Pedro Maeda faz parte da terceira geração de uma das famílias mais famosas do agronegócio brasileiro. Assim como os Ometto e os Maggi, o sobrenome Maeda figura na elite do campo nacional.
O patriarca da família, Tsunezaemon Maeda, veio do Japão em 1927 e participou da primeira fronteira agrícola brasileira, abrindo as terras roxas do interior de São Paulo para o plantio de café.
Décadas depois, já nos anos 70 e 80, os Maeda compraram terras no Mato Grosso, Goiás e Bahia, e se tornaram um dos maiores produtores de algodão do Brasil.
Em 2010, a estratégia dos Maeda mudou diante do endividamento do grupo. Na época, a empresa vendeu o controle da operação de grãos e algodão para o fundo espanhol Arion Capital, e as operações de biodiesel para uma empresa que viria, anos mais tarde, a fazer parte do grupo Terra Santa.
Hoje, os sete ramos da família são acionistas da Saga Maeda, que se tornou uma empresa de arrendamento rural.
Pedro Maeda, que é vice-presidente da Saga, tem direcionado seu interesse não mais para as áreas férteis e altamente tecnificadas que movem o agronegócio nacional, mas para terras degradadas, com baixa produtividade e desprezadas no ciclo agropecuário.
“Recuperar terras é mais caro do que abrir áreas novas na fronteira agrícola”, diz Pedro, que há cinco anos fundou a Regai, uma empresa que ajuda na transformação da produção rural tradicional em soluções de agricultura regenerativa.
No Brasil, estima-se que haja cerca de 80 milhões de hectares degradados pela pecuária extensiva. Metade dessas terras tem aptidão para a agricultura.
De olho nesse imenso estoque de terras subutilizadas, a Regai está lançando um fundo de R$ 500 milhões para comprar 20 mil hectares de terras degradadas no Cerrado e recuperá-las com agricultura regenerativa, utilizando o modelo de Integração Lavoura-Pecuária- Floresta (ILPF). A oferta ainda não foi registrada na CVM, mas deve ocorrer até o final de junho.
Na empreitada, estão também a Trius Capital, gestora focada em operações em infraestrutura com R$ 1,4 bilhão em ativos sob gestão, e a Cocamar, cooperativa agrícola fundada em 1963 em Maringá, no Paraná, e que hoje tem 17 mil associados operando em cinco estados.
“Esse fundo tem três pais: Trius, Regai e Cocamar. A Trius cuida da parte de funding, a Cocamar vai operar as terras, e a Regai é a incorporadora, trazendo a tecnologia da ILPF e a expertise de compra e venda de terra que eu trouxe da Maeda,” Pedro disse ao Brazil Journal.
A Regai já tem 500 mil hectares mapeados no Cerrado e deve mirar propriedades de 3 mil a 5 mil hectares para o projeto. Em geral, são terras que custam um terço do preço médio, justamente por estarem degradadas e inutilizadas para a agricultura.
A Cocamar é quem irá arrendar as terras compradas pelo fundo e que, por sua vez, vai subarrendar para seus cooperados por 10 anos.
A cooperativa vai selecionar 40 famílias com capacidade financeira e experiência no ILPF, um modelo que combina cultivo de grãos, criação de gado e plantio de árvores numa mesma área.
“A Integração Lavoura-Pecuária é o melhor que o Brasil já desenvolveu de tecnologia para a produção sustentável de alimentos. O mesmo hectare que antes produzia 4 arrobas de carne por ano, com o ILPF passa a produzir 60 sacas de soja e mais 7 arrobas de carne, só com pastagem de inverno,” disse Renato Watanabe, gerente da Cocamar.
Com 1 milhão de hectares em produção no País, a Cocamar já tem cerca de 250 mil hectares em operação neste sistema. O projeto com a Regai ajuda a resolver um problema antigo na cooperativa.
“Ao longo dos anos, temos enfrentado dificuldade para encontrar novas áreas para os filhos de cooperados que desejam seguir na agricultura,” disse Watanabe.
Cada cooperado da Cocamar deve acessar uma área de 500 hectares (porção bem superior aos lotes do Paraná, entre 50 e 70 hectares). Toda a produção de grãos e de pecuária será negociada pela Cocamar.
Um projeto de ILPF demora pelo menos sete anos para atingir a maturidade. Os dois primeiros anos da operação ficam no negativo. Por isso, o fundo dará incentivos aos produtores, como carência de até três anos no arrendamento e seguro, a depender do nível de investimento para recuperação da terra – isso sim virá do bolso dos produtores.
“O fundo irá fazer os investimentos iniciais como casa para a família, silo, energia solar renovável. Tudo o que não é conectado ao ano safra do produtor virá do fundo,” disse Rubens Cardoso, diretor de infraestrutura da Trius Capital.
Ao final do contrato de arrendamento, esses produtores terão preferência na compra da área. Se optarem em não seguir, ganham um percentual da valorização da terra no período.
“Ao final dos dez anos, vamos ter terras regeneradas com produtividade equivalente às áreas mais férteis do País,” disse Pedro. A lucratividade do fundo virá justamente com a valorização desses ativos recuperados na hora da venda.
Essa é a segunda tentativa de Maeda de lançar um projeto semelhante. Em 2023, a Regai se juntou à Vox Capital para também captar R$ 500 milhões, mas a demanda ficou aquém do esperado.
Na época, o projeto chegou a captar R$ 50 milhões, mas os sócios avaliaram que o valor seria insuficiente para comprar grandes áreas e desistiram.
Nessa nova empreitada, o fundo – um Fiagro – vai integralizar cotas também em forma de terra, atraindo assim os proprietários de áreas para entrar no projeto como investidores.
“Isso significa que não estamos indo ao mercado financeiro captar dinheiro, mas sim no mercado de terras captar terras,” diz João Carlos Telles, CIO da Regai e um ex-executivo do UBS BB e do Banco do Brasil.
Outra forma de atrair investidores será através de cotas mezanino que miram agentes da cadeia de fornecimento, como empresas de insumos e máquinas – que teriam preferência na contratação de serviços. Sergio Saurin, fundador da empresa de fertilizantes Massari Fértil, é um dos que vão entrar na cota mezanino.
Dos R$ 500 milhões, 60% serão captados em forma de terras, 20% em cotas mezanino com a cadeia de fornecimento e 20% efetivamente deverão vir do mercado.
“Dessa forma, o projeto já nasce ancorado. A partir do momento que a gente lançar a oferta, vamos apenas construir o bookbuilding,” diz Telles.
Nas conversas com investidores europeus e asiáticos, um dos pontos que vêm sendo discutidos é a possibilidade de ter preferência na compra da produção agrícola das áreas do projeto.
No longo prazo, a Regai mira recuperar 200 mil hectares, o que envolveria a criação de outros fundos ou um follow-on.
Nas contas de Pedro, ao longo de 10 anos o projeto pode ter um impacto econômico de R$ 4,2 bilhões, considerando os investimentos nas áreas e a produção agrícola gerada – sem contar a lucratividade da operação imobiliária ao final do ciclo.
“É o capital paciente, que espera o tempo necessário, somado à tecnologia, disciplina de infraestrutura e mudança cultural na gestão da terra que vai reposicionar uma terra que ninguém queria em um ativo de agricultura regenerativa,” disse Pedro.