Maria das Graças Cária foi a coordenadora de Vicente no segundo ano do Ensino Médio no colégio Santo Antônio, em Belo Horizonte.
Eu gostava de seu sobrenome tão diferente, antiesquecimento.
Ela ajudou o meu filho no processo de adaptação na escola, no enfrentamento de método pedagógico oposto ao experimentado em Porto Alegre.
Ele sentiu o choque nas provas de conteúdos que não havia aprendido no primeiro ano. Precisou estudar o que não era dado em aula e que os outros colegas já tinham prévio conhecimento.
Lembro que ela me chamou para uma conversa, muito preocupada com o desempenho do filho, que acumulava sete recuperações no primeiro trimestre.
— Você precisa se preparar para o pior, talvez seja um ano perdido.
— Não, é o contrário, temos que sempre nos preparar para o melhor, será um ano ganho. Alcançará a aprovação por média.
No final do ano letivo, após a publicação das notas, ela me abraçou e me falou:
— A esperança é a maior prova de amor que alguém pode oferecer para o outro.
Partilhávamos, na nossa amizade, do significado todo especial de confiança.
Agora, eu me inundo de esperança por você, Cária, professora de Química de tantas gerações, para que passe na difícil provação da vida. Perdeu o marido pela COVID-19 e está em estado grave na CTI do Hospital da Unimed, isolada e insconsciente. Acabou contaminada pela proximidade com o esposo, em seus últimos dias.
Vamos nos preparar para o melhor, Cária? Vamos pensar no melhor. Não desista. Não suporto a ideia de que vire um número, seja engolida pela estatística das cento e vinte mil vítimas no país do coronavírus, e perca o seu nome, a sua história, a sua caligrafia generosa na lousa. Ninguém toca no apagador até que se recupere, a sua letra permanece viva na parede.
Eu e Vicente encontraremos um jeito que nos ouça dentro da oração. Deixa com a gente, daremos esse recado, mesmo que Deus tenha que soprar em seus ouvidos pessoalmente, a fé entra pelas janelas. Uma escola inteira ainda depende de você, volte logo, te amamos.
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NÃO CONSEGUIMOS (2/9)