OIAPOQUE e MACAPÁ – Em um dos pontos mais extremos do Brasil, todos os dias chegam pessoas de diferentes partes do País atraídas pelas riquezas do petróleo à beira da Amazônia. 

Elas circulam pela pequena Oiapoque, esta cidade de 25 mil habitantes que faz divisa com a Guiana Francesa e onde só se fala das oportunidades que a exploração da Bacia da Foz do Amazonas pode trazer – ainda que não tenha sido extraída uma gota sequer de óleo no bloco FZA-M-59, localizado a 170 quilômetros da costa do Amapá.  

Hoje Oiapoque sonha em se tornar uma nova Macaé, a cidade fluminense que serve de base de apoio para para a exploração offshore da Bacia de Campos e recebe centenas de milhões de reais em royalties do petróleo.

Remota e cercada pela densa Floresta Amazônica, a cidade amapaense observa a movimentação da Petrobras, que aguarda o licenciamento ambiental para iniciar as pesquisas exploratórias na região.

A estatal já assumiu a operação do aeroporto de Oiapoque, onde diariamente chegam vôos fretados de Macapá trazendo técnicos e especialistas contratados pela petroleira. Dali eles seguem de helicóptero para o navio sonda NS-42, posicionado no poço Morpho 1-APS-57. 

09 26 Clecio Luis ok

A Bacia da Foz do Amazonas faz parte da Margem Equatorial, a faixa litorânea de 2.200 quilômetros que se estende do Amapá ao Rio Grande do Norte e engloba 42 blocos de exploração.

Região onde as águas do Rio Amazonas se encontram com o Oceano Atlântico, a Bacia da Foz do Amazonas é considerada pelo governo brasileiro e pela indústria de petróleo e gás uma das mais novas fronteiras fósseis no País. Isso porque a cerca de 700 quilômetros dali está nascendo uma nova potência petrolífera: a Guiana, antiga colônia britânica.

Desde 2015, trinta companhias – incluindo a Exxon Mobil, a Chevron e a chinesa CNOOC – já fizeram mais de 60 descobertas ali, na bacia de Stabroek. Estima-se que as reservas de petróleo da Guiana totalizem 11 bilhões de barris (para efeito de comparação, o Brasil tem 16,8 bilhões de barris em reservas provadas).

O vizinho Suriname também está na corrida para se tornar outro gigante do petróleo, com investimentos da TotalEnergies, Shell e Petronas. 

No Brasil, a expectativa é que a Bacia da Foz do Amazonas compartilhe as mesmas características geológicas da Guiana e do Suriname. Nos anos 70 e 80, estudos no Amapá encontraram poços secos ou sem viabilidade comercial. Mas agora, a Petrobras aposta suas fichas na exploração em águas profundas.

O investimento da Petrobras para a campanha exploratória na Margem Equatorial, incluindo a Bacia da Foz do Amazonas e outros pontos da faixa litorânea, está estimado em U$ 3 bilhões no período 2025-2028. 

Se confirmada a existência e a viabilidade de petróleo na costa do Amapá, o início da exploração comercial deve ocorrer em 2030.

O petróleo já criou uma expectativa positiva para a nossa economia. Só a presença da Petrobras já está trazendo movimentação econômica, com hotéis lotados. O mundo todo está olhando para o Amapá por causa do petróleo,” o Governador Clécio Luís disse ao Brazil Journal.

Um dos estados mais pobres do Brasil, o Amapá tem um PIB de R$ 22 bilhões – o equivalente ao da cidade de Maringá, no Paraná. Cerca de um terço da população de 805 mil pessoas vive na extrema pobreza e metade dos amapaenses depende do Bolsa Família. 

Estimativas do governo estadual apontam que a exploração do petróleo poderia multiplicar por dez o PIB do estado na próxima década. As projeções têm atraído em peso as empresas de óleo e gás. Em setembro, um evento em Macapá reuniu cerca de 60 empresas do setor, entre elas a Halliburton, a Constellation e a Maersk.

O projeto também tem as bênçãos de dois líderes nacionais que vêm do Amapá: os senadores Davi Alcolumbre, presidente do Congresso, e Randolfe Rodrigues, o líder do governo na Casa. Os dois não cansam de mandar recados em favor do petróleo na Margem Equatorial. 

