ARARAS, São Paulo — O estrago causado pela covid machucou vários setores da economia e mergulhou o PIB em depressão temporária, mas aqui na Paíto Motors, que vende carros importados seminovos e zero-km para o topo da pirâmide brasileira, business has never been better.
Junho foi o melhor mês de vendas da história. Julho? O segundo melhor.
“Acho que rolou essa sensação de ‘vou matar minha vontade agora porque a vida é curta, não vou adiar mais’,” diz o dono do negócio, José Paulo Gagliardi Boldrin, o ‘Paíto’. “Ninguém tá viajando, ninguém tá saindo…”
Quase todo dia, a Paíto vende brinquedinhos que custam acima de R$ 1 milhão. A loja tem todo o cardápio que apela à testosterona humana, das Mercedes aos Porsches, dos Audis às Lamborghinis, passando pelos Suburbans.
A Mercedes G63 AMG — o famoso ‘jipe da Mercedes’ — tem um ano de fila de espera e começa em R$ 1,4 milhão. Com os opcionais de fábrica, vai pra R$ 1,7 mi — mas qual o preço de um sonho?
Mas por que alguém revenderia um Porsche ou uma Lamborghini com apenas 400 km rodados? Paíto diz que é muito comum acontecer. “Tem gente que brigou com a mulher, gente que se apertou, gente que desistiu, gente que comprou um melhor, gente que comprou um pior…”
A Paíto está vendendo cerca de 60 carros por mês. No domingo que o Brazil Journal visitou a loja, os dois showrooms, normalmente com 60 carros, estavam com 40.
Em vez de expor seu estoque na Avenida Europa ou na Barra da Tijuca, a Paíto Motors se esconde nesta cidade pacata de 120 mil habitantes a alguns minutos de Piracicaba e 160 km de São Paulo. Mas os clientes vêm de todo o Brasil, e, antes de fechar negócio, alguns pousam no heliponto da laje da empresa para ver de perto o objeto do desejo (e passar horas no parque de diversões para adultos).
A família Boldrin está no ramo de compra e venda desde 1972, quando o pai de Paíto comprou uma concessionária Ford aqui na cidade. Vinte anos depois, ganhou a revenda da Mitsubishi em São José do Rio Preto, e em 1995, montou a Fiat em Leme.
Quando Paíto foi para São Paulo cursar administração no Mackenzie, monitorava os classificados para achar seminovos para o pai. Nessa época, estagiou na Caltabiano, uma das maiores revendas de carros do País.
Trabalhava com o pai na Ford e, nas horas vagas, começou a comprar e vender seminovos importados como um negócio próprio. Eram Audis A3, Pajeros TR4, Mercedes Série C.. — nada tão opulento quanto as mercadorias de hoje, mas Paíto sentiu que havia encontrado um nicho.
Vendeu o Marea do irmão para aumentar seu capital de giro e acelerar o negócio, e em 2003, abriu a Paíto Motors, que cresceu em média 20% todo ano desde então.
“Eles criaram um nome de confiança num negócio em que costuma haver muita desconfiança,” um empresário disse ao Brazil Journal.
A maioria dos clientes descobre a Paíto pela internet e vê o estoque pelo Instagram. Toda manhã, Paíto faz um Stories mostrando os novos modelos que chegaram. (A conta tem 240 mil seguidores sem nunca ter gasto R$ 1 em impulsionamento.)
Numa manhã recente, Paíto postou sobre 4 carros: uma Porsche Cayenne Turbo, uma Ford F150 Shelby, uma Porsche Carrera 911 2020 e uma Mercedes GLE — as três primeiras venderam na mesma tarde, todas pelo Instagram.
Os clientes da Paíto são principalmente advogados, médicos, empresários e artistas. Abrir uma loja em São Paulo? “Já pensei, mas ia dividir o estoque… Sei lá, essa loja tem uma identidade: a gente é daqui, nascido e enraizado aqui.”
Os 3.300 metros quadrados da loja contêm instalações que não fariam vergonha na Faria Lima: há um showroom principal, um showroom premium, uma oficina e um estúdio para fotos com plataforma giratória. Paíto tem seis caminhões tipo sider, mini cegonhas que levam o carro embrulhadinho até a casa do cliente.
Ao longo do tempo, Paíto instituiu duas regras: não contratar vendedoras (mulheres) nem bebida. Bebida já houve, mas “chegava no fim do dia e os amigos vinham aqui pra beber; eles não iam comprar nada, virava boteco,” conta, rindo. Depois fala sério: “A venda impulsionada pelo álcool é a pior venda.”
E por que não ter mulheres vendendo? “A mulher do cliente pode não gostar… A gente procura ser profissional.”
A ordem é não se meter em confusão: a empresa tem um compliance interno e segue as normas do COAF para coibir lavagem de dinheiro.
Ano passado, Paíto importou dois Porsches 918 Spider, um carro de edição limitada (só foram feitos 918). Como o carro foi lançado em 2015 e a lei brasileira só permite importar carros zero-km (jamais seminovos), Paíto teve que revirar o mundo. “Fizemos um mapeamento mundial para encontrar dois zero km de colecionadores ou investidores,” diz. Vendeu cada um por R$ 12 milhões.
Entre os hypercars — os carros mais exóticos e potentes do mundo, lançados tipicamente a cada 10 anos — a Paíto já comercializou a Porsche 918 e a MacLaren Senna.
A Lamborghini Aventador SVJ é um triunfo do design, uma edição limitada da qual só existem 900 no mundo. Das cinco que vieram para o Brasil, Paíto vendeu três. Por R$ 6,5 milhões cada. (São 770 cavalos no motor traseiro 12 cilindros em V aspirado.) Uma com 600 km acaba de voltar.
Ainda no capítulo Lamborghinis, Paíto sofreu um revés típico do Brasil, o País onde até o passado é incerto.
Há um ano, quando a Justiça botou em leilão a Aventador de Eike Batista, a Paíto levou o carro por R$ 1,4 milhão. Levou — mas não consegue revender.
Apesar da lei obrigar que o vendedor — no caso, a Justiça — entregue o carro liberado de ônus e débitos, até hoje a egrégia Secretaria de Fazenda do Rio de Janeiro não cumpriu a ordem da Justiça de dar baixa nos débitos de IPVA do carro.
A McLaren Senna só tem 500 exemplares no mundo. Das seis que estão no Brasil, uma voltou ao mercado com 40 km rodados; a Paíto comprou e revendeu. A nota fiscal printou: R$ 12 milhões. Mais um sonho realizado.
PAÍTO’S TOYS (ADULTS ONLY)
Lamborghini SVJ
McLaren Senna
Porsche 918