A demora dos EUA em lidar com o crescente desequilíbrio nas contas públicas traz o risco de “debilidade” econômica e “decadência.”

O alerta é de Stanley Druckenmiller, um dos mais bem-sucedidos gestores das últimas décadas.

Druckenmiller lembra que a cada ano os EUA gastam mais com os benefícios destinados aos idosos, diminuindo os recursos para investir nos mais jovens – o que reduz o potencial de crescimento do país no futuro.

A análise está no artigo “Coming Fiscal Horror Show,” publicado na mais recente edição da revista The International Economy.  O texto foi baseado em um discurso que Druckenmiller, o ex-estrategista-chefe da Soros Fund Management, fez em maio na USC Marshall, a faculdade de negócios da University of Southern California.

Stanley DruckenmillerO gestor, que hoje comanda sua Duquesne Capital, lembra que o “excepcionalismo” e a “inovação” dos EUA estiveram em evidência nas últimas quatro décadas – um período em que o país liderou a revolução da informática e o desenvolvimento da internet, além de ganhar a dianteira na inteligência artificial.

A fragilidade na saúde das contas públicas, entretanto, representa uma séria ameaça para os próximos anos, diz Druckenmiller.

“O fracasso no front fiscal vai fortalecer autocracias como a China e a Rússia, além de tragicamente colocar em risco a riqueza necessária para investir contra crises existenciais como as mudanças climáticas, para não falar dos programas destinados ao menos favorecidos,” afirma.

Sem uma mudança de curso, as aposentadorias serão “uma fração” das atuais, e o governo americano terá dificuldade para sustentar os gastos com saúde da população mais pobre. Dentro de duas ou três décadas, haverá uma queda no número de trabalhadores jovens e um aumento dos mais velhos que precisam de apoio estatal, num contexto em que a dívida pública será a “maior de nossa história.”

Druckenmiller lista alguns números e fatos sobre a recente deterioração fiscal dos EUA.

A despesa com os mais velhos cresce “dramaticamente” desde os anos 1960. “Hoje gastamos seis vezes mais com os sêniores do que com as crianças nos EUA,” diz Druckenmiller. “Quase 60% da receita tributária vai para os idosos.”

Dentro de dez anos, afirma, o gasto com a população idosa atingirá 70% do total, espremendo o orçamento e reduzindo os recursos que deveriam ser investidos nos mais jovens.

O gestor lembra que, ao longo da última década, a dívida pública saltou de US$ 15 trilhões para US$ 31 trilhões – “um nível apenas comparável com aquele do final da Segunda Guerra Mundial.”

Para o gestor, o preocupante é que a dinâmica demográfica não se assemelha à do pós-Guerra e, recentemente, o país tem perdido a oportunidade de reduzir seus desequilíbrios fiscais mesmo durante os períodos mais favoráveis, ao registrar déficits em anos de boom econômico.

O ‘gap fiscal’ – o volume adicional de recursos necessário para manter o nível atual dos gastos sociais nos próximos anos – estaria em 7,7% do PIB. “Isso equivale a aumentar em 40% a receita tributária federal ou reduzir imediatamente e de maneira permanente em 35% os gastos federais.”

A ironia, observa Druckenmiller, é que na França esse gap é menor – 2,3% do PIB – e o governo está se preparando para os desafios, com a reforma da previdência e o aumento da idade para a aposentadoria.

“Enquanto isso, nos EUA, a única coisa em que Hillary Clinton, Joe Biden e Donald Trump conseguem entrar em acordo é que os direitos e benefícios não devem ser tocados,” disse.

O gestor apresenta projeções sobre o custo dessa dívida. Com a taxa de juros em 5%, os gastos com juros vão subir de 8% das despesas totais para 27% em 2050.

“Esse é um pesadelo para o futuro do crescimento econômico, do investimento e da produtividade,” diz Druckenmiller. “E, claro, para o futuro dos pagadores de impostos.”

Essa “história horrível” não para por aí. O gestor critica o Federal Reserve pelo crescimento de seu balanço, iniciado com a crise de 2008 para combater o risco de uma depressão econômica. O balanço do Fed hoje já alcança quase US$ 9 trilhões.

“Essa política do Fed incentivou o comportamento de risco entre os investidores, os bancos e o governo. Criou bolhas sem precedentes, tanto em amplitude como em magnitude – o frenesi tech, a loucura cripto, os SPACs.”

O gestor diz que o aumento dos juros pelo Fed para combater a inflação chega “antes tarde do que nunca,” mas pondera que a assimetria nas ações do Fed, ao aumentar a liquidez sempre que surge um estresse, acaba por dar corda à falta de urgência em Washington para uma “ação estrutural séria” – tanto da parte dos Democratas quanto dos Republicanos.

“É difícil estar exagerando ao falar da miopia absurda da situação difícil criada pelas autoridades em Washington,” conclui Druckenmiller. “Eles estão consumindo a nossa ‘semente do futuro’ ao custo do investimento e do crescimento nos próximos anos.”