Detalhes do plano de recuperação judicial da Light começaram a emergir ontem à noite – mas com uma notícia torta que causou confusão no mercado.
Segundo uma nota de Lauro Jardim, corrigida em alguns minutos, a Light estava desistindo de seu pedido de recuperação judicial. A interpretação do mercado foi de que um acordo com os credores estava próximo.
Numa conversa com o Brazil Journal, o chairman da companhia, Hélio Costa, disse que a coisa não é bem assim.
“O conselho aprovou a desistência da RJ quando houver um acordo com credores. A desistência será a consequência lógica de um acordo,” disse Helio.
Abaixo, trechos da entrevista, conduzida por email.
Causou muita confusão uma notícia que saiu agora à noite dizendo que a Light desistiu da RJ. É isso mesmo?
O conselho aprovou a desistência da RJ quando houver um acordo com credores. A desistência será a consequência lógica de um acordo. O plano está sendo elaborado e vamos abreviar ao máximo o processo de RJ. É o melhor para todos. É o melhor para a companhia.
Há também relatos de um plano de conversão de 30% a 40% da dívida em ações, o alongamento do restante da dívida em 10 anos e um aumento de capital de no mínimo R$ 1 bilhão na empresa. É isso mesmo?
Sim, uma parte dos acionistas de referência estão ancorando uma capitalização de no mínimo R$ 1 bilhão. É um comprometimento importante para viabilizar a nova fase da empresa, que vai precisar de capital.
Qual é a sua avaliação sobre a Light depois de um mês e meio à frente do conselho?
A Light é uma companhia com inúmeros desafios, seja de ordem operacional, estrutural e filosófica. O que vai diferenciar a Light agora será a maneira de encarar estes desafios. Não vamos jogar a culpa nos outros e nem ficar de braços cruzados à espera de soluções que caiam do céu. Estamos trabalhando em todas as frentes possíveis para colocar a companhia nos trilhos.
O que já foi feito nestes 45 dias?
Temos dialogado incansavelmente com todos os stakeholders. Trabalhamos 24 horas por dia para renovar a concessão em bases justas para a companhia e para o Poder concedente. Queremos encurtar a recuperação judicial, algo que se tornou um mal necessário mas sempre foi indesejável. Estamos negociando com os credores e acreditamos que eles já perceberam que os acionistas querem encontrar um caminho que seja o menos doloroso para todos. Também procuramos demonstrar para o órgão regulador e para o Governo do Rio que estamos fazendo a nossa parte e que não esperamos que todas as soluções venham do Estado.
O que foi decidido na prática?
O Conselho desenhou um plano de reestruturação com várias frentes importantes: atuação institucional, criação de valor e inovação, abordagem dos grandes temas jurídicos. E o mais importante: foi aprovado um plano que se inicia com a chancela jurídica da saída antecipada da RJ, acompanhado de um acordo com a maioria dos credores. É um passo fundamental para desanuviar de vez as relações e conversas com órgãos reguladores e credores da companhia. A Light precisa estar unida e saneada para pleitear a renovação da concessão.
Como atingir essa missão?
Os principais pontos dessa nossa jornada são: grande sacrifício para os acionistas, decisão voluntária dos credores em relação ao plano, com possibilidade de conversão de créditos em participação acionária e, sobretudo, que a companhia não fique exposta a custos financeiros superiores à taxa de reajuste tarifário, que é o que se verifica atualmente.
Como tem sido o diálogo com os credores?
O diálogo tem sido muito produtivo e tem se dado dentro de um ambiente de cordialidade. O BR Partners, que colocamos como o novo e único assessor financeiro autorizado a ter interlocução como credores, foi um divisor de águas. Eles restabeleceram o diálogo com os credores e definiram uma governança para o processo. Se pudesse definir o que perseguimos e conseguimos, uma palavra resume: pacificação.
O BR Partners trabalha para a companhia e tem a obrigação de atender todos os stakeholders com a mesma transparência. Negociações como essa nunca são fáceis, mas não pode haver a impressão de que o acionista quer levar vantagem sobre o credor. Esse conselho conseguiu restabelecer o equilíbrio para que todos possam dividir sacrifícios de forma justa.
O conselho deliberou pela implantação de um plano de conscientização para os stakeholders. O que isso significa exatamente?
Um dos grandes desafios que temos é a questão do furto de energia. É claro que a solução passa por um posicionamento muito mais ativo e presente da Light na solução deste grave problema. E também pelo Estado, seja pela ação social, seja pela punição ao descumprimento da lei. Mas ela passa também por uma conscientização da sociedade.
Se você tem um celular ou um relógio roubado, você não fica de braços cruzados. Você denuncia. Aguarda que ele seja localizado e retorne para suas mãos. Não podemos ficar de braços cruzados em relação ao furto de energia. A Polícia tem realizado um grande esforço nesta direção, mas acreditamos que é preciso mobilizar a sociedade e pensamos neste momento em como fazê-lo.
Queremos mostrar que entendemos que não adianta apenas cobrar do Estado. Nós, enquanto concessionários, também faremos nossa parte. Vamos alocar recursos para isso.
Você foi indicado pelo acionista de referência, Nelson Tanure. Como está o relacionamento entre o novo conselho e os acionistas da companhia?
O relacionamento é o melhor possível, tanto dos acionistas entre si quanto deles com o conselho. O atual conselho tem um perfil mais operacional, mais executivo. Entendemos que podemos contribuir fortemente no relacionamento com os credores, entes reguladores e agentes públicos. É assim que temos atuado. O management cuida do dia a dia. As coisas vão funcionar assim. É o estilo do Tanure: ele é um acionista que busca influenciar e colaborar com as companhias em que investe. Isso se encaixou bem com a visão dos demais acionistas. O conselho atual, composto por profissionais com os mais diversos perfis, é um reflexo desta maneira de enxergar as coisas.
Afinal, o que vai mudar na Light?
Excluindo-se as áreas com problemas, a Light é uma companhia com níveis de excelência operacional. A entrega dos serviços é muito boa e reconhecida. Isso é mérito do corpo técnico, dos funcionários e colaboradores e, claro, do management. Não se trata de mudar o que está funcionando.
O que vai mudar agora é a assertividade em relação a temas que não podiam deixar de ser endereçados pelos acionistas da companhia. O conselho da Light será a voz tanto de acionistas quanto do conjunto de stakeholders, e vai ser uma voz assertiva e presente. A companhia precisava desta nova “persona”.
A Light é viável?
A Light é uma empresa com o potencial de valer dezenas e dezenas de bilhões, assim como suas concessionárias vizinhas. É uma espécie de jóia ou obra de arte que ficou guardada por muito tempo. Alguns de seus donos anteriores se esqueceram que ela precisava de cuidados. Toda jóia e obra de arte precisa de boa conservação. Os atuais acionistas entendem isso e têm investido muito na companhia. E vão continuar a fazê-lo. Mas isso não apaga algumas décadas passadas. O que eu posso dizer é que a Light vai surpreender e se mostrar forte e competitiva muito antes do que se imagina.