Carlos BritoA ação da Anheuser-Busch InBev (ABI) está caindo quase 3% nesta segunda-feira — com o dobro do volume negociado — depois de um ‘downgrade’ áspero pelo HSBC e de uma matéria despretensiosa num jornal inglês que reviveu os rumores de uma fusão com a Coca-Cola, o que poderia levar a ABI a ter que levantar mais capital. 
 
Primeiro, a não-notícia:

 
Sábado à noite, um colunista do Telegraph notou que os executivos da ABI têm um incentivo para fazer com que a companhia chegue a 2020 com um faturamento de US$100 bilhões — o que só seria possível com uma outra megafusão.
 
O plano de remuneração dos executivos — chamado de ‘2020 Dream Incentive Plan’ — cria um ‘bonus pool’ de US$350 milhões a ser dividido pelos 65 executivos mais sêniores da empresa se a ABI chegar a 2020 com US$100 bilhões de faturamento anual.
 
Com a recente aquisição da SABMiller, o faturamento anual da ABI agora é de cerca de US$55 bilhões/ano.  Em outras palavras:  somente uma fusão com a Coca-Cola ou a Pepsi poderia fazer a empresa quase dobrar seu faturamento em apenas quatro anos. A Coca, by the way, fatura US$ 45 bilhões/ano.
 
A especulação de que a ABI possa comprar a Coca-Cola já foi assunto de ’n’ matérias na imprensa especializada — inclusive aqui — e de relatórios de analistas.
 
Não está claro que o mercado tenha comprado a ideia hoje em particular.
 
O mais provável é que a coluna do Telegraph esteja tendo um papel apenas marginal no pregão de hoje, e que o mercado esteja focando nos comentários feitos pelo HSBC.
 
Esta manhã, o analista do banco, Anthony Bucalo, mudou sua recomendação para a ABI de ‘comprar’ para ‘manter’, citando inúmeras pressões sobre o negócio da empresa nos EUA e no Brasil, bem como a incerteza depois da eleição americana.
 
Raras vezes um analista pintou um cenário tão desafiador para a companhia.

 
“Neste novo mundo, em que as empresas de consumo que negociam a múltiplos elevados devem permanecer sob pressão, achamos que o múltiplo ‘premium’ da ABI é mais vulnerável quando se analisa a erosão dos fundamentos subjacentes.
“Os EUA (30% do EBIT) e o Brasil (18% do EBIT) já enfrentam dificuldade há algum tempo, e não é apenas o cenário macroeconômico: nós já não gostávamos das perspectivas para ambos [os mercados] antes da fusão; achamos que a transação com a SABMiller iria proporcionar excelentes novos ativos e oportunidades de integração. No entanto, essa promessa parece invalidada, a médio prazo, por quão fraco o ‘core business’ se tornou.

“A ABI continua a perder participação de mercado nos EUA, agravada pela marcha das cervejas artesanais e a fraqueza inegável da Bud Light, que perdeu um ponto percentual [de share] ao longo dos cinco últimos anos. Estamos esperando uma reversão na tendência de declínio de volume há algum tempo mas, como parece que isso não vai acontecer, reduzimos nossa perspectiva de médio prazo.

“Nunca vimos o Brasil tão incerto, e acreditamos que os investidores devem ser cada vez mais céticos com relação às dificuldades enfrentadas pelo negócio no Brasil para além do macro. Mecanicamente, a estratégia atual de garrafas retornáveis continuará a impactar os preços negativamente e as margens continuarão sob pressão no médio prazo devido ao hedge cambial.

“Mas o mais preocupante é a evidência de que as principais marcas da empresa estão mostrando o desgaste da idade e possivelmente negligência; a tendência negativa na participação de mercado em face a uma concorrência fraca é indicativa de algo mais preocupante, em nossa opinião. Não temos certeza se o desafio está nas marcas, na estratégia de preços, na estratégia de embalagens, na estratégia de canal ou num banco de talentos cada vez menor.” 

E, como se isso tudo não bastasse… “o resultado da eleição nos EUA agora pesa sobre o México (9% do EBIT), com a queda do peso e o aumento da incerteza.”