“A hora que começar a explorar o tanto de petróleo que pode ter aqui vai ter um boom de negócios no Amapá. Não tenho a menor dúvida que vai mudar a cara do estado,” disse Sergio Bacci, o presidente da Transpetro, a subsidiária da Petrobras responsável pela movimentação do petróleo extraído nas plataformas offshore da estatal. 

ara a Petrobras, falta pouco para o projeto na Margem da Equatorial começar a decolar. O Ibama aprovou em 24 de setembro a simulação de resposta à emergência da estatal na Bacia da Foz do Amazonas, mas solicitou ajustes para a concessão de licenciamento ambiental para a fase de perfuração exploratória. 

O teste foi realizado no final de agosto para comprovar a capacidade de reação da petroleira em caso de vazamentos. Para isso, a companhia construiu uma unidade de atendimento e reabilitação da fauna na cidade de Oiapoque. 

Esta é a segunda tentativa da Petrobras em obter o licenciamento para iniciar a fase exploratória no Amapá. Em 2023, o órgão ambiental rejeitou o pedido inicial da companhia, obrigando a empresa a refazer seus planos. 

09 29 Sergio Bacci ok

“Esperamos que a licença seja emitida em outubro, antes do fim do contrato da sonda que está estacionada em Oiapoque,” disse Bacci. “Cada dia de aluguel da sonda custa U$ 500 mil dólares. E se a licença não sair logo, teremos que desmobilizar a sonda e devolvê-la.” 

As questões ambientais são o maior entrave ao projeto. ONGs e ambientalistas dizem que os riscos de dispersão de óleo no caso de um acidente têm sido subestimados.

“Um vazamento de petróleo pode afetar uma região que tem cerca de 80% dos manguezais da costa brasileira. Além disso, afetaria também comunidades indígenas que vivem da pesca e pode impactar ainda o grande sistema recifal amazônico, cuja importância ainda não é bem conhecida,” explica Ricardo Fujii, um especialista em Conservação do WWF Brasil. 

Para além dos riscos ambientais, os críticos ao projeto apontam que quando a exploração da Foz do Amazonas se tornar realidade, o mundo já dependerá menos dos combustíveis fósseis e estará investindo na transição energética.  

“Se nós somos o estado mais protegido do Brasil, se temos os melhores indicadores ambientais, por que a gente vai abrir mão do petróleo?” questiona o governador.

Segundo dados do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, 74% do território do estado é preservado ambientalmente. Em 2024, o índice de desmatamento no Amapá foi zero. 

Enquanto o embate da exploração do petróleo à beira da Amazônia segue firme no nível nacional, em Oiapoque os efeitos já começam a ser sentidos. Os preços de aluguéis e os custos com alimentação já estão aumentando, numa região que depende quase 100% de insumos trazidos de fora. 

Costuma-se dizer que a economia da fronteira depende de duas atividades: ouro e euro. A cidade é um ponto de recebimento da extração ilegal de ouro na floresta. Ao sobrevoar a região, é possível ver clareiras na floresta com garimpos ilegais e rios contaminados pelo processo de extração.

Oiapoque também vive do comércio da fronteira, facilitado por um real desvalorizado frente ao euro. Quem vive em Saint-Georges-de-l’Oyapock, a cidade da Guiana que fica do outro lado da Ponte Binacional Franco-Brasileira, faz compras na cidade brasileira e movimenta a economia local.

Por isso, quem mora ali sonha com uma nova fonte de renda. Luiz Lobato da Silva vive há 38 anos em Oiapoque e é dono de uma catraia, uma canoa motorizada que faz o transporte de passageiros na fronteira. Ele já sonha em comprar outra embarcação para atender o fluxo de pessoas que está chegando.

“Está vindo gente com dinheiro para comprar terra, terreno, abrir algum negócio. Tem muita gente nova por aqui,” diz o morador, empolgado com os lucros do petróleo que podem sobrar para o Oiapoque. “A população quer desenvolvimento, quer mais recursos, quer mais dinheiro, quer melhorar de vida.