Desde o início do ano, a ação da Suzano despenca 25% enquanto o Ibovespa sobe 10%.
O descolamento tem um motivo: o mercado está projetando uma redução do preço da celulose nos próximos anos, o que impactaria em cheio os resultados da companhia.
O Bradesco BBI, por exemplo, cortou todo o setor de papel e celulose num relatório recente e rebaixou a Suzano direto de buy para sell.
Mas Walter Schalka, o CEO da Suzano, acha que as coisas não são bem assim — e que o mercado está fazendo uma leitura errada da dinâmica do setor.
“Existe uma miopia do mercado financeiro a respeito do momento que a Suzano está passando,” Schalka disse ao Brazil Journal. “É inexorável que o consumo global de celulose fibra curta aumenta mensalmente 120 mil toneladas.”
Parte do argumento dos investidores para as projeções de queda nos preços é de que haverá um aumento na oferta, já que diversas grandes plantas começarão a operar no exterior nos próximos anos. (A própria Suzano está colocando de pé o Projeto Cerrado, que produzirá 2,3 milhões de toneladas de celulose ao ano, praticamente 20% da capacidade atual).
Para Schalka, mesmo com tantos projetos entrando em operação, a oferta não vai ser capaz de cobrir a demanda. Isso porque, além da alta recorrente mensal causada pelo crescimento populacional e aumento da urbanização, os estoques em todo o mundo estão muito baixos.
“Não estou falando que não vai ter risco de volatilidade nos preços da celulose, mas não consigo enxergar o decoupling que está acontecendo, pois o preço nunca esteve tão alto e o da ação em dólares está muito baixo,” disse o CEO.
Segundo Schalka, também há um movimento no setor de substituição do tissue de fibra longa para o de fibra curta, que é a especialidade da Suzano. “Além do fiber to fiber, também tem o fossil to fiber, então também estamos ganhando o espaço do plástico. Nosso mercado vai continuar crescendo.”
Abaixo, os principais trechos da entrevista.
As ações da Suzano têm sofrido um baque no último ano com preocupações a respeito do preço da celulose e de uma possível crise econômica global.
Voltei agora há pouco de um encontro com investidores e disse que existe uma miopia do mercado financeiro a respeito do momento que a Suzano está passando. É inexorável, já que esse número acontece recorrentemente, que o consumo global de celulose fibra aumenta mensalmente 120 mil toneladas. Pode até se discutir se é 120 mil ou 130 mil, mas uma certeza é que é sempre acima de 100 mil toneladas por mês. Então, o mercado está crescendo e é inelástico. Pode até ter uma recessão global, porém o consumo de papel higiênico não vai mudar muito. Pode até ter um downgrade, de um modelo folha tripla para outro folha dupla, por exemplo, no entanto o consumo total tem pouca volatilidade.
No papel para imprimir escrever pode ter uma mudança, mas o que está acontecendo é o efeito contrário. O volume de livros vendidos no Brasil neste ano, por exemplo, cresceu 35%. Logo, não estou conseguindo enxergar como essa desconexão entre o preço da ação da Suzano e a questão do crescimento global.
Mas e a oferta não vai aumentar com novos empreendimentos, como é o caso do Projeto Cerrado, da própria Suzano?
Neste momento, tem um produtor na Espanha que está parado porque não tem água. Outros na Finlândia tiveram que se mudar de fibra curta para longa porque não tem mais madeira vindo da Rússia. A produção de fibra curta, no último mês, não cresceu e a demanda cresceu 120 mil toneladas. Qual a consequência disso? Os estoques estão caindo. Na Europa, nunca estiveram tão baixos.
É verdade que vão ter novos projetos: vai ter um projeto da Arauco no Chile, mas é de 120 mil toneladas/mês. Depois, vai ter da UPM no Uruguai e o nosso projeto Cerrado. Então, não estou falando que não vai ter risco de volatilidade nos preços da celulose, mas não consigo enxergar o decoupling que está acontecendo, pois o preço nunca esteve tão alto e o da ação em dólares está muito baixo. Não à toa, vemos essa situação como transitória e fizemos os dois programas de recompras de ação.
