A economia europeia está fragilizada devido às políticas comerciais dos EUA, mas os mercados já estão performando à espera do impacto dos estímulos econômicos.
O Stoxx 600 subiu 6% no primeiro semestre – em linha com o S&P 500 – mas o subíndice que representa os setores de defesa e aeroespacial saltou 50%.
Desmembrando a performance por país, o alemão DAX valorizou 20%, enquanto o francês CAC 40 e o britânico FTSE 100 subiram 4% e 7%, respectivamente.
A Alemanha, a maior economia do bloco, flexibilizou seu orçamento para investir mais em infraestrutura e energia, e, dias atrás, os países da Otan decidiram aumentar seus gastos com defesa para 5% do PIB até 2035.
As medidas devem estimular o PIB da região e impor mudanças na composição de crescimento do continente, Stefan Rondorf, o estrategista da Allianz Global Investors, disse ao Brazil Journal.
As exportações devem perder espaço com as tarifas de Trump e uma China mais fraca — que já vêm afetando a indústria automotiva e o varejo de luxo — enquanto o investimento e o consumo domésticos tendem a ganhar espaço.
Neste cenário, a Allianz recomenda comprar as small e mid caps da região — principalmente as de value, como healthcare e real estate, e infraestrutura — que foram preteridas nos últimos anos por conta do baixo crescimento econômico e da predileção do mercado por blue chips com exposição aos EUA ou à China.
O Citi, que elevou recentemente o mercado acionário europeu de trade tático a overweight estratégico, vai na mesma linha. Para o banco, “a Europa continuará recebendo recursos vindos dos EUA e a expansão fiscal trará uma melhora na trajetória de crescimento no médio prazo, justificando múltiplos mais altos para as empresas.”
Ainda que com alguma oscilação durante o ano, os fundos de ações europeus receberam US$ 100 bilhões entre janeiro e junho, enquanto seus pares americanos tiveram resgates de US$ 87 bilhões, segundo a LSEG.
O Citi recomenda os setores de viagem e lazer, indústria automotiva, real estate e tecnologia. Em termos geográficos, prefere o mercado do Reino Unido para ações de value, a França para growth, e a Alemanha para cíclicos.
Apesar do Stoxx 600 negociar atualmente a um múltiplo P/L próximo à média histórica, o mercado acionário europeu ainda carrega um desconto de 30% em relação às bolsas americanas e os papéis cíclicos domésticos são os mais baratos, diz o Citi.
Ainda que esteja construtivo, o banco não descarta turbulências de curto prazo, já que as tarifas e a força do euro contra o dólar podem afetar a lucratividade das empresas.
Na outra ponta, há também quem siga alocado no mercado europeu apenas de forma tática, acreditando que algumas das teses vencedoras dos últimos meses podem continuar dando frutos, mas de forma pontual.
“A Europa está em uma posição melhor do que estava no início do ano, mas acreditamos que os principais vetores de crescimento global seguem nos EUA,” disse Ruy Alves, sócio e gestor macro da Kinea. “Assim, nossas alocações na região são táticas.”
Uma das principais posições da Kinea é a britânica Rolls-Royce, a produtora de turbinas cuja ação já sobe 111% nos últimos 12 meses, mas que continua se beneficiando da forte demanda aeroespacial no mundo.
A Kinea reduziu sua exposição à Rheinmetall, uma fabricante alemã de equipamentos para as indústrias de defesa e automotiva, depois da alta de 262% da ação ao longo dos últimos 12 meses.
No mercado de câmbio, a Kinea tem um posicionamento tático no euro.
“Os Estados Unidos têm hoje US$ 30 trilhões em investimentos estrangeiros não hedgeados, e esse dinheiro está buscando proteção, o que tende a beneficiar o euro. Mas conforme o diferencial de juros cresce, uma possível volta da institucionalidade dos EUA seria negativa para a divisa europeia,” disse Alves.
A Goldman Sachs espera que o euro suba a US$ 1,25 nos próximos 12 meses, o que pressupõe uma alta de 7% em relação ao patamar atual, de US$ 1,17.
Segundo os analistas do banco, o cenário de hoje tem semelhanças com o de 2017, quando o otimismo com o crescimento global ajudou a impulsionar o euro.
No entanto, a Goldman nota que a moeda europeia não está desvalorizada hoje como estava há oito anos, e que as projeções refletem principalmente a esperada desvalorização do dólar.
“Gostamos do euro contra o dólar, mas um investimento estrutural é mais difícil porque depende do Continente avançar em reformas, competitividade, integração,” disse Rondorf, da Allianz.