Quando fundaram a empresa em 2011, os sócios da Netpoints acharam uma ótima ideia ter acionistas como a Smiles e as Lojas Marisa, que lhes dariam capilaridade para atingir o consumidor no mundo de concorrência brutal dos programas de fidelidade.
Sete anos depois, a estratégia não funcionou: mais que ajudar, as agendas conflitantes dos diversos sócios atrapalharam o progresso do negócio.
Isso forçou a Netpoints a se reinventar: de um programa de fidelidade tradicional — que foca na compra e venda de pontos — está se transformando em uma empresa de inteligência de mercado, usando os dados colhidos a partir dos hábitos de compra de seus clientes para monetizá-los com varejistas e empresas de bens de consumo.
A Netpoints tem 23 milhões de CPFs em sua base, dos quais 13 milhões são cadastros completos e 2,7 milhões são clientes ativos. No ano passado, faturou R$ 47 milhões.
Seus maiores clientes são redes de supermercado: graças a eles, a companhia atinge cerca de 300 pontos de venda em São Paulo, na Baixada Santista e no interior. Uma das maiores parcerias é com a rede Smart, do grupo Martins, o maior atacadista do País.
Enquanto concorrentes internacionais como Dunnhumby e Symphony atendem gigantes como o Pão de Açúcar, Raia Drogasil e Pague Menos, a Netpoints está cavando um nicho no varejista regional.
“Os pontos são um meio para conhecer o consumidor e os seus hábitos de consumo”, diz André Fernandes, um dos fundadores da companhia e que assumiu como CEO em 2016 com a missão de fazer o turnaround e transformá-la em geradora de caixa.
A tarefa foi cumprida em 2017, quando a Netpoints gerou EBITDA de R$ 2 milhões. Desde então, ele tem o mandato para vender a companhia e está em conversas com investidores — financeiros e estratégicos — sobre o negócio.
Criada para ampliar os programas de pontos para além das milhas e cartões de bancos e levá-los para o varejo e a classe C, a Netpoints investiu pesado em marketing e formou uma coalizão onde era possível ganhar e trocar pontos.
Na época, o produto foi formatado para o ‘povão’: não exigia grandes acúmulos para trocas — um chocolate poderia ser resgatado por cerca de 100 pontos — e o cliente podia trocar pontos por passagens rodoviárias.
Em 2013, a Smiles viu na plataforma uma maneira de entrar no varejo e pagou R$ 25 milhões por 25% da companhia. No ano seguinte, as Lojas Marisa aportaram seu banco de dados de consumidores em troca de 15% e, logo em seguida, compraram mais 5% dos fundadores. Outros sócios incluem os cinco fundadores, um fundo de private equity do Bozano e a Turim, um ‘multifamily office’ do Rio.
O quadro societário, no entanto, virou um problema. Por ter a Smiles como sócia, a Netpoints não consegue fechar parcerias com outras empresas de milhagem — e a empresa de fidelidade da Gol decidiu há alguns anos que quer se tornar um player forte em viagens, e não no varejo. Enfrentando uma crise própria, as Lojas Marisa não cumpriram o acordo operacional, que previa a compra de um mínimo de pontos nos primeiros anos.
Semana passada, o CEO da Smiles disse à Istoé Dinheiro que o investimento na companhia foi um de seus maiores erros. “Nos posicionamos de forma errada na Netpoints”, disse Leonel Andrade, que também é chairman da Netpoints. “A empresa fechou um bloco de sócios com interesses diferentes e esse é o maior erro, na minha visão. São quatro blocos de sócios com interesses dispersos”.
Fernandes — um executivo de 50 anos que já passou pelo Bozano, Embraer e Unibanco — decidiu então ‘pivotar’: está usando a base de dados que a Netpoints construiu como programa de pontos para vender inteligência.
Com um sistema de gestão em tempo real, a Netpoints acompanha o faturamento e os estoques das redes de supermercados, que têm acesso a um ‘mapa de calor’ mostrando como cada área da loja está performando, o que facilita as iniciativas de trade marketing.
A companhia também trabalha com a indústria, formatando promoções específicas para os varejistas, incluindo o tamanho do pedido a ser feito por cada rede de forma a dimensionar corretamente o estoque e evitar ruptura.
E, no ‘velho’ business de pontos, a Netpoints descobriu está atacando dois novos filões: empresas que compram pontos resgatáveis por prêmios como forma de incentivar funcionários (“um mercado que está crescendo bastante com a nova lei trabalhista”, diz Fernandes) e cartões co-branded com o Banco Votorantim, que já representam 15% da base de cartões do banco.
Dos 48 funcionários da Netpoints — que trabalham num escritório descolado em Alphaville, no mesmo prédio da Multiplus — 10 se dedicam a data analytics e 9 a TI.
O maior investimento do próximo controlador será na área comercial: hoje, apenas quatro pessoas vendem a tecnologia para uma base de clientes largamente inexplorada.