NOVA YORK – Washington Olivetto foi um presente na minha vida. 

Eu trabalhava na McCann na ocasião em que a W/Brasil se juntou à agência e nos transformamos na WMcCann. Foi um processo que tinha tudo para ser muito confuso, porque eram duas culturas muito diferentes. 

A McCann era uma agência de resultado, de planejamento, de campanha de longo prazo, e a W/Brasil trazia essa coisa da cultura popular, de uma agência vibrante. O Washington soube juntar as duas culturas.

O Brasil era meio que sobrenome do Washington Olivetto. Ele era o próprio W Brasil. Um cara muito brasileiro, que gostava muito das coisas do nosso País: a música, a comida, a cultura, a literatura e as artes. Uma das coisas que ele fez logo no início, quando teve a fusão, foi levar a Gaviões da Fiel para dentro da agência para tocar samba pra galera, fazer feijoada. Ele gostava de juntar a galera através do Brasil. 

Washington Olivetto era Oliveira. 

Ele não era um cara que, apesar de ser quem era, ficava entre as estrelas. E a gente não chamava ele de Washington, nem de Olivetto. Para nós, ele era o Oliveira. Washington é um nome muito americano para um cara que é tão brasileiro. Por isso, a gente chamava ele de Oliveira, e ele entrava nessa onda; ele gostava, brincava. 

E era engraçado que às vezes a gente falava pro cliente assim: “Ah, não, isso a gente vai falar lá com o Oliveira.” E o cliente ficava: quem é Oliveira? 

Ele era um cara muito de fazer brincadeira, quase sempre em torno de futebol. Eu me lembro de uma história que é surreal. Ele comprou uma vaca daquelas do Cow Parade, aquelas vacas de fibra de vidro, do Corinthians e levou para a agência. E tinha uma galera que era palmeirense roxa. 

Ele botou a vaca no primeiro andar da agência, ali na entrada da recepção, que era externa. E chamou todo mundo que era corinthiano pra ir vestido com a camisa do Corinthians! Não me lembro ao certo se o Corinthians tinha ganhado o jogo no campeonato, ou algo assim. Só sei que eles ficaram enchendo o saco de um diretor de criação que era palmeirense. Eles botaram a vaca e ficaram cantando a música do Corinthians embaixo da janela do cara. 

O que fez o diretor? Pegou um balde d’água e jogou no Washington e na galera. E o Washington não estava nem aí! Isso mostra o nível de intimidade e proximidade que ele tinha com os funcionários, mesmo sendo uma lenda. A gente tinha a liberdade de “vou pegar um balde d’agua e jogar no Washington”. Era um clima muito de escola. De faculdade. E por outro lado, era extremamente profissional.

Washington Olivetto era um líder. 

Eu sou redator, assim como ele. Quando ele chegou, ele pediu para sentar no meio da galera. E ele sentou na mesa do lado da minha. Eu chegava de manhã e tava lá junto com ele. Ele olhava no meu computador, eu pedia uma ideia para ele. Ele gostava de estar acessível. 

Liderança é ensinar a fazer. E era o que ele fazia. Ele não era dos que dizia: “Esse trabalho está errado.” 

Ele não chegava pra você e falava: “Coloca isso aqui que vai ficar bom,” ou “tira esse personagem.” Não! Ele fazia você encontrar o caminho. Ele trazia perguntas e questionamentos pra sua ideia e você falava: “Ah…” 

Ele sabia fazer isso, ele te levava até lá. Sem você perceber. Era um mestre. Ele não pegava a luz pra deixar tudo claro; ele ia lá e te ensinava: “Ó, isso aqui. Qual é o caminho que você tem que fazer? Vamos achar o teu caminho aqui.”

Ele já tinha a resposta na cabeça, mas fazia parecer que era você quem chegava lá! Às vezes, ele descobria junto. 

Não era uma liderança baseada em regras ou dogmas. Era baseada em relacionamento, em conversa, amizade, em paixão por aquilo que a gente estava fazendo. 

Outra coisa importante do Washington é que ele falava muito assim: “Antes de tudo, a sua vida e a sua família. Isso aqui é só trabalho.” Ele sabia que a matéria-prima das ideias era uma cabeça tranquila, refrescada, que lia livros. 

Washington Olivetto era simples. 

E ele dizia que o principal, na publicidade, depois da ideia, obviamente, era a síntese. Era como simplificar a ideia ao máximo para que essa ideia se tornasse popular. Se você parar pra pensar, era isso o garoto Bombril.  É um produto, um garoto propaganda e um fundo infinito. Não tem nada! Então, tudo do garoto Bombril era muito simples, e por isso que pegava. Era fácil de repetir. 

Ele falava muito isso: que você tinha que gastar tempo tornando as ideias simples. 

