Nas últimas semanas, o empresário Alexandre Grendene resolveu investir um pouco de sua fortuna, feita com sandálias e chinelos, na construção civil.
Depois de comprar 10% da Even na Bolsa em junho, Grendene disse na semana passada que pretende em breve ser dono de até 15% do capital da incorporadora — por enquanto.
(Para Grendene, isso é fichinha. Ele teria que comprar pelo menos 35% da Even para ter na construtora o mesmo valor que investiu no seu iate, o Madame Kate.)
Mas o apetite de Grendene pela construtora vem num momento em que outros investidores — que fazem mais contas do que ele quando o assunto é alocação de capital — estão pressionando por mudanças na Even.
Em abril, gestoras cujos fundos são acionistas da Even enviaram uma carta ao conselho da empresa. Pediram que a Even reduza suas despesas administrativas e aumente a quantidade de caixa que volta para os acionistas na forma de dividendos ou recompra de ações. Na cabeça destes investidores, a Even tem muito caixa e, como o mercado imobiliário está parado e sem perspectivas, o melhor a fazer é distribui-lo — e não aplicá-lo em novos projetos.
As gestoras — incluindo SPX Capital, ARX e Studio — também elegeram um conselheiro independente para avançar na discussão desta agenda com a direção da empresa.
Grendene, o novo investidor, está indo pelo mesmo caminho. A Nova Milano, sua empresa de participações, pediu a convocação de uma assembleia extraordinária para eleger um sétimo conselheiro na Even, o que deve alterar o equilíbrio de poder dentro da empresa.
A Nova Milano também pediu a remoção de uma cláusula do estatuto que obriga investidores que atingem 10% do capital da Even a notificar a empresa, previamente, de sua intenção de comprar mais ações. (Foi esta regra que obrigou Grendene a declarar sua intenção de comprar mais 5%.)
A Even, comandada por Carlos Terepins, é uma incorporadora geralmente elogiada por sua performance operacional.
Foi uma das primeiras empresas do setor a alinhar a remuneração dos engenheiros trabalhando em suas obras com o retorno financeiro dos projetos — uma forma de conter a explosão de custos que começou a afetar o setor no final de 2010. Quando as construtoras começaram a enfrentar problemas no repasse de clientes para bancos, Terepins entendeu a gravidade do problema e criou um back office robusto para acompanhar clientes caso a caso e garantir que os bancos aceitariam os repasses.
Apesar disso, a Even enfrenta hoje dois questionamentos.
O primeiro é uma questão de gordura. As despesas administrativas e com vendas da Even chegam a 17% de seu faturamento, entre os maiores índices do setor. A redução deste índice deve passar, segundo analistas, pelo corte na remuneração dos executivos da empresa, que está entre 17 e 20 milhões de reais por ano.
Para o CFO da Even, Dany Muszkat, “sempre existe um debate sobre o tamanho que a empresa deve ter e o que o mercado pode absorver. A Even passou a ser uma geradora de caixa mais forte só no ano passado, mas nós estamos monitorando o nosso custo fixo olhando para o nosso volume operacional, que inclui lançamentos, vendas, estoque e despesas com atendimento a clientes.” Em fevereiro, a Even demitiu 70 funcionários.
O segundo tem a ver com a forma como a Even aloca seu capital. Neste momento de ciclo de baixa no mercado imobiliário — sem perspectiva de melhora no curto prazo — os investidores querem que as empresas paguem aos acionistas a maior parte de sua geração de caixa (se possível, 100%), e evitem gastar o capital na compra de terrenos. No ano passado, a Even aprovou um programa de recompra de 5% de suas ações, mas também comprou terrenos com um valor geral de vendas de 3,6 bilhões de reais.
Na época, a ação negociava a metade de seu valor patrimonial. “Neste cenário, uma recompra de ações daria um retorno muito mais óbvio para o acionista do que iniciar projetos do zero,” diz um analista.
Muszkat diz que a empresa foi diligente: “Compramos muitos terrenos em São Paulo no ano passado porque haveria a mudança do Plano Diretor em julho. As compras foram concentradas no primeiro semestre, e compramos áreas onde haveria restrição de construção para projetos protocolados depois de 30 de junho. Antecipamos as compras para garantir nosso potencial de lançamentos à frente.”
Ele diz que a empresa tem ouvido os acionistas. Até o fim de junho, entre dividendos e recompra de ações, a Even já se comprometeu a devolver cerca de 110 milhões de reais aos acionistas; no ano passado inteiro, ela pagou 130 milhões de reais. Mas ele explica que a postura da Even sempre foi a de manter um caixa mínimo como um seguro contra turbulências na economia e no crédito bancário.
O debate sobre o tamanho da Even e a melhor forma de alocar seu capital existe em todas as empresas do setor — pelo menos, nas que têm a sorte de ter capital para alocar.
Mas a chegada de novos acionistas pode tornar essa dinâmica mais delicada. Os fundadores da Even e o management da empresa têm, juntos, apenas 10% do capital, enquanto outros seis acionistas, somados, têm 40%.
Num cenário assim, quando se discute a estratégia da empresa, a diferença entre ‘conversas do dia a dia’ (comuns entre acionistas e management) e ‘ativismo societário’ acaba sendo uma questão de ênfase.
“O que eles não vão conseguir mudar é o mercado,” diz um veterano de lançamentos no setor. “O mercado está muito pior do que as pessoas imaginam. Todo mundo neste setor é um otimista.”