Tornou-se chavão dizer que, no mundo contemporâneo, a incerteza é a única certeza. A realidade realça e expande essa verdade.
A inovação tecnológica cria negócios globais da noite para o dia e destrói aqueles presos a padrões superados. O mercado de trabalho acompanha esse movimento, gerando novas castas profissionais e desempregando os capacitados em tecnologias em desuso. A globalização eleva a média de qualidade de vida, mas acentua a concentração e a iniquidade social. Essa dinâmica amplia a insegurança e o medo, que alimentam o populismo e recrudescem o ódio no mundo e, a reboque, o terror.
O cenário se reflete na edição 2017 do Trust Barometer, realizado pela Edelman em 28 países. Trata-se do mais amplo estudo sobre a confiança da sociedade nas empresas, governos, ONGs e na mídia. Seu resultado aponta declínio na credibilidade destas instituições em 21 países, a maior dispersão na queda de confiança já registrada.
Avaliando a percepção das pessoas em quatro variáveis (“sensação de injustiça”, “falta de esperança”, “falta de confiança” e “desejo de mudança”), o estudo conclui que somente 15% do público global entende que o “sistema está funcionando” plenamente. No Brasil, esse número é ainda menor: 13%.
O Trust Barometer aponta ainda o crescimento do abismo entre “público informado”, a elite socioeconômica, e “público em geral”. Entre os primeiros, o índice de confiança global nas instituições permanece em 60 pontos, enquanto o do “público geral” caiu de 48 para 45. A diferença de 15 pontos é ainda maior em países como EUA (21) e Inglaterra (19), jogando mais luz sobre sociedades divididas entre extremos, como demonstram as eleições de Trump e o Brexit.
Neste aspecto, o Brasil distingue-se do mundo. A diferença entre estes dois segmentos foi reduzida a 4 pontos — não porque subiu o nível de confiança do “público geral”, próximo ao ano anterior, mas pela queda de 7 pontos na confiança do “público informado”.
O estudo revela outras especificidades do país que emerge da mais profunda crise econômica da sua história e se assombra pela contínua comprovação de que a corrupção é o padrão da relação público-privada.
87% dos brasileiros pesquisados estão preocupados com a corrupção, dos quais 70% estão temerosos. Este último índice está muito acima dos demais temores analisados, todos abaixo de 30%, como “globalização”, “erosão de valores”, “imigração” e “aceleração tecnológica”.
Não por outro motivo “pagar propina para agentes públicos” é apontada como a atitude que mais afeta a confiança futura nas empresas no Brasil, seguida de “lucrar excessivamente sobre produtos essenciais”, “reduzir custos cortando empregos”, “reduzir custos cortando qualidade” e “reduzir benefícios aos funcionários”.
O descalabro ético e moral do país continua afetando principalmente o poder público, que com míseros 24 pontos coloca a sociedade brasileira na antepenúltima posição de confiança em seus governos, à frente somente da Polônia e da África do Sul.
Mesmo com queda de 3 pontos, as empresas permanecem líderes de confiança no Brasil, com 61 pontos. As ONGs estão próximas, com 60, seguidas da mídia, agora com 48 após perder 6 pontos.
Apesar do envolvimento de grandes empresários nos escândalos de corrupção, o bom nível de confiança nas empresas permanece, pois simbolizam a contraposição à baixa avaliação dos governos e a possibilidade de ascensão pelo emprego e pelo consumo. 86% do público brasileiro pesquisado entendem que as empresas podem desenvolver ações que gerem simultaneamente lucro e desenvolvimento socioeconômico nas comunidades que operam, índice 11% acima da média mundial. Isso mostra a oportunidade para as empresas liderarem uma agenda de transformação no Brasil.
Já o desafio para marcas diretamente envolvidas na Lava Jato e seus derivados é obter o mínimo de licença social para operar e sobreviver economicamente. As que ultrapassarem esse estágio terão a chance de reconciliar-se com a sociedade brasileira num futuro ainda indefinido.
Yacoff Sarkovas é CEO das agências Edelman Significa e Zeno.