Em 2021, a multinacional canadense Thomson Reuters abriu um fundo de corporate venture capital para investir em startups em suas áreas de atuação – principalmente em tecnologia de informação para as áreas tributária, jurídica e de análise de risco.

Aquele fundo de US$ 100 milhões investiu em 23 empresas – algumas das quais acabaram sendo compradas pela própria TR.

Recentemente, a Thomson Reuters Ventures lançou um novo fundo, desta vez de US$ 150 milhões, e está prospectando startups brasileiras.

“Estamos de olho no Brasil há algum tempo. É um mercado muito importante para nós,” Tamara Steffens, a diretora-executiva da TR Ventures, disse ao Brazil Journal. “É um mercado de alto crescimento e com problemas complexos na área tributária.”

10 08 Tamara Steffens ok

Uma veterana do mercado de tecnologia que abriu sua primeira startup em 1997, Tamara viveu por dentro os altos e baixos do setor. Foi para a Microsoft depois de a Big Tech ter comprado uma de suas empresas. Em seguida, comandou o M12, o fundo de VC da empresa de Bill Gates, e está na TR Ventures desde 2022.

Para Tamara, os valuations das empresas de tecnologia estão “inflados” neste momento do ciclo – mas não ao ponto do que ocorreu na bolha da internet – e a inteligência artificial já está transformando algumas atividades.

Qual o seu principal objetivo como gestora do fundo de venture capital da Thomson Reuters?

Queremos retorno financeiro, então administramos o fundo como qualquer outro fundo de capital de risco. Esta é a meta principal, mas só colocamos dinheiro no que conhecemos.

No geral, investimos em startups com soluções nas áreas em que temos mais expertise, como jurídica, tributária, análise de risco e fraude. Mas também investiremos em áreas adjacentes a essas categorias – fintechs, por exemplo.

Estamos de olho em negócios que se alinhem à estratégia do grupo. Buscamos levar essas tecnologias e soluções aos nossos clientes – ou, em alguns casos, podemos incorporá-las a nossos produtos.

Poderia dar alguns exemplos?

Uma das primeiras empresas em que investimos foi a Materia, uma startup com uma solução tributária baseada em AI.

Começamos a trabalhar com eles e conseguimos oferecer o conteúdo de que eles precisavam para produzir uma solução de última geração usando AI.

No final das contas, acabamos adquirindo o negócio. Agora eles fazem parte da nossa solução tributária.

Outro exemplo é uma empresa de tecnologia jurídica Noetica. É uma ferramenta usada por advogados dos maiores escritórios do mundo para precificar transações de dívida.

Eles têm muitos dados proprietários e de mercado sobre a precificação de dívidas. Como recursos de AI, conseguem tornar as análises muito mais rápidas e possuem dados para tornar as propostas mais competitivas. 

Temos um acordo com a empresa para incluir a solução na oferta a nossos clientes. E eles também trabalham lado a lado com nossas soluções de IA jurídica.

Com base na sua experiência, como você vê o atual ciclo de inovação, especialmente no que diz respeito a startups? Hoje em dia, tudo gira em torno da AI?

Sim. O Brasil é um bom exemplo de mercado que é perfeito para a AI. É muito complexo em questões jurídicas e tributárias, duas áreas em que somos muito bons.

Quanto mais complexo o problema, maior o benefício que você obterá ao aplicar inteligência artificial. A AI se sai  muito bem em soluções aplicadas verticalmente – como preencher e enviar formulários. Conseguimos resolver rapidamente problemas que antes levariam muito tempo.

Há relatos de que gestores estão bastante frustrados com o uso da AI. Eles não estão alcançando os resultados esperados. Como evitar esse tipo de situação, quando a empresa investe em soluções cujos resultados acabam decepcionando?

Depende muito do tipo de problema que você está tentando resolver. Nosso maior sucesso nos investimentos em AI são as  soluções verticais para resolver problemas específicos.

O que você está dizendo é que, em vez de aplicar uma ferramenta de uso geral, as empresas podem se sair melhor se aplicarem modelos específicos, adequados a determinadas situações?

É nisso em que acredito. Sim. Principalmente nas áreas em que concentramos nossa atuação. Estamos vendo muito sucesso em impostos, riscos, fraudes e na área jurídica – porque as soluções são bem específicas.

Tenho visto na imprensa as pessoas dizendo que não estão obtendo sucesso com a AI. Acho que não estão fazendo um uso adequado.

Os ‘valuations’ estão esticados, muitas pessoas temem a formação de uma bolha de AI. Quão difícil é a sua missão de encontrar boas startups a preços razoáveis? 

É muito difícil. ‘Esticado’ talvez não seja forte o suficiente para descrever o mercado. Os valuations estão um pouco inflados – talvez mais do que inflados.

O senso comum é que, para avaliar uma startup, precisamos entender qual é o mercado potencial. Quanta receita você pode gerar com esse mercado, resolvendo esse problema?

Acredito que estamos resolvendo alguns problemas muito sérios. Esses mercados vão crescer, então o mercado potencial também vai crescer.

Será que estamos nos precipitando um pouco em algumas dessas avaliações? Talvez sim.

Temos certa vantagem, porque somos muito específicos nas categorias e nos tipos de soluções que analisamos. Então, acho que conseguimos fazer alguns ótimos investimentos quando as empresas ainda estão começando.

Você está há muitos anos nesse mercado e viveu os anos de euforia nos primórdios da internet. Qual sua impressão sobre a atual exuberância na valorização de algumas empresas de tecnologia? 

Minha primeira startup foi em 1997. Então, vi de perto a bolha da internet.

Atualmente, as grandes empresas que estão indo incrivelmente bem, como Microsoft, Google e Amazon, têm receita para bancar os investimentos que elas estão fazendo.

Com relação ao venture capital, há alguns valuations elevados, é verdade, mas definitivamente não é o mesmo que vimos na bolha da internet, quando as empresas abriam capital sem ter receita suficiente para se sustentar.

Dito isso, as coisas estão um pouco infladas no momento.