Depois que escolhíamos a ideia pra executar, tudo tinha que ser o melhor. Qual é o melhor ator possível para esse comercial? Qual é o melhor texto possível? Qual é o melhor diretor possível que a gente vai conseguir?

Nunca houve economia para que a ideia fosse a melhor possível. Vamos investir tudo que a gente puder do nosso tempo e da nossa verba para que seja o melhor. E vamos usar todos os relacionamentos para fazer com que as pessoas que a gente quer trabalhem nessa ideia conosco. 

Uma vez a gente tava com uma ideia, mas não tinha verba para chamar ninguém famoso. Ele foi lá e ligou para o Seu Jorge: “Estou com uma ideia aqui que é muito legal por causa disso, disso e disso. Cara, eu quero que você faça!” O Seu Jorge nem perguntava quanto era e dizia: “Claro, vamos fazer!” Então tinha isso. Ele era um cara querido no meio artístico e publicitário por ser quem ele era. 

Washington inventou a gente. 

Eu nunca tinha passado por essa experiência de ir para uma concorrência onde o líder da minha agência era uma atração. Parecia que estava ali uma personalidade da novela, da televisão, do futebol. Um cantor. Todo mundo conhecia, todo mundo queria tirar foto, todo mundo lembrava das campanhas. 

Meu amigo Antônio Mega Rodriguez, que pelo que eu me lembre não trabalhou diretamente com o Washington, falou uma frase perfeita: “Morreu o cara que inventou a gente.”

Cara, morreu o cara que inventou a gente. É isso! A publicidade brasileira pode ser dividida em antes e depois do Washington Olivetto. Por mais que a gente tenha tido vários grandes. Foi com ele que a profissão publicitária passou a chamar a atenção da sociedade. As pessoas passaram a saber o que era e se interessar, e conversar, e debater a partir das campanhas do Washington Olivetto.

Com a W/Brasil, os produtos pararam de falar sobre eles mesmos e passaram a falar sobre a cultura do Brasil. Ele criou um estilo novo de se fazer publicidade, que inspirou. 

Washington Olivetto não fazia apresentações, fazia shows. 

Ele costumava dizer que por mais importante que seja uma reunião, as pessoas não estão concentradas logo no começo. Elas querem responder o e-mail, querem ver uma mensagem no telefone, querem fazer sei lá o quê. 

Então ele dizia: “Isso aqui é um show. Qual é o primeiro ato? Qual é a música que abre o show? Se o Jorge Ben Jor for fazer um show, qual é a música que vai abrir o show dele? É uma música que vai sacudir todo mundo, certo? Então você vai botar a galera pra pular e ficar louca. Uma apresentação da agência tem que ser isso. A primeira coisa que você fala tem que botar todo mundo pra se mexer na cadeira e pensar: ‘Opa, o que que tá vindo por aí?'” 

Ele sempre tinha uma história divertida, engraçada, muitas vezes inventada, mas que chamava a atenção das pessoas logo no começo. E claro, tínhamos que pensar no grand finale. “O que que vocês vão deixar ali que vai fazer as pessoas ficarem falando depois?” Pode ser qualquer coisa: pode ser um boné, pode ser uma piada, pode ser um vídeo, pode ser uma celebridade que vai entrar na sala. Podem ser milhões de coisas, mas o que eu quero é que as pessoas saiam daqui e, na hora de jantar, falem: “Gente, vocês não vão acreditar no que aconteceu hoje no meu trabalho.” 

Porque ele falava: “É a maneira da agência ficar na cabeça; não são só as campanhas! A agência tem que ficar na cabeça do cliente.” 

E posso dizer que a autopropaganda da WMcCann era tão boa quanto a propaganda que a WMcCann fazia para as marcas. 

Cada vez estávamos nos preparando para uma reunião, e ele falou: “Eu tenho certeza que a ideia de vocês é boa. Não preciso nem ver, porque vocês são bons. A minha preocupação é com o roteiro do show, o roteiro da apresentação.” 

E ele fazia muita questão de que cada segundo fosse  importante numa reunião, cada pessoa que estivesse lá fosse importante. Ele não levava alguém que não fosse falar nada. Se você bota mais gente na sala do que é preciso, só serve pra tirar a atenção de quem é importante na apresentação.

“Nada que o cliente não vá absorver pode estar na apresentação. Mostre só o que a pessoa vai lembrar.” 

Washington Olivetto foi uma pós-graduação em publicidade para mim. 

Porque, realmente, são coisas que eu trago até hoje. A maneira como eu gosto de apresentar e como eu gosto de criar, e a forma como eu trabalho com a minha equipe, tudo passa muito por esse período da minha carreira. Eu uso bastante o que aprendi, porque, se houve um case de sucesso de agência no Brasil, foi a W.  A agência do Oliveira. 

Fabio Seidl é diretor de desenvolvimento criativo global da Meta.