Então, você não enxerga uma queda tão abrupta dos preços como parte do mercado está colocando, mesmo em um prazo mais longo?
Dessa magnitude é muito difícil, pois tem outra variável, que é a variável do custo marginal da celulose. Todos tiveram inflação de custos, inclusive a Suzano, decorrente de insumos como petróleo e químicos. Mas impactou mais os nossos concorrentes globais do que a Suzano. É possível que tenhamos uma variação de preço para baixo, porém o que acontece é que alguém no mercado diz que o preço vai cair naquele momento. Aí o preço não cai e até sobe. Estou tendo esse tipo de conversa desde janeiro. Não vejo o preço caindo agora.
Mesmo com a desaceleração na economia chinesa, que é o principal mercado de vocês?
O que está acontecendo é que estamos tomando espaço da fibra longa. Não é só crescimento e demanda global, trata-se do mercado de fibra longa. Hoje, o mercado global de tissue roda 46% com fibra curta – esse número era de 30% há alguns anos. Sabe quanto nós produzimos com fibra curta? 100%. É o que vai acontecer: com o tempo, a fibra curta vai ganhando cada vez mais espaço da fibra longa. A população no mundo cresce, assim como a urbanização, o que aumenta o consumo de tissue. E além do fiber to fiber, também tem o movimento de fossil to fiber, então também estamos ganhando o espaço do plástico. Então, o nosso mercado vai continuar crescendo.
Diante desse cenário, e com as ações sofrendo, vocês podem partir para um terceiro programa de recompra?
Nós temos um pilar fundamental na nossa estratégia que é a nossa robustez financeira. Estamos no maior programa de investimento da história da companhia. O maior investimento privado do Brasil é nosso que é de R$ 16,1 bilhões. Então, temos que saber como o mercado vai se comportar no ano que vem. Se o preço da celulose cair, por exemplo, a nossa geração de caixa também vai cair, então precisaremos ser mais conservadores. Agora, se o preço continuar elevado, vamos ser mais benignos. Tem um diretor nosso que tem uma frase que eu uso: “não me peça coerência”, pois vamos administrar as nossas políticas de investimentos, de recompras de ações ou de dividendos de acordo com as condições de mercado. Mas o que é inegociável é a nossa robustez financeira. Isso não vamos abrir mão.
Vocês estão com uma alavancagem de 2,3x. Esse número não pode aumentar com um preço mais baixo da celulose e tantos investimentos simultâneos?
O nosso endividamento é longo e barato, além de estar com taxa fixa – cerca de 95% a uma taxa média de 4,5% ao ano. Por isso, esse movimento de taxa de juros que está acontecendo agora não está nos afetando. Ao contrário: do lado do caixa, eu consigo ter retornos maiores. O nosso prazo médio de endividamento é maior do que sete anos.
Além dos investimentos no Cerrado, tivemos o Porto de Itaqui, que investimos tanto no terminal quanto no pier, compramos 300 mil hectares de terra, estamos com um megaplantio florestal, estamos fazendo um retrofit tanto da unidade de Jacareí quanto de Aracruz, fizemos a recompra de ações e distribuímos R$ 1,8 bilhão de dividendos. Mesmo assim, o nosso endividamento não aumenta. Fizemos tudo isso com geração operacional de caixa. O EBITDA da companhia no ano passado foi de R$ 23,5 bilhões e a expectativa é que esse ano tenhamos um outro ótimo número.
Então, quando você acredita que essa miopia, como você diz, vai passar? As ações caíram mesmo depois dos resultados do segundo trimestre…
Todas as ações caíram e algumas mais do que as outras. As nossas caíram menos. Essa é a primeira vez na história que temos o preço da celulose crescente e a da ação decrescente. Uma hora vai corrigir. No ano passado, tivemos R$ 23,5 bilhões de caixa com um preço médio de US$ 607/tonelada. O preço histórico nos últimos dez anos é de US$ 610/tonelada. E hoje o preço está muito maior. Então, estamos muito confortáveis e uma hora esse preço da ação vai corrigir. O maior reconhecimento disso é que estamos recomprando as nossas ações.