que a empresa está tomando riscos direcionais.

Ticle rebate: “Não tem risco direcional: o tamanho do meu hedge é menor do que a minha dívida em dólar. Se eu quisesse apostar, estaria muito mais comprado em dólar.”