Se você acha que os pagamentos digitais chegaram ao auge com o Pix, prepare-se: a próxima revolução está começando — e atende pelo nome de pagamentos agênticos (agentic payments).

Na semana passada, a Mastercard e o PayPal anunciaram iniciativas concretas para trazer esse novo conceito à vida, combinando inteligência artificial generativa com infraestrutura de pagamentos. 

No dia seguinte, a Visa apresentou o Visa Intelligent Commerce durante seu evento global de lançamento de produtos.

De forma simples: imagine um assistente de IA que entende suas preferências, sugere compras e ainda realiza o pagamento por você de forma segura e personalizada. Parece ficção científica, mas é exatamente isso que está sendo colocado em prática.

A Mastercard e o Agent Pay

A Mastercard, em parceria com a Microsoft e a IBM, lançou o Agent Pay, sua nova tecnologia para pagamentos por meio de agentes de IA. A proposta é permitir que esses agentes — como copilotos de IA treinados com base em suas preferências — tomem decisões de compra e executem pagamentos de forma autônoma, com segurança garantida por tokenização avançada e verificação prévia dos agentes.

Por exemplo, alguém planejando uma festa de aniversário pode conversar com um assistente virtual que selecionará proativamente bebidas, comidas e enfeites de lojas locais e online com base em seu gosto, localização e previsão do tempo. O próprio agente pode comprar os itens sugeridos, selecionar a melhor forma de pagamento — tudo isso sem que o consumidor precise acessar uma loja virtual ou inserir dados do cartão.

No mundo B2B, uma pequena empresa poderá usar um agente de IA para buscar fornecedores, negociar prazos e concluir o pagamento com um cartão corporativo virtual da Mastercard — tudo de forma integrada, sem planilhas, emails ou formulários manuais.

Jorn Lambert, o chief product officer da Mastercard, disse que “o lançamento do Agent Pay marca nossos primeiros passos para redefinir o comércio na era da IA, incluindo novas interfaces para comerciantes que distinguem agentes confiáveis de maus atores usando tecnologia agêntica.”

E o que está fazendo o PayPal?

Enquanto isso, o PayPal anunciou ferramentas que permitem que desenvolvedores criem experiências semelhantes dentro da sua própria plataforma. Os agentes poderão gerenciar entregas, acompanhar pagamentos, emitir faturas e realizar cobranças automaticamente, tudo com a infraestrutura segura e escalável do PayPal.

Segundo Alex Chriss, CEO da empresa, trata-se de “capacitar os clientes para acessarem novas oportunidades na economia da IA (AI economy).”

Por exemplo, um agente de IA poderia gerar uma fatura no PayPal baseada nos detalhes de um serviço prestado e enviá-la ao cliente, acompanhando o status do pagamento e enviando lembretes para faturas em atraso.

E a Visa?

Se alguma dúvida ainda pairava sobre a direção que o setor de pagamentos irá tomar nos próximos anos, ela foi eliminada com o anúncio da Visa. Pouco depois da Mastercard e PayPal revelarem suas apostas no comércio agêntico, a Visa apresentou sua própria proposta para essa nova era: o Visa Intelligent Commerce.

A empresa reforçou seu posicionamento de que agentes de inteligência artificial — treinados com base nas preferências dos consumidores — conseguirão buscar, comprar e gerenciar pagamentos de forma totalmente autônoma.

A proposta da Visa é permitir que os consumidores configurem suas preferências e limites, enquanto os agentes de IA cuidam do restante, de forma segura, personalizada e integrada à infraestrutura da própria Visa.

Por exemplo, um consumidor pode programar o agente de IA para monitorar a compra de produtos de uso recorrente — como cápsulas de café, fraldas ou produtos de limpeza — e, com base em estoque doméstico e histórico de consumo, o próprio agente realiza a compra no melhor momento e com a melhor oferta. O pagamento ocorre automaticamente com um cartão tokenizado da Visa, sem necessidade de interação direta do usuário.

A Visa também revelou uma integração com stablecoins por meio de uma parceria com a Bridge (uma empresa controlada pela Stripe), que permitirá a emissão de cartões Visa vinculados a saldos em stablecoin. Esses cartões poderão ser utilizados em qualquer estabelecimento que aceite Visa, como qualquer outro cartão tradicional.

Jack Forestell, o chief product and strategy officer da Visa, disse que “em breve, as pessoas terão agentes de IA que navegam, selecionam, compram e gerenciam tarefas em seu nome. Esses agentes precisarão ser confiáveis para realizar pagamentos — não apenas pelos usuários, mas também pelos bancos e pelos vendedores.” 

Afinal, o que são esses ‘pagamentos agênticos’ (agentic payments)?

São transações realizadas por agentes de IA em nome do usuário, baseadas em preferências e regras pré-estabelecidas. É a evolução do “um clique para pagar” para o “nenhum clique necessário” — o pagamento invisível (invisible payment), que eu prefiro chamar de pagamento inteligente, na sua forma mais sofisticada. O usuário passa a definir intenções e limites, enquanto a IA executa — de forma personalizada e segura — a melhor decisão de compra e pagamento.

Mais do que um avanço tecnológico, isso representa uma mudança profunda no papel da infraestrutura de pagamentos. O foco sai da experiência da transação e entra na experiência da necessidade resolvida.

Segurança e confiança serão essenciais

Para que isso funcione, os agentes precisarão ser verificados, registrados e certificados (trusted agents). A Mastercard, por exemplo, está desenvolvendo mecanismos para distinguir agentes confiáveis de “maus atores”. Todo o processo será protegido por tokenização inteligente, sem exposição de dados sensíveis.

Estamos falando de uma arquitetura que não apenas protege o pagamento, mas protege a decisão de pagar.

O que estamos testemunhando não é apenas uma nova forma de pagar. É o surgimento de um novo ecossistema, no qual os pagamentos deixam de ser um fim e passam a ser um meio invisível, fluido e inteligente, embutido em assistentes que aprendem com você e agem por você.

Como aconteceu com o surgimento do Pix ou com o avanço dos pagamentos invisíveis no varejo físico, os pagamentos agênticos (agentic payments) têm potencial de se tornarem o novo padrão — especialmente em um mundo onde o tempo e a atenção são os ativos mais escassos.

Em breve, você pode acordar com seu agente de IA já tendo encomendado seu café, pago a mensalidade da academia e reorganizado sua planilha de despesas. E o melhor: sem que você tenha sequer pedido.

Edson Santos é fundador e sócio da Colink Business Consulting, conselheiro e advisor.  É autor de “Do Escambo à Inclusão Financeira – A evolução dos meios de pagamento” e coautor de “Payments 4.0 – As forças que estão transformando o mercado brasileiro.”