BRASÍLIA — Criado para dar algum fôlego aos Estados estimulando medidas de ajuste fiscal, o novo plano de socorro desenhado pela equipe econômica corre o risco de sair pela culatra, caso o Congresso ceda a pressão dos governadores e amplie a possibilidade de endividamento e de gastos.
Na última semana, a equipe econômica foi aconselhada por lideranças no Congresso a rever pontos do projeto de lei que abririam brechas para o socorro se tornar uma pauta-bomba.
Os conselhos vieram de parlamentares graúdos, como os presidentes do Senado e da Câmara, que vêem na dificuldade de articulação do Executivo com o Congresso um risco de perda de controle sobre o texto.
A área econômica do governo está preocupada em garantir apoio das lideranças do Congresso para que não sejam afetadas as regras que obrigam os Estados a manter suas contas equilibradas, como a Lei de Responsabilidade Fiscal, ou o já aprovado Regime de Recuperação Fiscal, criado para ajudar Estados em calamidade fiscal — além do Rio, que já aderiu, podem entrar nele Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
O governo já detectou articulações do Estado do Rio para afrouxar o RRF e suas rígidas contrapartidas, entre elas a privatização da Cedae. As duras amarras do regime, aprovado em 2017, impediram até agora a entrada de Minas, que não conseguiu ainda aprovar medidas de austeridade fiscal na Assembleia, e do Rio Grande do Sul, que não quer colocar seu principal ativo, o Banrisul, à venda.
Além do socorro emergencial para pagar salários e fornecedores, os Estados precisam desesperadamente que a reforma da Previdência seja estendida a eles. Mas o Congresso tem ameaçado deixar municípios e Estados de fora das novas regras, alegando que eles não têm se engajado para a aprovação.
Chamado pelo ministro Paulo Guedes de ‘Plano Mansueto’ — o nome do secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, que rejeita a alcunha e prefere o nome oficial ‘Plano de Equilíbrio Financeiro (PEF) — foi desenhado para os Estados que não podem mais tomar empréstimos com aval do governo federal, por terem comprometido mais de 60% de suas receitas com o pagamento de pessoal. São chamados Estados ‘nota C’.
No mundo ideal, o novo programa de ajuda tramitaria no Congresso depois de aprovadas as mudanças previdenciárias. Como esta opção é cada vez menos provável, a equipe econômica terá que abrir uma nova frente de articulação política para salvar Estados e as próprias contas — num momento em que a interlocução com o Parlamento está bastante fragilizada.
A ideia da equipe econômica é atrelar a ajuda a medidas de ajuste fiscal e não deixar que os governadores assumam novas dívidas sem contrapartidas ou deixem a conta adicional para seus sucessores, secando uma torneira que jorrou farta no governo do PT, especialmente na gestão de Dilma Rousseff.
Até o fim do ano passado, 12 Estados e o Distrito Federal se encaixam na categoria de ‘nota C’ — entre eles Goiás, Bahia, Santa Catarina e Rio Grande do Norte. (O Espírito Santo, que é o único Estado nota A, e outros 10 que têm nota B, ainda podem tomar crédito com aval do Tesouro.)
O PEF obriga os Estados com problemas para pagar suas despesas correntes, como fornecedores e funcionários, a aprovar em suas Assembleias Legislativas as medidas necessárias para colocar as contas em dia.
O governo daria aval para que o Estado assumisse uma dívida equivalente até metade do valor economizado com as medidas. A condição é que o pagamento dessa dívida ocorra no mandato corrente. Caso um plano de privatizações seja aprovado, o Estado ainda recebe um aval extra.
O governo está disposto a dar aval para empréstimos de até R$ 40 bilhões em quatro anos, mas os governadores querem mais — e estão fazendo seu lobby no Congresso.
A política de aval benevolente do Tesouro especialmente nos anos Dilma Rousseff favoreceu o endividamento irresponsável. Em 2016, o governo Temer precisou abrir um novo socorro, alongando o prazo para pagamento de parcelas, por pressão do STF. Resultado: os novos governadores assumiram seus Estados com dívidas que somam mais de R$ 900 bilhões em janeiro deste ano.