Com as eleições presidenciais de outubro se aproximando, a Argentina entrou oficialmente no período de pânico pré-eleitoral que marca nossas voláteis vidas emergentes.

Desde segunda-feira, os ativos argentinos entraram em liquidação. A dívida soberana com vencimento em 2021 — o primeiro a vencer após a eleição — caiu 5 centavos para 82 centavos de dólar, jogando o yield para 17,9% ao ano (uma alta de 350 pontos-base).

10224 50332d23 dbd3 0000 001d f05bbe18883cO mercado de CDS — onde se compra seguro contra um default da dívida — agora precifica o risco-Argentina em 1.140 pontos-base — o mais alto do mundo. (Para efeito de comparação, o risco de países africanos quebrados está em 800/900 pontos-base.  A Argentina tem superávits fiscal e comercial, e suas obrigações externas estão cobertas até o final do ano que vem.)

 
O dólar subiu 3,6% para 43,94 pesos, e os bancos argentinos listados em Nova York caíram entre 10% e 12%.

A última maré de pânico começou com uma pesquisa eleitoral que mostrava que Cristina Kirchner, num hipotético segundo turno, estaria à frente do Presidente Mauricio Macri, que tenta a reeleição.  Hoje senadora, Cristina ainda não se declarou candidata à Presidência.

Na Argentina, as pesquisas são um faroeste (não caboclo mas gaúcho).  Elas não são registradas, não precisam ser publicadas, e seus resultados são usados para manipular a reação dos adversários — e o mercado.

A pesquisa que mostrava Kirchner à frente foi feita pelo Isonomia, um instituto historicamente ligado ao Cambiemos, a coalizão de Macri.

A parte do mercado que acreditou na pesquisa resolveu liquidar suas posições;  a outra parte, mais cética, acha que a pesquisa é uma jogada de Macri para incentivar Cristina a se candidatar.

Hoje, a centro-esquerda argentina está pulverizada entre vários candidatos em potencial.  As primárias do peronismo acontecem em agosto e vão decidir entre: Roberto Lavagna, ex-ministro da Economia de Nestor Kirchner; Sergio Massa, o ex-chefe da Casa Civil de Cristina; o Governador da Província de Salta, Juan Manuel Urtubey; e Daniel Scioli, o ex-governador da Província de Buenos Aires que perdeu para Macri em 2015.  (Este grupo forma o peronismo moderado, ou “Alternativa Federal”; Cristina corre por fora com sua Unión Ciudadana – UC).

 
10101 8c60e14b 9511 0000 0024 06cd3ba57932Desgastado, Macri corre o risco de perder para qualquer um deles.  Mas se Cristina entrar na briga, todo o espectro político tende a se unir ao redor dele.

“As pessoas estão frustradas e decepcionadas com o Macri, mas elas o-dei-am a Cristina,” diz um investidor.

A pesquisa pode ter sido uma estratégia política brilhante, mas foi um desastre para o mercado. Hoje de manhã, o chefe do Isonomia deu uma entrevista para dizer que os resultados “foram retirados de contexto”. 

Piorando as coisas: a posição técnica do mercado.

No início do ano passado, a Argentina inundou o mercado de dívida com US$ 15 bilhões em novos títulos.  É difícil achar um fundo macro em NY que não tenha alguma exposição ao país.

 
No final de 2018, o mercado ainda dobrou a aposta.  Como a taxa de juros doméstica (a Selic de lá) foi de 45% ao ano para cerca de 60%, os investidores aumentaram o chamado ‘carry trade’:  tomaram dinheiro emprestado a 2% em dólar e aplicaram a 60% na Argentina.

Agora, parte deste carry trade está sendo desfeito, trazendo os preços a patamares mais humildes.