A BRF reportou um primeiro trimestre desastroso, saudado por analistas com frases como “um resultado para esquecer” e “we didn’t see this coming.”
“Está difícil entender o que aconteceu em um intervalo de tão pouco tempo para terem destruído tanto valor,” disse um analista do buyside, notando que o maior problema foi na operação no Brasil. “O negócio na Ásia também foi ruim, e só o negócio de Halal [Oriente Médio] veio acima do esperado.”
A ação chegou a mergulhar 10% em meio a um mercado igualmente pavoroso e, por volta das 13:30h, caía 5,5% para R$ 12,92, o menor nível dos últimos 10 anos. A Marfrig, dona de 33% da empresa, cai 6%.
O EBITDA ajustado ficou em esquálidos R$ 121 milhões no primeiro tri, 86% abaixo do consenso, com os analistas do BTG Pactual comparando o número aos piores momentos enfrentados pela empresa, como a greve dos caminhoneiros e a Operação Carne Fraca.
A operação brasileira registrou um EBITDA ajustado negativo em R$ 411 milhões – o pior da história – com a margem EBITDA mergulhando 7% no vermelho; para efeito de comparação, os analistas do Itaú esperavam um EBITDA positivo em R$ 355 milhões.
O CEO Lorival Luz disse aos analistas esta manhã que o resultado ficou aquém da capacidade da empresa, não reflete o potencial da ‘verdadeira BRF’, mas que confia na capacidade do time de reverter o resultado nos próximos trimestres.
Segundo ele, as vendas em janeiro ficaram muito aquém do esperado, o que desequilibrou a cadeia produtiva e trouxe impactos de custo relevantes – a BRF tomou a decisão de fazer ajustes e readequar a cadeia produtiva e os estoques, para que esse impacto ficasse restrito ao primeiro tri.
(Sem os ajustes – de R$ 422 milhões na cadeia e de R$ 406 milhões por conta de hedge de commodities – o EBITDA teria alcançado R$ 949 milhões, nas contas do BTG. Ainda assim, esse resultado ainda estaria 30% abaixo do esperado pelo banco.)
Na call com o mercado, a BRF disse que as vendas já se recuperaram em março – uma alta de 40% em relação a janeiro – e que abril foi um mês “bom” para o negócio; para os analistas, ficou subentendido que seguindo nesse ritmo, a companhia vai alcançar R$ 1 bi de EBITDA no segundo tri.
Os analistas do BTG disseram que a queda dos volumes de janeiro forçou a BRF a remarcar preços, cortar a produção e liquidar estoques para evitar um período prolongado de desequilíbrio de estoque, embora grande parte dos custos de produção já estivesse lá, escreveram os analistas. Na média, os preços subiram 6%, mas mas os custos unitários dispararam 31%
A maioria dos analistas disse que ainda vai rever as projeções, mas o JP Morgan já rebaixou a empresa de ‘neutral’ para ‘underweight’ e cortou o preço-alvo em 43%, de R$ 21 para R$ 12. Os analistas Lucas Ferreira, Ulises Argote e Sebastian Hickman atribuíram o resultado mais a uma execução fraca do que a um contexto desafiador.
“A queima de caixa impulsionada por números operacionais negativos foi grande, consumindo grande parte dos recursos do follow-on e tornando a alavancagem mais uma vez um sinal amarelo para o case,” escreveram os analistas.
Depois de captar R$ 5,4 bi vendendo a ação a R$ 20 na oferta em fevereiro, a BRF reduziu sua alavancagem de 3,12x para 2,83x. A queima de caixa no trimestre passado foi de cerca de R$ 3,7 bi. Para um analista do buyside, o resultado deixa claro que as empresas do setor não têm nenhum controle do ciclo.
“Mesmo entendendo que o 1T22 deve ser o low do resultado, a velocidade de recuperação ainda é incerta, uma vez que a empresa precisará passar por ajustes em sua estratégia que não estão claros para nós.”
Para os analistas do JP Morgan, o cenário macro continua desafiador, com os preços do milho próximos das máximas históricas e os custos logísticos em níveis elevados, enquanto os lockdowns na China representam um risco para grande parte do mercado de exportação.
A BRF agora negocia a um EV/EBITDA de 8x para 2022 e 6,2x para 2023 – a média histórica é de 7,2x.
Os analistas do BTG disseram que apesar da contração da demanda em janeiro, nenhuma outra empresa do setor foi tão impactada por isso quanto a BRF. Segundo eles, a empresa demonstrou “alguma resiliência em 2021,” mas o ajuste indica que o patamar sustentável da empresa é outro. Além disso, o ajuste veio no trimestre do follow-on, o que deve “levantar as sobrancelhas dos investidores.”
Lorival disse na call que o cenário é positivo para 2022 e que a empresa está bem posicionada para capturar a melhora do mercado internacional, apesar de ainda existir desafios no mercado interno. O CEO também disse que está fazendo um plano para simplificar as estruturas e deixa a empresa mais dinâmica, mas descartou venda de ativos ou fechamentos de fábricas.